29.7.16

Recordações (3)


Recordação / Homenagem ao meu amigo Jesuíno Simões e à sua banda "Die Neue Sonne"





A Faixa "A Dansa Dos Mortos" dos Die Neue Sonne, é a 8ª






28.7.16

Livros sobre música que vale a pena ler (e que eu tenho, lol) - Cromo #60: Ricardo Alexandre - "João Aguardela - Esta Vida De Marinheiro - Dos Sitiados à Naifa, A Rasgar A Vida"


autor: Ricardo Alexandre
título: João Aguardela - Esta Vida De Marinheiro - Dos Sitiados À Naifa, A Rasgar A Vida
editora: Quid Novi
país: Portugal
nº de páginas: 222
isbn: 978-989-554-870-5
data: 2011 (setembro)
1ª edição
prefácio: António Pires, jornalista


Ricardo Alexandre é natural do Porto. Director Adjunto de Informação da RTP-Rádio desde Novembro de 2005, coapresenta na Antena 1 o Programa Da Manhã e é autor e apresentador do programa Visão Global. Foi Editor na RTP (2001/2005) e na Antena 1 (1994-2001).
Licenciado em Sociologia pela Universidade do Porto e mestre em Sociedades e Políticas Europeias pelo ISCTE, deu aulas de Rádio na Universidade de Coimbra (2001/2008), bem como em Moçambique, Cabo Verde, Timor Leste e Macau.
Foi enviado especial aos conflitos nos Balcãs, Afeganistão, Timor e Médio Oriente, e também ao Irão, Paquistão, Indonésia, Líbia, Chipre, Irlanda, Estados Unidos, Brasil e Costa do Marfim.
Coautor do livro Visão Global - Conversas para Entender o Mundo, com José Cutileiro. Autor dos livros Por Uma Vida Normal: Era Uma Vez a Jugoslávia, Viver na Intifada e Irão, o país nuclear.
Distinguido com o 1º Prémio de Reportagem Rádio do Clube Português de Imprensa (1999) e Prémio Rádio da Casa da Imprensa (2005).
Autor de vários programas de rádio sobre Música Moderna Portuguesa em rádios locais e regionais nos anos 80, foi fundador e chefe de redacção da revista Ritual e criador das Noites Ritual Rock.
Amigo do João.

Prefácio
No filme de Tiago Pereira «Significado - A Música Portuguesa Se Gostasse Dela Própria» (título inspirado numa frase dita por João Aguradela), Nuno Paulino pergunta: «Como é que se dança Megafone?». A dúvida, pertinente, tem a ver com a dificuldade que é conciliar, musicalmente e depois «coreograficamente», danças do passado com danças do presente.
A mesma dúvida que se poderia pôr em relação aos Gotan Project, a Mercan Dede, aos Ojos de Brujo a Nitin Sawhney, isto é, a muitos outros que tal como o Megafone de Aguardela também vão às músicas (e danças) de raiz tradicional para as lançarem em direcção ao futuro.
A dúvida que, presumo eu, terá tido Ricardo Alexandre ao escrever este livro sobre a vida, amores, afectos e a imensa e variada obra do seu amigo João Aguardela terá sido diferente mas paralela a esta: «Como é que vou ao passado e transporto para o presente (e para o futuro) a vida riquíssima do João?». Se essa dúvida existiu, está mais que ultrapassada: João Aguardela - Esta Vida de Marinheiro é o retrato mais-que-perfeito de João Aguardela como Homem, como Artista e como Amigo.
Fazendo uso da sua memória pessoal - muitas vezes, este livro é também, e bem, sobre si próprio - e entrevistando igualmente as pessoas certas, Ricardo Alexandre traça fielmente o percurso singular de uma pessoa também ela singular, única e irrepetível da (na) música portuguesa. Está aqui, inevitavelmente, a história dos Sitiados, do Megafone, da Linha da Frente e d'A Naifa.Mas estão também aqui outros projectos, embrionários ou em desenvolvimento, em que João Aguardela esteve envolvido: os Hyperactive Child (depois chamados Meteoros, origem remota dos Sitiados), as suas parcerias com músicos dos Clandestinos (principalmente no Bar das Palmeiras, antiga sede do PSR), a banda de um concerto só Johnny Gordony & The Guys ou as jams que ele, Sandra Baptista e amigos faziam em casa por puro divertimento.
Também por isso, , estão neste livro muitos dos cúmplices de João Aguardela nas suas aventuras musicais. Mas também muitos outros, seja devido aos seus empenhamentos políticos, seja devido às várias amizades extramusicais que foi semeando. E, no meio disto tudo, Ricardo Alexandre vai deixando pistas sobre o amor de Aguardela pela música., a dele e dos seus companheiros mas também a dos outros. Pistas que podem servir como um manual perfeito para quem quer começar nas lides musicais ou até já lá está. O relato do que Aguardela sentiu quando viu Tim, o vocalista dos seus ídolos de juventude, Xutos & Pontapés, a cantar com a Resistência o tema A Noite, dos Sitiados, é absolutamente exemplar.
Se houvesse justiça neste mundo, este livro - na verdade - não devia existir. Ou, pelo menos, da maneira que existe. E basta ler um dos apêndices deste livro - as mensagens deixadas por fãs e amigos no site do jornal Público quando da morte de João Aguardela - para se perceber o que isto quer dizer. Mas, como não há, é mais que justo que exista. E que seja exactamente este.
António Pires, jornalista








