Acho que não têm nada físico editado, mas a sua música é admirável.
Nesta página podem ter acesso aos 6 trabalhos em nome próprio:
https://nnord.bandcamp.com/
Nesta outra estão ainda mais algumas colaborações:
https://winteralternativerecords.bandcamp.com/
Vou comprar todos!!!
Que É Feito Dos Heróis Do Rock Português? Os Percursos Dos Protagonistas Do "Boom" Do Início Dos Anos 80
Dossier de 14 páginas na revista Pública (Suplemento do jornal Público) - 14 de Novembro de 1999
Por Dulce Furtado
Além do artigo de fundo com opinião e apontamentos de entrevistas sobre muitos grupos, há destaques especiais (à parte) sobre os grupos:
UHF
Grupo de Baile
Da Vinci
Heróis do Mar
Tantra
NZZN
RoxigénioTáxi
Já Fumega
CTT
Trabalhadores do Comércio
Tantra Cinema e Restaurantes
Manuel Cardoso, 46 anos, despiu definitivamente as vestes do seu alter-ego Frodo e, depois do fim dos Tantra, chegou ainda a editar dois álbuns a solo. Mais tarde virou-se para a produção de discos para outras
bandas e depois enveredou pela composição de música para jingles publicitários. Profissionalmente está hoje ligado ao cinema desempenhando funções de director de estúdio de pós-produção de filmes. Nos
intervalos do trabalho, vai tocando com uma banda, a Everness, num restaurante macrobiótico de Lisboa. Entretanto, reformulou os Tantra com novos músicos e promete gravar entre o final deste ano e o princípio do próximo. Sem tentações de regressar à vida de músico está o baterista Tó Zé Almeida, 43 anos, há muito mergulhado nas actividades da empresa de produção publicitária e televisiva Panavídeo, da qual é um dos proprietários. A prematura dissolução dos Tantra permitiu-lhe estar disponível para outros projectos musicais, então já embalados pelo "boom" do rock português. Levou a sua inesgotável energia rítmica para os "Heróis do Mar", uma das mais carismáticas bandas da época, e aí permaneceu até à dissolução do grupo, trocando só então e definitivamente a bateria pelas cãmaras de filmar. Pedro Luís, 37 anos, o teclista que substituiu Armando Gama nos Tantra logo após a edição do álbum "Mistérios e Maravilhas", também foi a tempo de apanhar nova boleia na vaga do rock português dos anos 80. Apareceu logo em 1982 com os Da Vinci, banda que, embora não se dê muito por isso, ainda anda por aí. Do baixista Américo Luís, o primeiro dissidente dos Tantra, na altura substituído por Pedro Ayres de Magalhães para a gravação do último álbum da banda, "Humanoid Fleshj", não se encontrou o rumo.
Elegy Nº 32
Fevereiro / Março de 2004
Magazine + CD: 7€
100 páginas
um pouco maior que A4 ( a cores - papel de luxo brilhante, peso normal, capa mais pesado)
Einstürzende Neubauten, Ar Líquido Os Einstürzende Neubauten reentraram no circuito da Mute depois de terem ensaiado a autoprodução graças ao método de subscrição lançado através da Internet no ano passado. Não se trata verdadeiramente de um regresso ao ponto de partida, pois para este "Perpetuum Mobile", o novo álbum do quinteto, os subscritores terão também a oportunidade de reservar a sua parcela!
Perpetuum Mobile, novo álbum dos berlinenses, é baseado em dois princípios, o movimento, quer espacial quer temporal, daí a forte utilização de instrumentos de sopro. Se antes nos habituámos ao som dos compressores, aqui os prazeres são tornados mais fluidos.
- Vocês voltaram a assinar novamente pela Mute para a saída deste álbum em larga escala. Porquê?
Blixa Bargeld - Simplesmente porque todo o dinheiro da subscrição se gastou na gravação. Não nos restava nada, tínhamos de procurar uma editora, para espanto nosso e mau-grado os nossos anos de experiência nós tivemos que fazê-lo.
- Mas não foram procurar muito longe. Negociaram com Daniel Miller?
. É um facto. Mas, hoje em dia as editoras não têm tanto dinheiro como tinham há alguns anos.
Perpetuum Mobile é uma espécie de diário de bordo; utilizaste as tuas notas de viagem para escrever os textos?
. Sim, utilizei, em parte, as notas recolhidas ao longo das minhas viagens um pouco por todo o álbum.
- Duma certa forma Perpetuum Mobile parece estar na veia do teu Recycled Soundtrack, adicionando-lhe o modo "canção"...
. Não há uma única faixa cantada em Recycled Soundtrack!
- Sim, ams falava da ambiência. Ele está mais próximo, em todo o caso, sem a inércia, de "Ende Neu" do que de "Silence Is Sexy"...
. Não, eu não percebo bem que tu não sejas o primeiro a dizer-me isso, eu não vejo sentido nenhum nessa afirmação. É muito pessoal como abordfagem. Este álbum é muito diferente.
- Que é feito do álbum de Alexander Hacke que devia consistir em gravações de som feitas à volta do mundo, como as gravações de um lago gelado ou de cantos xamãnicos?
. Penso que é melhor perguntar-lhe a ele.
- Sobre o trabalho "Perpetuum Mobile", dizes que levas contigo a tua máquina de vreme gelado invisível, o quer isso dizer?
. De facto, há um erro, é a minha máquina de gelo. Faz parte das coisas com que nós ficamos para sempre, como as ideias. Eu tinha um frigorífico com um distribuidor de cubos de gelo, o que não era corrente na época. Isso fazia-me ficar, então, muito orgulhoso.
- Dizes também ter contigo o teu Zeppelin privado invisível...
. Eu gostaria mesmo de ter o meu próprio Zeppelin. Creio que é um meio de transporte aéreo verdadeiramente muito confortável, e deve ser também muito agradável estar dentro de um Zeppelin, de passar algum tempo dentro dos vapores de álcool no interior de um Zeppelin.
- E isso não será perigoso?
. Perigoso?
- Podes pegar fogo...
. Não, isso não é verdade. O Hindenburg pegou fogo não por causa do gás mas da pintura utilizada no revestimento exterior. Em seguida eles utilizaram - não me perguntes o nome - gás inflamável. Foi o embargo americano contra a Alemanha que os obrigou a usar o hidrogénio. Ah, foi o hélio que utilizaram à frente! A causa verdadeira foi uma tempestade, a nave ficou carregada electricamente, uma vez que tinham virado a âncora contra o sol, o que fez aquecer a camada de laca externa do dirigível. Nos nossos dias, nenhuma espécie de Zeppelin é feito com materiais inflamáveis, pelo menos na sua fase de concepção. (NDR: um estudo da Nasa sobre os detritos confirma o facto que é o invólucro que se inflamou a seguir à tempestade, por causa de uma descarga eléctrostática muito forte da carcaça. A utilização de hélio, ainda que seja menos inflamável que o hidrogénio, não altera nada). Adoraria ter o meu Zeppelin pessoal!
- Com um palco lá montado, não?
. Sim, isso seria muito bom também. E sabes que mais, tu poderias fazer uma actuação lá dentro também. Acho que poderíamos fazer bom material com este cenário.
- Encontramos de novo os metais e as cordas neste álbum...
. Sim, os metais e as cordas têm qualidades particulares que são difíceis de encontrar por um grupo como o nosso, muito baseado nos elementos percussivos. Nós não temos, dessa forma, instrumentos que produzam notas longas, pode ser que isso aconteça neste álbum, onde há muitos instrumentos de sopro (NDR: Blixa reproduz o som da respiração através de um tubo). Em geral tudo é curto. Se tu tocas notas mais longas, tens de fazê-lo com teclados, cordas ou metais.
- Por vezes com a guitarra?
. O quê? O "iiiiiiii"? Sim, é algo que eu faço por vezes.
- Um dos pontos chave da subscrição era que os apoiantes poderiam dar a sua opinião e sugestões sobre as composições em curso. Como correu essa interacção?
. Eu não falaria de interacção. Em todo o caso, eu diria que eles sacrificaram uma grande parte do seu tempo a ser testemunhas do que se passava, eles davam-nos muita atenção. Também faziam muitos comentários àquilo que fazíamos, o que foi de um grande valor, excepcional, mesmo. Mas não chegaria ao ponto de dizer que houve uma interacção, é um mau termo. Eu creio que correspondeu mais ao facto de dar a escutar uma mistura ainda em bruto a amigos, ou de lhes mostrar extractos de textos. E, assim, receber os seus comentários e ideias em troca. Eu tento evitar ao máximo essa palavra "interactivo".
- Porque é um termo da moda, nesta altura?
. Porque soa oco. Ninguém sabe na verdade o que quer dizer.
- Sem esses fãs, vocês teriam editado na mesma a faixa "Ein Seltener Vogel"?