27.7.16

Livros sobre música que vale a pena ler (e que eu tenho, lol) - Cromo #59: Nick Cave: "The Complete Lyrics 1978-2013"


autor: Nick Cave
título: The Complete Lyrics 1978-2013 (fully updated)
editora: Penguin Books
nº de páginas: 529
isbn: 978-0-241-96658-7
data: 2013
prefácio: Will Self
1ª edição: 20001
2ª edição: 2007
UK - £14.99
CAN - $25.00


Nick Cave nasceu na Austrália em 1957. Mudou-se para Londres com a sua banda, os The Birthday Party, em 1980. Quatro anos mais tarde formou The Bad Seeds, com os quais gravou quinze álbuns de estúdio. Em 1999 ele foi o curador do anual Meltdown Festival em London's South Bank Centre.
As suas novelas And The Ass Saw The Angel (1990) e The Death of Bunny Munro (2009) foram best-sellers internacionais. O seu filme The Proposition obteve uma larga aclamação crítica em 2005, enquanto a sua banda Grinderman editou dois álbuns. Nick Cave vive na Costa Sul da Inglaterra.

INTO MY ARMS
I don't believe in an interventionist God
But I know, darling, that you do
But if I did I would kneel down and ask Him
Not to intervene when it came to you
Not to touch a hair on your head
To leave you as you are
And if He felt He had to direct you
Then direct you into my arms

Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms

And I don't believe in the existence of angels
But looking at you I wonder if that's true
But if I did I would summon them together
And ask them to watch over you
To each burn a candle for you
To make bright and clear your path
And to walk, like Christ, in grace and love
And guide you into my arms


Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms

But I believe in Love
And I know that you do too
And I believe in some kind of path
That we can walk down, me and you 
So keep your candles burning
And make her journey bright and pure
That she will keep returning
Always and evermore


Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms, O Lord
Into my arms








26.7.16

Livros sobre música que vale a pena ler (e que eu tenho, lol) - Cromo #58: Luís Jerónimo e Tiago Carvalho (compilação) - "Escritos de Fernando Magalhães - Volume IV: 1996"


autor: Luís Jerónimo e Tiago Carvalho (compilação, introdução e prefácio)
título: Escritos de Fernando Magalhães - Volume IV: 1996
editora: Lulu Publishing
nº de páginas: 330
isbn: none
data: 2016
prefácio: João Gonçalves


Texto/Citação na Contracapa (se fizerem o download vê-se bem, mas aqui fica):























































FM


PREFÁCIO
Fernando Magalhães.

Já passaram mais de dez anos desde a sua morte e, no entanto, o Fernando Magalhães continua tão presente e actual na minha vida.
A relação que tive com ele foi dos maiores privilégios que a vida me deu. Primeiro nunca pensei um dia tornar-me amigo de uma figura que me habituei a respeitar e admirar só pelo que lia na imprensa dedicada à música.
Podemos começar por aí.
Quando me apercebi que, além de futebol, a minha vida precisava de muita música, o desejo de descobrir, ouvir, aprender e ler foi descontrolado. Foi em plena década de 90 que alarguei os meus horizontes musicais numa incessante procura de novos sons, culturas e fusões que pareciam não ter fim. As influências mais óbvias eram os amigos e familiares mais velhos ou mais dedicados que iam passando as dicas mais comuns e populares. Quando os grandes nomes da pop e do rock já estavam esgotados, aumentou a necessidade de conhecer mais.