. Sim, a uma certa altura ele seria abandonado.
- Quantas faixas passam o crivo habitualmente?
. Muitos mais, habitualmente. Ficam sempre alguns temas que não chegamos a acabar, mas no caso de "Ein Seltener Vogel", há o facto de conter uma improvisão ao vivo. Ensaiámos depois reproduzir e tentar melhorar o que se passou naquela noite. Acabámos por ir parar a um beco sem saída, aquilo não avançava. Não fazia sentido, não era bom. Estive quase a abandonar esse tema, e disse: "OK, avancemos, ideia seguinte". Mas os subscritores insistiram de tal forma, eles não pararam de nos colocar questões, até que o grupo foi obrigado a reexaminá-lo. "Que há de mau na vossa forma de o tocar actualmente?". "Porque é que isso não avança?". Uma vez analisado o que estava errado, nós fomos capazes então de o continuara tocar, já de uma maneira melhor. Subitamente, houve um clique, e tudo começou a avançar. Agora, estamos contens.
- Tens uma relação particular com os vulcões? Já houve "Armenia" em Zeichnungen des Patienten O.T. e agora "Ein Seltener Vogel", onde é tratado o monte Ararat, que não é muito longe geograficamente...
. Vulcão? Não estou a ver... Em "Armenia" é mesmo uma questão de vulcão. A referência a o monte Ararat saiu assim, de improviso. É o lugar em que possivelmente foi construída a arca de Noé.
- É também um vulcão adormecido...
. Como isso é interessante... Não o sabia.
- Contém também essa noção de desaparecimento, nada é imutável, os dinossauros podem desaparecer... EN não correm um risco de se tornar num no seu percurso?
. Não, nós não nos transformaremos num, felizmente, com a partida de Mufti (NDR: F.M.Einheit), essa ideia desapareceu. Nós não estávamos de acordo sobre o modo como deveríamos considerar as coisas, ele via qualquer coisa de grandioso. Eu não penso que um dia sejamos uns dinossauros como os U2.
- Tu foste sempre um apaixonado pela Astronomia, ou aqui as referências às estrelas têm mais a ver com o Marte Ataca do que com Copérnico...
. Não é tanto assim. O "A vida noutros planetas deve ser difícil" vem de facto de uma conferência de imprensa que demos na América do Suil. Alguém perguntou: "Que pensa da vida noutros planetas?" E eu respondi que ela deve ser difícil, mas eu pensava na vida ela mesma, como ela se apresenta no nosso planeta.
- Onde é que vão tocar aqui em França? Para GrünStuck", a segunda fase da subscrição (que é também o nome do do título final do álbum), vocês deixam entender que irão tocar em locais inabituais)
. Iremos tocar no Bataclan de novo. A respeito de GrüdStuck, é preciso que nos dêm tempo para trabalhar antes de tenatr saber onde terá lugar.
Entrevista de François Marlier
Discografia Seleccionada:
2004 - Perpetuum Mobile
2004 - Supporter's Album 1
2002 - 9-15-2000 Brussles
2000 - Silence Is Sexy
1996 - Ende Neu
1993 - Tabula Rasa
1989 - Haus Der Lüge
1987 - Fünf Auf Der Nach Oben Offenen Richterskala
1985 - 1/2 Mensch
1983 - Ziechnugen Des Patienten O.T.
1981 - Kollaps
Underworld - Entulho Informativo
Nº 13
Distribuição Gratuita
32 páginas, mix cores p/b, papel brilhante fino
Tiragem: 9000 exemplares
Editor: Joaquim Pedro
Editor Adjunto: Ricardo Amorim
Colaboradores: Luís Oliveira, Sérgio Bastos, Francisco Dias, Marte, Lurker, António Calisto, Ricardo Martins, Carlos Santos, Carina Martins
Entrevista Mão Morta
Sentados n'A Brasileira em dia solarengo, mesmo ao lado de Fernando Pessoa, estivemos à conversa com Adolfo Luxúria Canibal. Tendo como ponto de partida o novo disco, "Nus", houve ainda tempo para dar duas de prosa sobre outros assuntos.
A Olho Nu.
- Comemoram este ano duas décadas de carreira e surgem com um disco novo, a dar prova de vitalidade. Não alinharam em compilações best of...
. Também já fizemos o nosso best of, se é que se pode chamar isso. Quando fizemos 10 anos editámos o "Mão Morta Revisitada", que não era um best of mas, no fundo, até era. Foi um voltar aos velhos temas, regravá-los, reinterpretá-los, etc. A ideia de um best of pura - recortar temas dos discos já saídos, juntá-los e fazer um disco novo - isso a nós não nos diz nada. Até porque há muitos temas nos discos de Mão Morta que, recortá-los - e estou a pensar no "Müller" e sobretudo no "Latrina" - seria estragar a obra. E não faria sentido nenhum fazer um best of sem passar em álbuns fundamentais como esses. Nós tínhamos um disco que gostaríamos que tivesse saído no ano passado mas que acabou, por diversos motivos, por sair só este ano. Mas que achamos que por aquilo que tem lá dentro, por aquilo que tem de novo e pelo novo passo que representa na discografia dos Mão Morta, é um bom disco para comemorar os 20 anos. A melhor maneira, mesmo, de comemorar os 20 anos é apresentar este álbum.
- Fala-nos um pouco deste álbum.
. O título é "Nus" e é um disco que foi feito a partir d'O Uivo, de Ginsberg, que tem aquela primeira frase hiperconhecida: "Vi os melhores espíritos da minha geração destruídos pela loucura, esfomeados, histéricos, nus". O título do disco vem deste "nus". Não é um disco sobre o Uivo, é um disco cuja base de partida, cujo ponto de disparo foi esse poema - e que é, de ceto modo, uma espécie de retrato geracional daquela que ficou conhecida como a beat generation: a geração do Ginsberg, do Burroughs, do Kerouac, etc. Ao mesmo tempo é um poema cuja construção é muito suis generis, feita por camadas, por sobreposição. E foi um bocado nestas duas ideias que nós pegámos para a construção do disco. Não é uma narrativa - tem mais a ver com o retrato do que propriamente uma história. É um retrato da nossa geração bracarense do início dos anos 80, de onde Mão Morta emanou, e que neste momento vê um declínio. Algumas dessas pessoas começam a morrer, a desaparecer - e este disco é um bocado o nosso adeus a essas pessoas, que nos dizem muito e que desapareceram do nosso convívio.
- Com o Ginsberg, voltaram à beat generation. Já o tinham feito com o Burroughs em "Humano"...
. Sim, usámos uma samplagem da voz do Burroughs.
- O tema "Velocidade Escaldante" não tem também alguma inspiração em Burroughs e no "Naked Lunch" em particular?
. Não. Os ambientes podem ser próximos mas o "Velocidade Escaldante" tem muito mais a ver com a realidade vivida do que propriamente com referências literárias. Mas vejo perfeitamente porque fazes essa ligação...
- Mas os escritores da beat generation são uma influência para Mão Morta a nível lírico ou trataram-se apenas de casos pontuais?
. As influências de Mão Morta são essencialmente literárias. E alguns dos escritores da beat generation dizem-nos muito, de modo que é normal que o nosso universo também esteja imbuído dessa escrita e da própria vivência dessa geração - que tem ligações com a própria vivência da geração em que nos inserimos. A única grande referência americana que temos em termos literários é mesmo a beat generation. As anteriores, as que tiveram influência na beat generation, dizem-nos muito menos e as gerações posteriores também.
- Em termos musicais, como se desenrola o processo criativo em Mão Morta? Tu estás em Paris, há membros em Lisboa, em Braga...
. O processo criativo sempre foi parecido, independentemente do local onde estejamos. Sempre estivemos distantes geograficamente. Há compositores que são creditados no disco e que trabalham a partir da ideia base. Para nós são importantes as ideias, os pontos de partida, que é para dar um enquadramento a cada um, que está no seu canto. Costuma haver essa discussão e depois vai cada um trabalhar para seu lado. Neste caso, encontra-se uma ideia base...
- JP: Musical ou lírica?
. Conceito, sentido... uma ideia mais abstracta, mais filosófica do que propriamente musical ou lírica. A partir desse ponto abstracto começa a trabalhar-se nesse sentido, tanto lírica como musicalmente. A ideia em si, a ideia de onde se parte não é musical nem lírica, é uma ideia filosófica, política ou uma coisa abstracta. No caso deste disco a ideia era trabalhar a partir d'O Uivo, da mesma forma como ele é construído - a tal sobreposição -, e de trabalhar nesta ideia de retrato geracional. Eu trabalho em termos de letras e o Miguel Pedro e o Rafael, que são compositores, trabalham em termos de músicas. Neste disco o Sapo estreou-se como compositor, o Vasco também continuou a apresentar a sua colaboração e trabalhou em termos de músicas. A única pessoa que não fez nada em termos de composição foi a Joana, mas há-de chegar o seu tempo. Depois das coisas estarem minimamente alinhavadas, então encontramo-nos, vemos onde é que as coisas casam - as ideias que eu tive para as músicas deles, as ideias que eles tiveram para as minhas letras -, fazemos alterações, separamo-nos novamente e cada um vai trabalhar com as suas coisas em função do que resultou desse encontro. Voltamo-nos a encontrar, vemos os avanços, os recuos... e as coisas vão-se construindo assim.
JP: - E a gravação? Vocês têm um estúdio vosso? Vão construindo as coisas por camadas, depois tu apareces, mais uma coisa gravada...
. A partir do momento que nós temos as músicas estamos aptos a tocá-las e tocamos na sala de ensaios. Entramos em estúdio como qualquer outro grupo. Poderá haver ainda arranjos feitos em estúdio, pequenos pormenores e tal, mas o tema está construído e grava-se como normalmente. Neste caso gravámos bateria, baixo e voz e depois acrescentámos as guitarras, os teclados e os arranjos posteriores. Basicamente, há duas formas de gravar: ou é tudo junto, como num concerto em "live-take", ou é tudo em separado. E quando se grava tudo em separado, começa-se pela base rítmica - bateria e baixo -, depois metem-se as guitarras e os teclados e a voz fica quase sempre para o fim. A única coisa que fizemos de relativamente diferente destes métodos tradicionais foi metermos as vozes antes das guitarras - não em todos os temas, mas quase.
JP: - Então está desmistificado: Mão Morta não é uma banda que compõe em estúdio.
. Já fizemos esse tipo de trabalho, ou seja, chegar a estúdio sem nada e trabalhar os temas em estúdio. Foi assim que fizemos o "Corações Felpudos" e a maior parte do "Vénus em Chamas" também. Mas normalmente trabalhamos já com uma base, uma estrutura feita em casa e só depois, quando entramos em estúdio, é que terminamos os temas com os arranjos e os acabamentos. O formato definitivo é sempre feito em estúdio.
- Em 2002 iniciaram uma tournée nacional com uma ideia pré-definida. Fala-nos um pouco do objectivo da Carícias Malícias Tour.
. A intenção foi um bocado dupla. Foi e é, porque as coisas não mudaram substancialmente. Por um lado, havia uma necessidade nossa de... sentíamo-nos quase relegados (se é que se pode aplicar o termo neste caso) aos grandes palcos, aos grandes concertos. O grupo está lá em cima, as luzes funcionam todas, grandes produções, etc.... Desde há uns anos que só fazíamos grandes produções. E a ideia surgiu depois de termos ido tocar a Espanha em pequenos clubes, palcos em que mal nos podíamos mexer, em que estávamos em cima do público. De repente, deu-nos uma nostalgia enorme deste contacto físico, de ver o branco nos olhos das pessoas... Porque é que não podemos fazer isto em Portugal!? Podemos! Simultaneamente, chegou uma espécie de crise! Chegámos a um ponto em que o desenvolvimento dos concertos ao vivo, sobretudo de música portuguesa, dependia das câmaras municipais, que eram os únicos contratadores. E quando os orçamentos das câmaras, por causa da crise económica, foram drasticamente cortados, deixou de haver orçamento para concertos e os grupos ficaram todos no desemprego. E esta ideia de nos aproximarmos das pessoas, de haver uma maior intimidade, caiu que nem ginjas como uma solução para fugir a esta dependência das câmaras e ao desemprego generalizado a nível de música. Quando nós começámos, nos anos 80, haviam muitos pequenos espaços, pequenos promotores que faziam concertos - mas isso foi desaparecendo porque as bandas começaram a habituar-se a cachets e a tratamento de star provocado pelas câmaras, pelas queimas... E aqueles promotores individuais, que não tinham dinheiro para estas produções e, sobretudo, porque não podiam pagar para pôr bandas a tocar em espaços que nunca rentabilizariam o cachet das mesmas, deixaram de organizar concertos. Havia que descobrir uma forma de encontrar de novo esse espírito do início dos anos 80, em que eram possíveis esses concertos. Foi uma questão de procurar espaços, de convencer - porque foi preciso convencer muita gente - e de propor às pessoas. Também houve muita gente que recusou com medo de distúrbios, o que também tem a ver com a nossa fama... [risos] Mas foi preciso encontrar um equilíbrio para que desse prazer participar nisto - e desse também prazer financeiro, tanto aos promotores, quanto aos bares, à banda, ao público -, e que a coisa realmente funcionasse. E acho que funcionou lindamente; a Carícias Malícias Tour teve um eco estrondoso dentro das pessoas, a nossa mailing list esteve sempre entulhada de mensagens e fotografias - depois criou-se um fenómeno engraçado, em que se começaram a tirar fotografias e a fazer filmagens dos concertos, e a trocar uns com os outros: "olha aqui foi assim, olha aqui foi assado" - criou-se uma galvanização de tal ordem à volta dessa tournée que nós acharíamos terrível não aproveitar isso. E acabámos por aproveitar fazendo o tal disco na data em que o Henrique Amaro nos convidou para fazer no auditório da Antena 3, escolhendo algumas das fotografias que tinham sido enviadas, fazendo o disco com os fãs. O próprio vídeo que foi feito, foi só com filmagens de fãs. O Manuel Leite, que foi o realizador, limitou-se a montar porque as imagens foram todas tiradas do público e eram imagens belíssimas - e saiu um belíssimo vídeoclip, melhor do aqueles que já tínhamos tentado fazer filmando na Aula Magna, etc. A finalidade prática dessa tournée acabou por funcionar porque, a partir daí, muitas bandas começaram a trabalhar neste tipo de concertos, nomeadamente os Blind Zero e agora os Rádio Macau. Houve muitos espaços que se viraram outra vez para fazer música ao vivo, o que é óptimo pois era exactamente isso que pretendíamos: que as bandas aproveitassem isto e dessem visibilidade a este tipo de circuito e que, ao mesmo tempo, se abrissem espaços para bandas pequenas, que tenham mais dificuldades em tocar, tivessem de repente oportunidade de subir a palco. A revolução não foi radical, mas abriram-se portas e isso para nós já é bastante satisfatório.
- JP: Esta digressão vem também marcar uma viragem já que vocês assumem, com a Cobra, uma postura completamente independente. Nunca cederam a vontades alheias e agora têm finalmente a vossa editora.
. O facto de termos a Cobra não nos dá maior independência. A independência conquista-se pela postura e pelo que se negoceia com as editoras. A Cobra dá-nos mais trabalho mas não independência. Dá-nos algumas dificuldades suplementares, nomeadamente em termos de visibilidade. Quando fizemos a Cobra nem sequer foi por nós. Editámos o "Carícias Malícias" porque fizemos a Cobra sem capital, foi por empréstimo bancário, e pensámos que seria capaz de rentabilizar e ter um feedback financeiro interessante podermos investir na Cobra para editar novos grupos. Porque a nossa ideia era essa: editar artistas que não tenham espaço de edição, de que nós gostemos e achemos que façam um bom trabalho, independentemente do género, e aos quais a estrutura tradicional da insdústria discográfica não dá espaço. O "Carícias Malícias" foi mesmo só para que o capital existisse para podermos apostar nesses grupos. Surgiram os Anger, logo a seguir, com o "The Bliss", o terceiro álbum deles, que não tinha espaço na indústria. É de uma pessoa pensar: "mas como é que é possível uma banda que já tem dois álbuns, que tem um público e um bom trabalho, um trabalho reconhecido... como é que é possível que tenha as portas fechadas?" Abrimos as portas para os Anger, com um disco gravado lá fora e um produtor conhecido, o que até nem era a ideia que nós tínhamos pois também queríamos rentabilizar o estúdio e tentar pôr as coisas o mais barato possível. Era um caso evidente de uma banda com provas dadas e que não tinha espaço editorial. De repente, surge este nosso disco, pelo que aconteceu exactamente o mesmo que aos Anger: também não tinha espaço editorial fora da Cobra. Ou seja, todas as editoras fecharam as portas ao disco dos Mão Morta. Isto está mesmo mau! Afinal não são só as bandas novas que não têm espaço de edição, são bandas consagradas com mais do que provas dadas. No fim, a Cobra está aqui a servir como bóia de salvação para nomes feitos. Estamos a desviar-nos um bocado dos nossos objectivos, que passavam por lançar bandas novas, que não tinham espaço para depois o circuito normal pegar neles - não, estamos aqui a salvar projectos interessantíssimos que não têm espaço de edição. Isso é um absurdo! Mas pronto... de qualquer maneira, é o papel da Cobra.
- Em alguns debates que têm havido, nomeadamente sobre medidas proteccionistas para a música portuguesa, sobre quotas nas rádios e até sobre a questão de cantar em português ou não, tens tido um papel interventivo e tens discordado da opinião dominante.