Recordo com saudade os caminhos percorridos que me levaram até Bristol. O mistério de Tricky, a densidade dos Portishead, a energia dos Massive Attack que num instante me levou às raízes do reggae via Horace Andy.
PJ Harvey, Bjork e Beck, e por aí fora.
Estavam abertos os horizontes para tantos quintais, a chamada música alternativa, o trip hop, o reggae, o rock mais escondido. Foram dezenas e dezenas de nomes descobertos em formato de cascata, uns levavam aos outros.
Isto tudo sem a ajuda da internet, imagine-se! Os veículos que nos transportavam nestas viagens eram os mais artesanais e clássicos possíveis. O suplemento do DN+, do Diário de Notícias, a revista mensal que as lojas de discos Valentim de Carvalho ofereciam, a MTV, sim chegou a ter música e bons programas, acabada de chegar a Portugal, a rádio, sempre a rádio, Antena3, Super FM, XFM, Energia e outros clássicos da década de 90.
E, claro, as páginas do Público dedicas à cultura e em especial o "Sons", suplemento dedicado às artes. É por aqui que Fernando Magalhães entra na minha vida.
As suas criticas incisivas a discos, as suas entrevistas desconcertantes, os seus relatos de concertos, tudo era prosa digna de se recortar e guardar. Mesmo quando ia contra os meus gostos estabelecidos, como por exemplo o reggae, que ele odiava.
Lembro-me de comprar discos completamente às escuras só por causa de uma critica do Fernando. Isto tornou-se complicado de gerir porque, ao longo dos anos, deu para perceber que o jornalista em causa não era especialista de um só estilo em particular. O seu conhecimento e a sua opinião atravessava géneros musicais a perder de vista e sem amarras.
Foi a reboque do entusiasmo do Fernando que alarguei gostos musicais e mergulhei em mundos desconhecidos e improváveis como o da música electrónica.

O salto emocional nesta relação com o Fernando Magalhães deu-se na internet. Passei de uma relação leitor/fã - jornalista para uma relação de companheiro com alguns pontos em comum num fórum digital: o famoso Fórum Sons, nascido a partir do tal suplemento de música do jornal Público. Um espaço que aproximou, revelou e democratizou o fechado mundo da música nacional. Artistas, jornalistas, fãs, agentes da indústria, editoras, anónimos, curiosos, tudo cabia naquele fórum. Nos tempos áureos chegámos a ter Miguel Esteves Cardoso a voltar a falar sobre música, por exemplo. Foi aí que me aproximei de Fernando Magalhães. Foi pelo sentido de humor.
Um puzzle de características foi-se completando até conhecer pessoalmente o Fernando. Ao meu respeito pelas suas opiniões musicais, juntou-se a admiração e o entusiasmo pelo seu bom gosto gastronómico, pela reverencia aos Monty Python , pela paixão pelo futebol e tantas outras coisas que elevavam o Fernando à condição de amigo.
Foi ele que me revelou a melhor cerveja preta de Lisboa, bebe-se no Baleal na baixa lisboeta. Gosto sempre de destacar este ensinamento antes de outros mais comuns como a obra de David Lynch, o melhor disco pop de sempre que é de Anthony Moore, a beleza interminável da música folk, as cores do universo da chamada world music que nos leva à sua paixão pelo festival de Sines, onde passei a ir sem falta todos os anos.

Dificilmente se encontram duas pessoas na mesma vida como o Fernando. Primeiro uma figura abstracta só contactável via leitura, depois um ser humano de sentido de humor incrível. Vistas bem as coisas, acabei por conviver com ele muito menos tempo do que era suposto. Mas o tempo que passei com ele desde a revelação do Forum Sons até à sua morte são tempos que já me parecem ser incrivelmente épicos com o passar dos anos. Almoços e jantares, concertos que duravam noites inteiras, sessões de DJ alucinadas, conversas à volta de cervejas que revelavam mais do que poderei aprender em livros.
Felizmente, não tenho aquela sensação de que devia ter aproveitado melhor aqueles tempos de convivência, sinto que aproveitei ao máximo. Lembro-me que os encontros ao fim da tarde já eram tão óbvios que o grupo de amigos já se juntava sem pretexto de concertos ou futebol. Era só para conviver e depois logo  se via se havia alguma coisa para ver.
O Fernando teve a vantagem de nunca se levar muito a sério e dizer tudo o que pensava sem grandes filtros. Fosse connosco, amigos, fosse com artistas que até admirava. E contava histórias memoráveis sobre esta maneira de viver. Como aquela em que apareceu em casa de Júlio Pereira para jantar mas antes de entrar cumprimentou o homem do cavaquinho com um eloquente: olha que aceitei o convite mas o teu novo disco é uma merda...

Ficou célebre a sua "guerra" com João Lisboa numa espécie de Público Vs Expresso à volta do último disco dos Sétima Legião. Às vezes penso o que seria do Facebook ou Twitter com o Fernando Magalhães.
Publicava listas de discos a propósito de tudo e de nada, à boa maneira de Nick Hornby. Depois ficava espantado e divertido quando lhe contava que tinha apanhado várias pessoas com as listas impressas a correrem os corredores de lojas à procura dos melhores. Eu sabia porque fiz o mesmo muitas vezes. A maior parte de discos que comprei foram por influência directa ou indirecta de Fernando Magalhães.

As melhores histórias que ficam na minha memória à volta de concertos, vivi-as com ele. Momentos delirantes, outros sérios, outros marcantes.
Os tempos vividos com o Fernando Magalhães, e muitos outros amigos que vou mantendo, diga-se, foram tempos irrepetíveis mas que condicionaram para sempre a minha maneira de ouvir, ler e escrever sobre música. Mais do que isso, foram tempos que marcaram a minha visão sobre uma vida nocturna lisboeta rica em histórias e acontecimentos. Tenho como grande feito o facto de o ter convencido, juntamente com o Vítor Junqueira, a ir a um programa de duas horas que tivemos na Rádio Voxx, foram as duas últimas horas de Fernando Magalhães numa rádio.

O Fernando foi um mestre que tive a sorte de conhecer. Quantos mestres que admiramos conseguimos conhecer na nossa vida? Tive essa felicidade, por isso tenho dificuldade em o considerar morto. Um mestre é eterno.

Neste caso basta ter vontade de ouvir um disco ou ler um livro.

João Gonçalves



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25.7.16

Manuela Paraíso - Homenagem


Manuela Paraíso começou a sua carreira, tanto quanto sei, como crítica musica na extinta revista Música & Som. Mas tornou-se "famosa", sobretudo, devido ao seu programa de culto, pioneiro, na Rádio Azul, emitido a partir de Setúbal/Palmela. Poucas pessoas deviam ouvir o seu programa, inclusive eu que, morando no distrito de Setúbal, não conseguia apanhar a emissão, tal era a fraca potência das emissoras de rádio piratas que pulularam pelos anos 80. Mas o culto veio da publicação, pelo jornal de grande expansão, na altura, Blitz. Era sempre um prazer ver todas as semanas listas (playlists) onde figuravam Current 93, David Tibet, Death In June, Coil, entre tantos outros.
Sendo uma pioneira maior é a homenagem que lhe devemos prestar.
O programa ainda durou alguns anos mas, como tudo o que é bom, acabou.
Voltei a tomar contacto com esta radialista quando passou a trabalhar na Rádiogest e, desta vez já com audição quase perfeita, gravei algumas cassetes com a música que passava.
É uma dessas Cassetes/gravações que agora aqui posto em jeito de homenagem bem merecida.