. Eu não sei qual é a opinião dominante, não tenho acompanhado muito. As minhas opiniões foram manifestadas antes de qualquer polémica e não sei o que se passou depois. Sei que se fizeram associações e mais não sei o quê, mas desconheço quais são as opiniões manifestadas pelos meus congéneres. Relativamente à questão da língua, acho que não tem de haver o que quer que seja de interferências externas sobre que língua se deve utilizar. Eu uso o português, acho que toda a gente devia usar o português mas não cabe a mim nem a ninguém, de maneira nenhuma, obrigar quem quer que seja a fazer o mesmo. Eu utilizo o português porque é a minha língua, a língua em que eu falo, em que me expresso melhor e que me parece mais natural.
- JP: Mas a língua do Rock é o inglês...
. Não. A língua do Rock anglo-saxónico é o inglês. Mas o Rock transformou-se numa linguagem universal, deixou de ser anglo-saxónico. Isto é uma opinião muito pessoal mas que não é impositiva a ninguém. As pessoas habituaram-se a ouvir o Rock com a língua inglesa e não conseguem dominar suficientemente o português para o conseguirem criar em português para esse tipo de ritmo. Nos séculos XII e XIII dizia-se que a única língua para cantar as cantigas era o galaico-português. Quando as pessoas começaram a utilizar outras línguas para cantar as cantigas de amigo, começaram a criar outro tipo de canções. Deixaram de ser as cantigas de amigo galaico-portuguesas e criaram-se outros géneros: as coisas evoluíram e deram a diversidade à música que existe hoje. Se se continuasse a utilizar o galaico-português, se calhar nunca teríamos evoluído das cantigas de amigo. Com o Rock acontece exactamente a mesma coisa. É uma tipologia muito mais recente, do século XX, nascida no universo anglo-saxónico, mas a partir daí há muita evolução. O facto de utilizarem línguas diferentes, com outra métrica, com outra rítmica, obriga a variações e a inventar novas coisas dentro daquela matriz. Se uma pessoa se limitar a copiar o que os outros fazem - e, infelizmente, é o que a maior parte das pessoas que utiliza o inglês faz -, então não vale a pena. Para isso vou ouvir os originais e não acrescento nada de novo, não faço qualquer evolução na tipologia Rock ou Hip-Hop ou o que for. Seria um absurdo uma pessoa estar a ouvir agora em Portugal os gajos do Hip-Hop a cantar em inglês. Os franceses criaram uma diferenciação no Hip-Hop, que é uma matriz também anglo-saxónica, nomeadamente americana. Criaram um Hip-Hop específico, que uma pessoa ouve e detecta logo que é francês - e não é só por eles falarem francês, mas porque utilizar o francês os obrigou a uma outra métrica, a um outro respirar, e isso musicalmente também tem consequências. O Rock é a mesma coisa. Mas isso é uma questão individual de cada um, não tem nada que vir alguém ou uma entidade dizer-nos que temos todos que cantar em português porque, se assim não for, não é música portuguesa. Música portuguesa é um conceito demasiado genérico; o que é a música portuguesa? Música portuguesa tanto é o Pimba como o Rock, a música ligeira, clássica, o Jazz... o que é a música portuguesa? É um bocado absurdo. Porque é que a música cantada em português é portuguesa e a música cantada em inglês não é música portuguesa? Há aqui uma confusão de conceitos e por isso eu prefiro não pensar em termos de música portuguesa.
- JP: E em termos de internacionalização, não facilitaria cantar em inglês?
. Não facilita nada. A prova que não facilita nada é que todas as coisas que são exportadas são cantadas em português, a única excepção são os Moonspell. Tirando estes há os exemplos dos Tédio Boys ou dos Les Baton Rouge, mas são mercados muito específicos. Os Tédio Boys funcionaram no circuito americano de pequenos clubes e os Les Baton Rouge funcionam no circuito europeu, essencialmente de pequenos clubes, misturados com outras bandas. Não é o facto de cantarem em inglês que lhes dá visibilidade, é o facto de fazerem aquele tipo de música, para aquele tipo de público - e de ser um tipo de música que é formatado. É aquele formato e funciona seja qual for a língua em que é cantado. Moonspell é um caso um bocado diferente pois, para além de cantarem em inglês e de funcionarem num mercado específico, criaram um formato. Foram dos primeiros a tentarem uma mistura entre o Heavy e o Gótico. Criaram uma identidade e essa identidade não tem nada a ver com o inglês. O que é que tu queres meter lá fora que cante em inglês? São todos iguais ao que lá fora já é feito, e melhor. Não é a língua que te vai mudar. Se fizeres uma coisa que, dentro do formato Rock ou Pop, em termos estritamente musicais, venha acrescentar algo ao que já foi feito lá fora, se tiveres essa mais valia, independentemente de cantares em inglês ou cantares em português, funciona. Se não acrescentares nada, cantes em inglês ou em português, não funciona. A questão é essa, não é a língua. Os Einstürzende Neubauten acrescentaram algo. Cantavam em alemão e venderam em todo o lado, nomeadamente em Inglaterra, a pessoas que não falam nada de alemão.
- Depois temos aqueles fenómenos locais, as grandes esperanças a nível de exportação em Portugal, mas que depois se revelam fracassos: The Gift, Silence 4... tiveram grande sucesso em Portugal mas lá fora ninguém lhes pega.
. Aquilo é novo em Portugal mas lá fora já existem projectos assim há vários anos. É um pouco como aquele fenómeno Resistência. Pensaram em exportar aquilo. Era em português, mas, musicalmente, aquilo não era nada. Era uma nostalgia de canções, reciclagem de canções que as pessoas já tinham no ouvido. Por isso é que funcionou por cá e por isso é que funcionou nos tops, em termos comerciais. Lá fora, essa nostalgia não existe e as canções que são matrizes, são desconhecidas. Musicalmente, aquilo é nulo. Rigorosamente igual a zero. Nunca funcionaria.
- E quotas nas rádios para música portuguesa. Faz sentido?
. Em qualquer país da Europa as rádios têm quotas e passam uma percentagem elevadíssima de música local.Nós em Portugal temos quotas que não são cumpridas, escandalosamente, porque não há música nacional a passar nas rádios nacionais. Há formatações que vêm dos Estados Unidos, que são passadas cá, e que são lixo americano. Nem sequer são coisas boas americanas o que ouvimos cá: se fosse, ainda pensaríamos: "isto não apoia a música nacional mas ao menos alegra-nos os ouvidos". Mas não é isso que acontece. Passa-se o lixo, passa-se a pimbalhada pop americana e inglesa. Então os gajos, já que se estão a marimbar para o país em que vivem e não têm gosto, então pelo menos obriguem-nos a fazer algum serviço público. Porque no fundo os gajos estão a usar coisas que são públicas. Eles têm obrigações, não é qualquer pessoa que pode abrir uma rádio pois as frequências estão todas tomadas. Ao utilizarem as frequências, que são públicas, e ao terem o uso privativo dessas frequências têm contrapartidas a dar. E uma dessas contrapartidas é fazerem o apoio à música que se faz em Portugal. Não é o único problema que existe em Portugal em termos de visibilidade para a música feita cá, nomeadamente para os seus diversos géneros, mas é um dos grandes problemas que dá origem à crise que se vive actualmente. Música há - mais ou menos criativa, mais ou menos original, mas a verdade é que há muita coisa a ser feita e que, tirando agora a Antena 3 e alguns programas de autor em rádios universitárias, não passa nas rádios.
- Nos vosso concertos ao vivo costumas ser interventivo, não deixas de mandar a tua farpa quando achas necessário...
. Nunca fui muito interventivo. De vez em quando sim mas, na maior parte dos concertos, nem digo nada, limito-me a apresentar as músicas. Continuo a mandar as minhas farpas, nisso não tenho papas na língua. Não tenho qualquer problema em dizer o que penso, quando penso em algo. Não sou obrigado a pensar sempre e há muita coisa que desconheço e sobre a qual não tenho qualquer opinião. Não vou dar opiniões sobre coisas que desconheço e não sei o que é que está em jogo. Sobre as coisas que conheço e que tenho uma opinião, não me coíbo de me manifestar. Mas isso não é regra, não faço dos concertos tribunas políticas, nem nunca fiz. A maior parte dos concertos de Mão Morta, desde o início até agora, limito-me essencialmente a apresentar as músicas. Houve concertos, mais no início, em que nem sequer abria a boca.
- Adolfo Luxúria Canibal. Advogado, frontman de uma banda Rock, carismático. Tudo contribui para que se crie uma espécie de misticismo à tua volta. Como vês a forma como as outras pessoas te vêem?
. Não vejo. [risos] Não sei muito bem... de vez em quando contam-me histórias mas não tenho muito a consciência disso. Sei que, quando estou em Portugal, estou sempre naquele limbo: "será que há alguém que me conhece?" É como aquela história de um gajo viver sempre na mesma rua e conhece os vizinhos todos e todos os vizinhos o conhecem. Todos os vizinhos sabem que moramos no 3º esquerdo, ou coisa parecida. Na nossa rua, tirando aquela fase da adolescência em que nos estamos a marimbar para tudo e só fazemos asneiras, tentamos comportar-nos o melhor possível, não levar as amantes lá para casa, pelo menos não andarmos aos beijos a elas na rua. Há sempre aquele pudor do olhar do vizinho que nos conhece. A minha situação em Portugal é um bocado esta e só tomei consciência dela quando fui viver para França. Portugal é um bocado "a minha rua". [risos]
- E no teu trabalho, achas que essa exposição já te foi prejudicial?
. Não, antes pelo contrário. Antes de ter qualquer exposição já trabalhava, de maneira que já tinha construído as minhas relações de trabalho, já tinha mostrado o que era ou não capaz de fazer, independentemente de qualquer pré-conceito ou pré-valor de olhares que me conheciam apenas por exposição mediática.
- JP: Voltando um pouco à ideia de Portugal ser a tua rua. Já mudaste de casa algumas vezes, até de cidade... Não guardas nostalgia dos locais, desta ou daquela rua? Não gostas de parar um bocadinho num sítio e saborear?
. Não, não guardo. Andei sempre a saltar, nunca estive mais do que 2 anos num sítio e esses sítios por onde fui passando servem-me como referências para me situar em termos de datas, é a única coisa para que isso me serve.
- JP: Mas no teu íntimo, não te situas numa época e num sítio?
. Não, eu sou um cidadão do mundo. A minha relação forte em termos de raízes é Braga. Foi onde passei a adolescência, onde cresci, onde saí do meio familiar e despertei para o mundo. É nessa fase que eu sinto as minhas raízes. Volto sempre lá. É onde eu encontro os amigos e onde tenho prazer em ir. Por exemplo, venho agora a Lisboa - e vivi aqui 20 anos -, e irrita-me imenso, acho insuportável. Não sei como é que consegui viver aqui 20 anos. Acho Lisboa uma cidade lindíssima, mas um gajo quer fazer qualquer coisa e é uma chatice, um trânsito dos diabos... Depois um gajo quer estacionar o carro, anda tudo mal disposto, tudo a correr... é uma coisa insuportável! Cada vez que tenho de vir a Lisboa demoro-me aqui o menos tempo possível. E vivi cá 20 anos!
- JP: E em relação ao Mateus, consideras importante que haja uma certa estabilidade?
. O meu filho viveu 2 anos em Lisboa, já está há 4 anos e tal em Paris, portanto já é muito mais francês do que português. Aprendeu a falar as duas línguas mas de Lisboa já não se lembra. As recordações que tem de Lisboa são de vir cá comigo em que eu lhe fui mostrar onde era a casa onde ele vivia nos 2 anos que esteve cá. Fui-lhe mostrar os aquários (que ele adora peixes), fui-lhe mostrar o Jardim da Estrela onde ele dava os primeiros passos. Aquelas coisas de que ele não se lembrava mas que achava muita piada - mais pela história que eu contava sobre ele. Era mais o lado espelho do que propriamente o reconhecimento do lugar. Mas adora Braga, onde ele vai muito mais. Portugal para ele é Braga, é onde tem os primos - e conhece muito bem Braga, mas as raízes dele são parisienses.
- Queria falar agora neste livro, "Estilhaços". É uma compilação de vários textos e letras que partiu por iniciativa de terceiros.
. Foi da própria editora, a Quasi. Foi o Valter Hugo Mãe que me lançou o desafio. Na altura fiquei assim meio... Mas depois lá arranjei o caixote em que tinha coisas antigas e até me entusiasmei e acabei por descobrir coisas de que já nem me lembrava e a fazer uma compilação e uma escolha de... lixo que tinha por lá.
- E as edições literárias, achas que seria algo a explorar no futuro?
. Eu nunca penso nisso e, mesmo na própria música, à partida, nunca pensei que ia fazer isto ou aquilo ou deixar de fazer. As coisas acontecem e, quando acontecem, se eu digo que sim, gosto de me entusiasmar. Eu entusiasmei-me com isto mas não é uma coisa que me passe pela cabeça: "vou escrever um livro".
Texto: RA / Entrevista: RA + JP
Mão Morta Nus CD'04 . Cobra
Imaginem um bastardo lírico e sonoro de Ministry, Philip Glass, Tricky, The Durutti Column, Erik Satie, Victor Espadinha (como?), Swans, Nick Cave e outras "sementes más". Imaginem convidados especiais num disco como a Marta Ren fora dos histerismos dos Sloppy Joe ou o intragável Miguel Guedes fora do pedantismo dos Blind Zero (recordo um texto algures no meu blog em que considero os Blind Zero como os responsáveis pelo fim da música portuguesa) a cantar em português pela primeira vez. Imaginem uma sonoplastia perfeita de filme do César Monteiro ou até do Manoel de Oliveira. Imaginem os melhores textos sobre a "cultura juvenil" em registo adulto e irónico mas sem ser paternalista e com sangue na guelra. Imaginem uma banda portuguesa de Rock Marginal dos anos 80 a conseguir falar ainda sobre drogas pesadas ou de esperma sem cair no ridículo do anacronismo. Não imaginem, existe um disco assim, chama-se "Nús", é dos Mão Morta e da sua editora Cobra, e é o melhor disco da banda, ao comemorar 20 anos de existência, desde o "Mutantes S.21", ou do - mas incompreendido e mal produzido - "Vénus em Chamas".
É certo que os dois primeiros minutos do disco são irritantes, deixando-nos logo de sobreaviso: "devem querer ser os Fantomas, que seca!". Um gajo fica desconfiado se o que virá a seguir não será baseado nas assimetrias sonoras de Fantomas ou se irá para outros campos. Felizmente, numa fluidez escaldante, o disco torna-se inesperado. É um disco grandioso, cinematográfico, pós-moderno e aberto à discussão.
4,9 Marte
- JP: Li um email teu que continha opiniões muito fortes sobre o 11 de Setembro, e que circulou em larga escala...
. Eram. Quando o mandei não tinha consciência do poder da rede, não sabia que as coisas circulavam assim. Foi a primeira vez que mandei um mail para alguns endereços que eu tinha. Chocou-me imenso. Independentemente do choque que é a queda das torres - e que eu nem sequer vi porque não tenho televisão, só vi fotografias -, independentemente disso, chocou-me essencialmente a ideia da Comunidade Europeia decretar minutos de silêncio por vítimas nesse caso concreto e não decretar minutos de silêncio por centenas de milhares de vítimas noutros casos concretos. Porquê aquelas? Por que não as outras? Ou não se decretam para ninguém ou se decretam para todos. Só aquelas porquê? Isso é que me chocou. Não há cidadãos de primeira nem cidadãos de segunda. Não há brancos e árabes. Não é isso que as distingue ou que as fazem melhores ou piores. Há bandidos na América, em Portugal, na Rússia... Como há gente boa em todos esses lados. Não é a cor da pele, não é a religião que as distingue. Posso compreender perfeitamente que a morte, assistida em directo, crie uma emoção muito maior do que a morte de que apenas ouvimos falar ou que não vemos. Eu não vi as imagens teleivisivas, apenas fotografias, por isso tinha um distanciamento muito maior, não fui apanhado por aquela onda de emoção. Como agora num caso mais recente: Portugal esteve 15 dias em estado de choque porque se viu um jogador de futebol morrer em campo. É uma coisa que acontece amiúde. Depois desse já morreram não sei quantos e ninguém manifesta a mínima emoção, mas aquela morte viram-na. E é essa visão que cega a razão e cria uma emoção muito forte. Como tinha essa distância, de não estar preso pela emoção, achei um absurdo estarem a fazer minutos de silêncio por pessoas e não fazer por outras. Sobretudo quando, neste caso, o país agredido é culpadop de muitas outras vítimas para as quais não se fizeram minutos de silêncio. Quando eu enviei esse mail, pareceu-me uma questão pacífica, era apenas quebrar um bocado o bloco emocional em que as pessoas se encontravam e chamar a atenção para isso. E acabou por se transformar quase num manifesto político, que não era a intenção inicial.
Mécanosphere foi um convite. O grupo já existia em França e anda à volta, basicamente de Benjamin Brejon. Tinha participação de pessoas que entravam e saíam, participavam nos espectáculos e participavam nas gravações. O Benjamin, depois de um concerto nosso que viu no Mergulho no Futuro, em 98, quando estava cá de férias, veio falar comigo e convidou-me. A abordagem inicial era uma autorização para a samplagem de um tema dos Mão Morta mas depois concretizou a coisa para eu meter a voz e ele poder trabalhar isso. E eu fiz, mandei-lhe isso para Paris, eles trabalharam e nasceu o disco "O Lobo Mau".