23.7.16

Livros sobre música que vale a pena ler (e que eu tenho, lol) - Cromo #57: Luís Jerónimo e Tiago Carvalho (compilação) - "Escritos de Fernando Magalhães - Volume III: 1995"


autor: Luís Jerónimo e Tiago Carvalho (compilação, introdução e prefácio)
título: Escritos de Fernando Magalhães - Volume III: 1995
editora: Lulu Publishing
nº de páginas: 336
isbn: none
data: 2016
prefácio: Luís Marvão


Texto/Citação na Contracapa (se fizerem o download vê-se bem, mas aqui fica):

Swing é palavra que não consta no vocabulário de Bill Frisell. Abstraccionista, falta-lhe a pulsão anarquista e convulsiva de um Elliott Sharp ou de um Christy Doran. Esteta, não tem a largueza de visão dos contemplativos da ECM como John Abercrombie ou Ralph Towner. Académico, embora encapotado, falta-lhe a polivalência de um Terje Rypdal ou de um Pat Metheny. “Live” poderia ser, ao menos, um espaço de comunicação e diálogo entre os três músicos, versão “power trio”, com o baixo de Driscoll e a bateria do pau para toda a obra que é Joey Baron, no contexto das “novas músicas”. Infelizmente, o estilo de Bill Frisell caracteriza-se pelo autismo. Os outros aguentam o barco, vão atrás e acrescentam os pormenores de esboços cuja articulação obedece, de forma absolutamente coerente, ao conceito “verbo de encher”. Frisell devia ter aprendido com Buster Keaton e passar a fazer música muda.
FM

Prefácio
"Felix Kubin vem ao Lux pôr discos. Pensou em "heavy metal" coreano, só que "a organização não deixou". O primeiro par a saltar para a pista ganha um crânio electrificado."

Fernando Magalhães, PÚBLICO, 02-03-2000.

Escrever o prefácio de um livro dedicado ao trabalho e obra do jornalista Fernando Magalhães não é tarefa fácil para o autor destas linhas, voraz consumidor de músicas várias e cujo gosto foi fortemente contaminado pelos textos do crítico com quem travou conhecimento e desenvolveu amizade. Com a revisitação dos textos de Fernando Magalhães, vêm recordações de momentos significantes do tempo passado, concertos, sessões de músicas, jantares e outros episódios de confraternização cuja cronologia perdi o rastro.
Conservo na memória aquela noite de quinta-feira do ano 2000, em que o conheci. Encontrava-me no Lux na companhia de dois amigos, o Mário e o Tiago, para assistir à sessão musical de Felix Kubin, esteta das electrónicas, que nos prometia levar em estranhas aventuras musicais até a "um saudável estado de histeria". Tínhamos combinado via Fórum Sons encontrar-nos nessa noite com o Fernando Magalhães, mas até então dele apenas conhecíamos a escrita, não o homem. Nunca mais me esqueci da forma como nos interpelou quando nos dirigimos ao bar: “Mário Z?”. O nome era indissociável do Fórum Sons do PÚBLICO, comunidade imaterial onde a música era fonte de apaixonada discussão, união e desunião.
Enquanto leitor das críticas musicais do Fernando Magalhães, só o fui ao tempo dos suplementos Pop-Rock e Sons, do PÚBLICO. Leitor tardio, porém não imune à escrita imagética, cheia de bonomia, humor e por vezes também cruel. Deliciosamente cruel. Era impelido ao consumo discográfico por causa daquelas críticas e esperava ansiosamente pela Sexta-feira, dia em que saíam aqueles suplementos.
Como crítico de música, o Fernando Magalhães denunciava um saudável ecletismo. Havia também outros bons exemplos nas páginas do Pop-Rock e dos  Sons que muitas saudades me deixaram. Seria injusto não o reconhecer.

Do rock progressivo à cena Canterbury, do Krautrock germânico às músicas electrónicas contemporâneas, dos sons celtas e nórdicos às geografias do continente africano, sem esquecer o jazz, eram muitas e multifacetadas as latitudes por onde irrompia a escrita do Fernando Magalhães. Uma escrita que tinha o condão de nos levar para territórios desconhecidos, alargando horizontes e desafiando percepções.  Recordo excertos do artigo Mercador de Sonhos, dedicado ao álbum Shleep, de Robert Wyatt: “Shleep” é uma mistura de 'Sheep' com 'Sleep'. De massificação com dormência”... “O sono e o sonho, uma vez mais. A comandarem o mundo, simultaneamente secreto e luminoso, esculpido em cicatrizes, de Robert Wyatt". 