Quando fui para Paris eles ligaram-me logo: "agora que estás cá, vais fazer concertos connosco". E comecei a fazer concertos com eles lá em França quando podia, quando não tinha coisas cá em Portugal com Mão Morta. Entretanto o Benjamin veio viver para Lisboa e continuamos, apesar da distância. Houve uma altura em que eu vim cá e que o Benjamin agarrou em mim, levou-me a um estúdio e estivemos a tarde a gravar vozes. Depois disse: "agora vou trabalhar as tuas vozes e daqui fazemos um disco". Assim foi, é o disco que saiu - "Mécanosphere".
Sub-Cave de Letras
Nº 6 - Setembro de MCMXCVI
Publicação Mensal da Secção de Audio-Visuais da A.E.F.L.U.L.
Preço: 50$00
40 páginas A4, p/b, papel pesado.
Tiragem: 200 exemplares
Director: João Carlos Callixto
Director-Adjunto: José Maria Antunes
Redacção: Filipe Mateus Pedro, João Carlos Callixto, José Maria Antunes
Colaboradores: João Santos Marcelo, Paulo "Anarca", Fred, David Pires
Entrevista Em Letras
Sidónio Pai da Sida
Numa tarde de Maio bastante agradável, os Sidónio acederam a uma entrevista em exclusivo para a Sub-Cave. Actualmente, a banda prepara arduamente o segundo registo discogra´fico, o duplo-álbum Albicastrum, depois de no início terem causado sensação com a edição de R.E.D. S.E.V.E.N. A pressão e a expectativa no novo lançamento é bastante grande. Vejamos como decorreu a entrevista que teve como banda sonora bezerrante o clássico Algarismos, de Carlos Paião. Gostávamos de agradecer à Tuna Feminina pela cedência do local onde decorreu a entrevista.
Sub-Cave - O que vos levou a produzir o vosso álbum de estreia?
Biana - Sidónio é um estado de espírito para o qual o mundo não está preparado (...)
Putchy - Acho que nesse caso (...), não é para sermos vaidosos, mas há que perguntar aos principais membros fundadores o que os levou a criar Sidónio.
S.C. - E quem foram, já agora, esses fundadores?
Marcelo - Tudo nasceu um dia...
P. - ... quando estávamos na salinha da A.E. e pronto, não tínhamos nada para fazer, a verdade é essa, e começámos a fazer covers de Tony de Matos, e decidimos, isto é uma m*rda do c**alho, e então decidimos fazer música a sério, e lembrámo-nos do filme "As Super-Leiteiras", com aquela banda sonora fabulosa, e então o Marcelo disse: "Vamos tocar". E eu disse: "Yah". E então tocámos...
M. - Foi verdade (...)
S.C. - E foi assim que nasceu o tal estado de espírito?
P. - É difícil de responder. Nasceu assim: vamos fazer um projecto que nunca tenha sido feito até hoje. E então encarnámos as nossas tendências minimalistas, gótico-depressivas, baseadas no Pós Pessimismo
Norueguês...
B. - E nas carraças suecas (...)
M. - O mundo tal como o conhecemos está completamente prevertido por uma necessidade enorme de racionalização das coisas, contra a qual nós nos insurgimos, porque achamos que a verdadeira essência do ser está nos impulsos, nas vontades de cada um. (Entretanto, o Artur arrota) Trata-se de coisas que vêm lá do fundo, como o que acabámos de ouvir...
P. - No fundo é exteriorizar aquilo que interiorizamos...
M. - É aquilo que sentimos sem ter de andar à procura de uma razão para fazermos as coisas. Temos vontade de as fazer fazêmo-las...
P. - Ir para onde nos leva o vento.
S.C. A vossa música só poderia ser feita por vocês ou...
P. - Absolutamente, sem dúvida nenhuma.
S.C. - E caso integrasse um elemento estranho?
P. - É que se tivesse um elemento estranho, faríamos com que fosse absorvido pela nossa cultura musical que, no fundo, é Sidónio.
B. - É um bocado a teoria do Charles Darwin. Adapta-se à natureza e ao meio ambiente.
P. - exacto, e só os fortes sobrevivem, que no fundo somos nós...
M. - Não é uma questão de sermos ditadores, não é por aí que passa, não é uma pessoa que entra na banda e nós passamos a exigir dela uma série de comportamentos. Essa pessoa vai ter que se adaptar porque, mais cedo ou mais tarde, será confrontada com a realidade de que tem de haver uma impulsão dos sentidos e não uma racionalização de tudo aquilo que se passa à nossa volta.
Bruno - É exactamente por aí que se dá a adaptação ao espírito Sidónio, que passa por uma pessoa livrar-se desses preconceitos, dessas ideias pré-concebidas, que o levam a racionalizar a realidade tal qual lhe é apresentada, de uma maneira que lhe foi imposta, porque ele não racionaliza a realidade para si, mas para os outros (...) É um niilismo autêntico, que se traduz numa total ausência de ideias. Nem quer dizer que isto se reflicta na música, porque, como já foi observado pelos críticos, a nossa música passa muito pelos compassos quaternários (quatro por quatro). Mas não é isso que importa, o que importa é o nosso estado de espírito.
P. - É libertarmo-nos de todas as enfermidades musicais que nos rodeiam, o que no fundo se resume a duas palavras: cala-te e chupa.
S.C. - Então trata-se de um recomeçar de novo?
M. - É um bocado um regresso às origens.
P. - Não é tanto isso (...) No mundo musical, é um voltar atrás um pouco mais à frente.
B. - Quem ouvir atentamente Sidónio vê que há uma harmonia entre os instrumentos e, ao mesmo tempo, uma independência entre si, mas que se harmoniza.
P. - Eu discordo profundamente (...) Sidónio simboliza a liberdade musical.
B. - E porque não a liberdade prisional?
P. - No fundo, isto retrata toda a dialéctica entre compositor e ouvinte. No fundo Sidónio é isto: nós somos os ouvintes de nós próprios.
S.C. - Vocês são os ouvintes primários, mas procuram que mais pessoas vos ouçam, ou não?
P. - Quando uma pessoa ouve Sidónio, a primeira impressão que tem é que isto é um bocado estranho. No entanto, ao ouvir, vai entrando naquele doce embalar que é a nossa música, interiorizando e, sem dar por si,
é uma perfeita fã de Sidónio.
Br. - O que nos interessa é que as pessoas oiçam a música e não compreendam: e o que é não compreender? É aquilo que nós tentamos transmitir, devendo compreender segundo a sua própria visão da música; nós
não queremos transmitir uma ideia a alguém, queremos que essas pessoas fiquem com essa ideia transmitida por nós.
P. - É como se fôssemos a faísca que despoleta toda uma série de questões intrínsecas à própria pessoa. Somos os catalizadores entre as dúvidas pessoais de cada um e a m*rda que as rodeia (...) Porquê um
penso higiénico normal e um com abas?
M. - (...) A nossa intenção é fazer música por aquilo que vale, mesmo que não valha nada.
P. - (...) É o "toco, logo existo", ou será mais logo exausto (...) R.E.D. S.E.V.E.N. foi tocado num espaço mítico, num micro-espaço mitológico, ao nível da mitologia e foi tocado com grande sentimentalismo ao nível
do sentimento; era preciso ter estado lá e sentir o cheiro a bosta ressequida, da palha molhada (...)
M. - Não é preciso as pessoas gostarem, o fundamental é fazer aquilo que nós temos vontade e não nos estarmos a cingir a uma série de convenções que nos perturbam e que vão vincar a nossa existência.
Pretendemos fazer as coisas quando nos apetece faz~e-las, quando isso nos dá prazer, e é preciso encarar a vida de uma maneira alegre, de forma a não nos deixarmos perturbar pelas coisas más dela. É preciso
que esta seja entendida por nós como um processo em que temos coisas boas e coisas más, mas onde não é preciso arranjar subterfúgios de espécie alguma para esconder as coisas más que a vida tem. Temos
de as encarar e viver tal como se vivem as coisas boas.
P. - A música de Sidónio é um elemento de comunhão, no fundo, é como uma hóstia.
S.C. - Mas a música de Sidónio está mais relacionada com as pessoas da Faculdade, ou não?
P. - Não, essa é a associação directa do ouvinte. As pessoas da Faculdade são apenas o público que mais facilmente entra em contacto connosco.
B. - Sidónio é uma música abrangente a todas as classes sociais, desde o pessoal da Musgueira a Chelas.
M. - Face à Sub-Cave nº 3, a propósito do nosso primeiro mini-álbum, gostaria de referir que a participação do Artur não é especial, mas intrínseca.