Os elementos de contextualização das obras discográficas e dos músicos, impregnados no corpo da crítica, como que em grandes pinceladas impressionistas, eram também traço da sua escrita. Contextualizações a partir de referências culturais, históricas ou filosóficas vinham acrescentar sentido à reportagem ou ao texto crítico sem lhe retirar aquilo que de mais essencial tinham: a singularidade do autor e da obra. E tudo com uma grande fluidez e simplicidade. Ilustro-o com passagens do artigo sobre a vinda a Portugal da cantora grega Savinna Yannatou: "Em torno do mediterrâneo, em viagem com os judeus sefarditas, em transe num café de rebetika, em louvor da Virgem Maria. Por aqui tem andado a voz sensual da cantora grega Savina Yannatou, expoente das músicas do Sul. Esta noite, no Grande Auditório do CCB, em Lisboa, poderá voar ainda mais longe. " [...] "É verdade que a voz e a presença física de Savina Yannatou nos recordam que a ascese espiritual não dispensa um ou outro frémito do corpo. E que na origem da música rebetika (na qual, aliás, Savina faz ocasionais incursões) também estão umas boas cachimbadas de haxixe turco as quais, de certa forma, ajudam a que soe ainda melhor. Mas nela o erotismo radica em correntes mais profundas do ser, num veio de sol, a luz e mar que empurra suave, mas firmemente, a alma para o êxtase. Coisa mística, enfim. Mas deleitosa."

Havia algo de lúdico nas suas críticas, talvez o Fernando se divertisse muito durante o processo criativo de composição dos textos, sobretudo quando o alvo era algum dos seus ódios de estimação, arrisco dizer.  Desfazer alguns dos nossos mitos musicais era uma especialidade dele.  Sempre com muito humor, aquele  humor desarmante que trazia sempre consigo. Recordo a forma como classificou os Godspeed You Black Emperor (GYBE), em jeito de desabafo meio divertido, no concerto do Paradise Garage, em 2002: "Isto é sempre o mesmo. É música do ora vai acima, ora vai abaixo!".

Esse lado lúdico estava presente no Fórum Sons, espaço virtual dedicado à música, criado pelo jornal PÚBLICO e animado pelo Fernando Magalhães. Num tempo em que a internet ainda se afirmava, ele  abriu a muitos de nós as portas da percepção para diferentes universos musicais. E deu largas a muitas das suas paixões, como os Van Der Graaf Generator e Peter Hammill ou os Can, entre outros nomes maiores da galáxia Kraut. Num olhar reprospectivo sobre essa época, decorridos hoje mais de vinte anos, diria que foi obra de serviço público o trabalho do jornalista e crítico musical  no Fórum Sons. Musicalmente falando, crescemos muito no seio daquela comunidade virtual. Incontáveis foram as listas de álbuns discográficos, as revisitações de décadas da música e os escritos para atender aos pedidos dos cibernautas de então.

Falar do Fernando Magalhães é pois falar de generosidade, da vontade de partilhar com os outros o conhecimento e a paixão pela música.  Um sentimento de liberdade criativa perpassa pelas suas críticas musicais, algo que estou em crer não passará despercebido aos novos leitores, tenham eles a curiosidade ou a audácia para adquirir este livro, o Volume III de uma compilação de entrevistas, artigos e reportagens de concertos.

A presente compilação de textos jornalísticas dá relevo à música portuguesa, quer à de raiz popular, quer à de feição mais pop e rock, sem esquecer as margens do experimentalismo. Desfilam nomes como os de José Mário Branco, de Sérgio Godinho ou da Brigada Victor Jara, entre muitos outros, e são revisitados álbuns intemporais da música popular portuguesa, como “Por este rio acima”, de  Fausto,  ou “Coisas do Arco da Velha”, da Banda do Casaco, para destacar apenas alguns.  A par destes, juntam-se objectos estranhos resgatados de um qualquer tempo perdido, exemplos de “Plux Quba-Música para Setenta Serpentes”, de  Nuno Canavarro, ou dos “Ocaso Épico”, de Carlos Cordeiro (Farinha).  Deveras rica a complicação de textos dedicados à música portuguesa, bem merecedora do nosso olhar. Já quanto à secção dedicada aos estrangeiros, reportagens de concertos, de John Zorn, Laurie Anderson e Art Zyod, aliam-se a entrevistas e artigos sobre gente que deu novos mundos à música, como o mexicano Jorge Reyes e o americano Jon Hassell ou esses aventureiros alemães, os Embryo. A galeria de nomes é infindável, dos Cluster a Eno, de Scott Walker a Marianne Faithful ou P J Harvey, passando pelos Art Zoyd  e os Area, sem esquecer  a Nico e o cinema de Philippe Garrel. Muito há pois para descobrir ou revisitar em escritos que não perderam actualidade e fazem prova do ecletismo que era apanágio do antigo crítico do PÚBLICO.