Br. - Nós queríamos participação espacial, foi um erro na gráfica.
Artur - Eu sou a minoria silenciosa em Sidónio, portanto não me pronuncio sobre nada (...) MAS PORÉM gostava de dizer que participar em Sidónio é diferente (...) EMBORA seja diferente (:::) SE BEM que haja uma apetência especial para a igualdade na diferença (...) PORÉM...
M. - Essa questão não passa por todos diferentes todos iguais, mas por um problema muito maior do que esse, todos indiferentes, todos iguais.
S.C. - Mas a indiferença de quem? A vossa, também?
B. - Também nossa, estamo-nos cagando para os outros, o que interessa é curtirmos Sidónio.
Br. - Nós queremos prestar um grande favor aos outros, que é ajudá-los a sair desse estado híbrido, partir essa redoma baça que os envolve...
A. - SE BEM QUE...
Br. - ... Que os impede de olhar para a realidade...
A. - ... Apesar de tudo, haja alguém...
Br. - ... E ajudá-los a morrer para os fazer renascer.
A. - AINDA mais por isso, convém acrescentar que o que diferencia Sidónio da inúmera mole de bandas que se acotovelam por um lugar ao sol é o gozo que dá fazer as coisas.
Br. - Eu discordo profundamente e abandono Sidónio agora mesmo. Sidónio acabou.
P. - Não, ó Bruno anda cá.
Br. - Mas fico cá para combater esse espírito divisor.
A. - EU GOSTAVA DE ACABAR, já que... OK. Mas retomando a questão de que falava há pouco (...), o gozo que me dá fazer é tanto quanto o que dá ouvir e aí é que difere, é o gozo... e a droga.
S.C. - O que mais vos atrai em Sidónio?
P. - Nós próprios. Eu podia levar o dia todo a olhar-me ao espelho.
M. - Nós fazemos as coisas porque nos apetece.
A. - APESAR DISSO...
Br. - Como diria António Aleixo, poeta algarvio que nasceu e morreu analfabeto:
"É triste que a gente veja
Tanta gente que não come
Pão que a muitos sobeja
Matava bem essa fome"
Tanta gente que anda por essa realidade fora embuída de ideias que lhe são estranhas, exteriores, e que não pode comer a "realidade" que ele vê, não pode assimilar essa realidade segundo o seu próprio garfo e faca
e nós podemos dar de comer (comer espiritual) a todos esses infelizes que andam por aí.
M. - O que me chateia em Sidónio é que nós podemos estar aqui um dia inteiro a dizer m*rda porque nos apetece, mas o que nós queremos nunca pode ser feito porque a sociedade está de tal forma impregnada de
preconceitos que não há um lugar em que as pessoas possam abrir os seus horizontes e fazer aquilo que lhjes apetece. Nós próprios tentamos lutar contra isso, mas quando é que nós o conseguimos, só se
tivéssemos dinheiro e tempo, e não dispomos nem de um nem de outro.
P. - A verdade é que nunca nada assim foi feito...
A. - Já foi já, pelos Beatles (...)
P. - ... No seio da música portuguesa, saímos de todos os parâmetros musicais que existem. Nós exploramos os vazios da música portuguesa.
M. - Mas mais uma vez há que sublinhar que essa exploração não passa por uma coisa diferente, que seja uma alternativa. Nós somos aquilo que somos e acabou (...)
P. - Em 1907, o arqueólogo Luis Ciré, um verdadeiro profeta, afirmou que "foram os Sidónios que descobriram e exploraram o que os indígenas ainda não conheciam".
S.C. Mas então é daí que vem o vosso nome?
M. - Não, não. O nosso nome apareceu porque foi a primeira que nos ocorreu.
P. - É genético
M. - Já houve quem analogias para o nome como Sidónio Pais da Silva, mas surgiu porque tinha que surgir.
P. - Estava predestinado.
M. - Como dizia Orson Welles, "a ausência de provas não é a prova de ausência".
P. - No fundo, nós provamos que estamos cá, o que quer dizer que, por sua vez, é impossível provar que não estamos cá.
A. - Eu só queria dizer que gostava que o vocalista dos Oasis morresse de SIDA e se ele tiver c***ões que me responda ou vá lá a casa, que a minha mãe terá muito prazer em atendê-lo. E não quero iniciar aqui uma
guerra com os Oasis, nem com os Blur, porque eles são muito pequenos quando comparados com Sidónio (...).
B. - Sidónio não é regra, Sidónio é tudo contra a regra.
Colectivo Sidónio - Acho que lá em cima está o Tiro-liro-liro e cá em baixo está o Tiro-liro-ló, juntaram-se os dois à esquina, a tocar concertina e dançaram Sidónio.
A. - Para acabar, se quiserem adquirir a cassete, que tem o valor simbólico de 500$00, podem fazer os vossos pedidos na A.E.
Elegy Iberica - 2007
84 páginas - papel de luxo, brilhante e pesado, daquele que até apetece cheirar :-)
42 páginas num sentido e as outras 42 noutro sentido (do avesso), isto é, a "começar na contracapa"
Revista de Música, Arte e Culturas Alternativas & Underground Edição Portuguesa #6 / Bimestral / PT Continental - 7€
Editor: Ahmad Rahgoshay
Director Geral: David Cruz
Chefe de Redacção: Pedro Novo
Redacção: André Henriques (fot.), Augusta Araújo, Constança Araújo A, David P., Gonçalo Vasco, Gonzalo Muniz, José de Almeida, Luís Salvedas (Milkman Studios), Luiz Soncini, João Carlos (Milkman Studios), Miguel Silva, Mónica Bastos, Paulo Perdiz (Rádio Terranova), Pedro Novo, Tarântula.
Colaboradores: Álvaro Fernandez, António Carreira (Street Dog Studio), Bruno Jesus, Carlos Castro (Rock Heavy LOUD), Carlos Matos, Catalina Isis Millán (Sonido Obscuro), Catarina Medina, Cephas Solis, Cristian Rubio Villaró, Dora Carvalhas, Fábio Franco, Francisco Carvalho, João Ventura, Korngan (Batcult), Maria Augusta araújo, Mário Nabais, Mauri Ibanez Sangés, Miguel Silva, Miguel de Souza, Nelson Coelho, Paulo Moreira, Pedro Penãs Robles, Raquel Almeida, Rene Kojtani, Reynaldo Gonzales A, Sónia Gomes, Yorgos Goumas.
Reportagem Concertos Of The Wand And The Moon Sociedade União Sintrense - 15.12.2006 Sintra - Dagaz Music
"O raiar de uma lua dinamarquesa"
Depois de uma reentrada em cheio com os concertos dos Spiritual Front e do violinista Owen Pallett dos Arcade Fire, sob o nome de Final Fantasy, em Outubro passado, a organização Dagaz Music apostou, com
excelente pontaria, num concerto duplo, a uma semana do solstício de Inverno, e o qual reuniu duas almas quase gémeas do novo folk europeu, a saber o projecto maioritariamente alemão Sonne Hagal (SH), e os dinamarqueses Of The Wand And The Moon (OTWATM), de Kim Larsen. Assim, uma espécie de audiência "reciclável" ("somos sempre os mesmos", costuma ouvir-se neste reencontros) esteve de volta a Sintra para mais uma noite em família com esta música que teima em resistir, este híbrido da tradição folk, que nos últimos 20 anos se entrecruzou (com surpreendente eficácia!) com as matrizes industrial, ambiental e marcial, sem que daí resultasse qualquer forma musical "crioula", o que talvez se traduza na chave-mestra do mistério "dark-folk"... Para começar, são óbvias as várias asserções que não escamotearemos: sim, é óbvio que as duas bandas desta noite são praticamente o mesmo grupo, apenas mudam de instrumentos em palco; é também óbvio que devem muita inspiração aos "pais" britânicos do "movimento", como os Death In June,
os Sol Invictus, os Fire and Ice, etc.; será ainda mais óbvio que, a julgar pelos nomes dos colectivos, os seus membros são pessoas dadas ao conhecimento desse ancestral oráculo europeu - as Runas; por fim,
eventualmente por serem nórdicos, são donos de uma frieza gentil e receptiva, que se escuda atrás de uma distância atenciosa, sem nos fazer grandes concessões pessoais, a nós, pobres latinos, sempre à caça de
emoções exteriorizáveis e mortinhos por debitar homéricas torrentes de conversa... Em palco, tanto os OTWATM, como os SH, que abriram a noite, quase balbuciam as informações estritamente necessárias para ilustrar à audi~encia o tema que se segue; a apresentação dos SH é curta (apenas 6 temas), mas dá para entrever uma crescente coesão neo-folk que já se adivinhava no belíssimo mini-lp "Nidar". E mesmo com o já distante álbum "Helfahrt" como principal referência, não foi difícil ás 70 pessoas na sala da Sociedade União Sintrense, sentir que as próximas materializações sonoras dos SH lhes farão ainda maior justiça. Com a mudança de posições em palco e a focagem na peculiar figura de Kim Larsen / OTWATM, qual "karl" viking, calvo e de longa barba ruiva eriçada, dá-se o fenómeno da transmutação. Com a serenidade que o caracteriza, guitarra acústica em punho, repõe temas do mais recente álbum "Sonnenheim", assim como dos anteriores "Nighttime Nightrhymes", "Lucifer" e "Emptiness, emptiness, emptiness...", apenas pontuados pelo ritmo marcado nos "kettle-drums" por Oliver dos SH, e com o "back-up" da guitarra eléctrica e das teclas dos outros dois músicos convidados para esta encarnação de OTWATM. Num concerto com semelhante enquadramento, os dois encores finais são um sinal de dupla leitura - um público indefectível e uma agradável surpresa para o próprio Larsen. No "aftermath" Rui Carvalheira da Dagaz Music, irónico, anunciava-nos que não tinha vontade de organizar mais nenhum concerto - já que este tinha elevado a fasquia o mais alto que alguma vez pudera sonhar...
Conversa com um Viking
Apenas umas horas antes, e após ambas as bandas terem completado o respectivo "sound check", havíamos trocado breves impressões com Kim Larsen dos OTWATM. Assim, esta foi a primeira data de uma
pequena apresentação ibérica, aliceçada sobretudo ainda no mais recente álbum de originais Sonnenheim, com cerca de um ano de existência. Larsen não adianta para já outras saídas embora preveja o seu regresso para breve à Alemanha, onde como sabemos os festivais Dark Folk são quase tantos como os cogumelos.
"Sonnenheim" foi um disco que levou algum tempo a preparar, tendo em conta que este é o modo como Kim Larsen gosta de trabalhar - espaçadamente, com rigor e minúcia na produção dos temas, não havendo por isso grande pressa em avançar para o seu sucessor. De acordo com as expectativas, o último álbum dos OTWATM teve o impacto desejado, com uma boa distribuição assegurada na Europa pela Tesco
Organisation. Na proverbial modéstia que o caracteriza, Larsen é frontal mesmo quando confessa a sua grande dificuldade em julgar os seus próprios trabalhos, não fazendo distinções de qualidade entre o último e os seus anteriores - apenas diz que foi um álbum que lhe deu um pouco mais que fazer do que o habitual.
Kim Larsen aceita a observação que aponta o 1º álbum de 1999, "Nighttime Nightrhymes", como o seu disco mais abrangente e aberto a um leque estilístico mais variado, mas aos seguintes "Emptiness emptiness
emptiness" e "Lucifer" considera-os mais como duas partes do mesmo conto. Mantendo a parcimónia, Larsen concede pontos à apreciação de que são dois álbuns intensos, introspectivos e nada inferiores aos
primeiro e último. À nossa questão de como pôde ser "Lucifer" um disco tão eficaz, baseando-se à partida em temas que já estavam previstos e gravados para "Emptiness...", Kim Larsen encolhe vagamente os
ombros afirmando que nada mais fez que reavivar o que ainda estava em brasa, isto é, tratava-se de canções com uma força natural que facilmente puderam ser trabalhadas com mais afinco, resultando muito bem na pós-produção.
Num outro momento da conversa, o dinamarquês confessou-nos o seu quase total desconhecimento da cena portuguesa em matéria de dark-neo-folk, ou mesmo este "novo folk", e quando lhe demos como
referências os nomes de Sangre Cavallum, Karnnos, Wolfskin, Beltane ou The Joy of Nature, foi-nos respondendo com vagas interjeiçoes de quem já tinha ouvido falar ou mesmo conhecido um ou outro tema. De resto, nas suas palavras, persiste ainda alguma falta de consistência neste movimento europeu, que recupera uma tradicional genealogia musical, cuja origem se perde na noite dos tempos. A título de exemplo
apontou-nos o recente disco de solidariedade com o alemão Andreas Ritter, dos Forseti, apropriadamente intitulado "Forseti Lebt". Andreas sofreu no ano passado uma paragem cárdio-respiratória que o arredou
definitivamente da actividade musical, e "Forseti Lebt" reúne as participações de nomes amigos como Death In June, Waldteufel, Fire and Ice, Sonne Hagal e B'eirth dos In Gowan Ring, entre outros, revertendo a
venda para a recuperação de Andreas.
Foi esta a nossa breve conversa com este viking bem pacato, e citando a canção ".. um pouco tímido até", não obstante um certeiro sentido de humor, a julgar pela sua mensagem final para os admiradores Portugueses - "Keep on rockin in the free world...". João Carlos Silva / 4Luas Aveiro FM, 96.5Mhz
Ficha Técnica
Principal Suspeita: Mary-John
Cúmplices: Kara Podre e Lia Gamma
Tiragem: 2500 exemplares
Distribuição: Gratuita
Origem: Algés
Número de Páginas: 28
Papel de luxo brilhante em toda a revista - capa a cores, restantes páginas a p/b
Yeah Yeah Yeahs Bang!
Um trio de rock. Em três palavras será esta a definição para os Yeah Yeah Yeahs. Oriundos de Nova Iorque, e juntos desde o passado ano 2000, Karen O, Nick Zinner e Brian Chase decidiram unir esforços na
salvação do rock 'n' roll, ou se quisermos de uma linhagem mais dura das reminiscências dos blues, o abrasivo garage rock. Terminada a digressão europeia feita ao lado de Jon Spencer e dos seus Blues Explosion,
o triunvirato voltou à big apple para retocar os pormenores do seu álbum de estreia, ainda sem saída marcada para as lojas. E foi ao som de "Bang!", o tema mais rodado do seu auto-intitulado EP de estreia editado
em 2001, que falámos com Nick Zinner, o homem da guitarra dos Yeahs. Os companheiros de missão não puderam comparecer à demanda, mas os esclarecimentos possíveis foram mesmo assim transmitidos.
A história dos Yeahs começa no verão de 2000, quando Nick e Karen se encontram pela primeira vez, tornando-se eventualmente inseparáveis. Começaram por escrever algumas composições tolas, antes de um
amigo em comum abrir-lhes o caminho para actuarem como banda de suporte dos White Stripes; tudo o resto faz agora parte da história. Os guias na reencarnação de inspirações aparecem ligados aos Rolling
Stones ou aos Stooges apenas por um reconhecimento de mérito ancestral, e quanto a descobertas actuais, estas passam pelos Lovelife de Baltimore, os Liars, os Flux Information Services, os Sssion, os Black
Dice, os Soulwax, e por último pela memória hard rock dos Motley Crue. A escolha de Nova Iorque como o centro de operações necessário é revelado nas escassas palavras de Nick, que ainda assim abriu o peito e
revelou que embora a capital do planeta seja bastante cara para se viver, a Europa está mais aberta ao "bom-bom-bom", daí a aposta clara em começar também por aí a investida. Partimos então à descoberta das
sensações encontradas ao lado de Jon Spencer, durante a recente tournée europeia. As viagens com o criador de "Talk About The Blues" permitiram sentior o quanto a banda do ex-Pussy Galore é feita de
"verdadeiros cavalheiros".
A euforia recente em volta do afamado rock revival e de bandas como os Strokes, foi depois um assunto incontornável. A legitimidade da questão aparece acoplada a opiniões recentes da crítica, que colocam os
Yeahs perto da banda de Julian Casablancas, mas até junto dos Elastica, aqui talvez tão só devido à identificação da liderança comum nas vozes de Justin Frischmann e Karen O. A única verdade, segundo Nick, é
tão só o entusiasmo escusado de uma imprensa ávida em vender mais números.
E se o rock e seus derivados não estivessem esgotados, certamente a resposta para algumas questões essenciais não seria encontrada nas mentes de uma geração consumida. "Apanhada entre uma e mil vozes",
textualmente, segundo as palavras de Nick, que aproveita a deixa e nega a existência de uma ressalvada pós-modernidade, e expõe a total negação, confusão e crise de todo um mundo que não trabalha e está
endividado, é tempo de tomar o que é nosso e fazer o que é nosso. Antes do fecho, ficou a promessa dos Yeahs em voltarem à Europa para a festa dos festivais de verão, assim como a certeza de um futuro universal
entregue às pipocas e às soap operas. Kara Podre
#60 - "Brian Eno (starsailor)" Fernando Magalhães 08.01.2002 150308 Do período pop: Here Come the Warm Jets (1973) - 9/10 Takin...
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LULU (versões mais antigas - com alguns textos em falta, entretanto descobertos. Tal já não acontece com as versões mais actuais, publicadas agora na Bubok - Portugal - ver acima)
Volume 1 - 1988/1991
Volume 2 - 1992/1994 (460 páginas, formato maior que A4)
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