Ao escrever este breve prefácio, posso não ter ficado imune ao pecado do panegírico. Pretendi tão-só exprimir a minha admiração pela obra e o homem. Quando recordo os jantares com o Fernando Magalhães na Ribeirinha do Sado e as sessões musicais que se seguiam no MARR, ou a eterna festa que era o Cantigas de Maio, fica só a saudade.

 Ao Fernando.

Luís Marvão

08-04.16








Índice

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Memorabilia: Revistas / Magazines / Fanzines (218) - Catálogo - Ananana (Julho de 1993)


Catálogo
Ananana - Julho de 1993




Catálogo




22.7.16

Memorabilia: Revistas / Magazines / Fanzines (216) - Catálogo - Ananana (Abril de 1993)


Catálogo
Ananana - Abril de 1993










21.7.16

Livros sobre música que vale a pena ler (e que eu tenho, lol) - Cromo #56: Luís Cangueiro - "Fonógrafos E Gramofones"


Autor: Luís Cangueiro
título: Fonógrafos E Gramofones
editora: Quinta do Rei - Lazer e Cultura, Lda
nº de páginas: 224
isbn: 978-989-20-1244-5
data: 2008 - Outubro (1ª Edição)
Apresentação: Marcelo Rebelo de Sousa - Celorico de Basto, 17 de Julho de 2008


sinopse: 

Nota de Abertura
Com o segundo volume 'Fonógrafos e Gramofones', completamos o projecto editorial a que nos tínhamos proposto, dando finalmente a conhecer todo o acervo por que é constituída esta colecção de instrumentos de música mecânica.
Depois de um olhar atento sobre as peças que se vão descobrindo ao longo das páginas desta edição, com mais facilidade poderemos acompanhar o seu desenvolvimento, desde o primitivo 'Tin-Foil' de Edison que deu origem ao fonógrafo, com passagem pelo gramofone apresentado por Berliner alguns anos mais tarde, até atingirmos finalmente os aparelhos já mais evoluídos e que se situam na década de 30.
Podemos considerá-los documentos históricos, porque estamos na presença de peças cuja origem remonta a 1877, ano em que pela primeira vez foi possível gravar e reproduzir no momento seguinte, a voz humana. Elementos vivos, pois têm a capacidade de nos transmitir a sua sonoridade por intermédio de cilindros e de discos, imortalizando a voz e as canções de artistas que desapareceram, e que de outro modo não teria ido possível conhecer. Objectos estéticos, pela beleza formal dos inúmeros modelos construídos com os mais diversos materiais, e que ao longo de décadas foram trabalhados por mãos muito experimentadas de engenhosos artífices.
Se a descoberta do fonógrafo levou as pessoas a desinteressarem-se dos primeiros instrumentos de música mecânica, foi o gramofone que se impôs por sua vez, e com muita facilidade perante o fonógrafo, pelas inúmeras vantagens que apresentava. Todos estes meios tão importantes para a divulgação da música durante várias décadas, foram no entanto perdendo a sua influência com o aparecimento da telefonia.
Uma colecção com estas características não poderia ser obra de um coleccionador solitário. Para reunir todas estas peças, pude contar com a colaboração de muitas pessoas, que me apoiaram incondicionalmente ao longo dos anos.
A história, sendo a depositária da memória da humanidade, é com grande orgulho e satisfação que deixo nesta obra um pedaço dessa memória, dirigidas às gerações vindouras, acreditando que vá ajudá-las a recriar e a reviver uma época já longínqua.
Embora os finais do Séc. XIX e princípios do Séc. XX estejam particularmente presentes, neste livro pulsa o sonho que sempre foi dos homens de todas as épocas - permanecer no futuro.











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