Entrevista com Jean-Hervé Péron e Zappi Diermaier, publicada na revista Wire Nº 275, de Janeiro de 2007.
Jukebox Invisível - Faust
Todos os meses tocamos para um músico uma série de gravações sobre as quais eles são convidados a identificar e comentar - sem conhecimento antecipado do que irão ouvir. Teste por David Stubbs. Fotografia: Anna Schori
Os Faust formaram-se em 1971 a partir de dois grupos, através do jornalista Uwe Nettelbeck. Ele assegurou-lhes um contrato com a Polydor Germany, convencendo a editora que eles eram os “novos Beatles”. Os Faust não provaram ser tal coisa, levando ao divórcio com a editora. O colectivo Faust - cuja formação incluía Jean-Hervé Peron, Werner ‘Zappi’ Diermaier, Gunter Wusthoff, mais tarde Rudolf sosna, Joachim Irmler e Armulf Meifert, assim como Peter Blegvald - viveu e trabalhou no seu complexo de estúdios, uma antiga escola em Wümme, no norte da Alemanha. Os seus primeiros dois álbuns, Faust (1971) e So Far (1972), reiinterpretaram sistematicamente o dominate rock Americano, através de um uso inventivo da electrónica e da colisão neo-dadaista de estilos musicais. A par com os colegas Can, Guru Guru e Amon Düül, os Faust foram um componente vital no movimento de grupos Germânicos, que ficou conhecido como ‘Krautrock’.
Depois de So Far, a Polydor rompeu o contrato com os Faust. O grupo assinou pela Virgin Britânica, que editou o terceiro álbum do grupo, o fragmentário mas altamente inovador The Faust Tapes (1973).
O álbum foi vendido pelo preço de um single e consequentemente vendeu muito bem, mas foi tomado com desinteresse, para além de uma pequena franja de devotos da banda. Depois de Faust IV (1974) a Virgin desistiu dos Faust, e com a perda de interesse de Nettelbeck no grupo, este desmembrou-se.
Ficaram inactivos nos anos 80, mas a sua reputação foi mantida pela editora Recommended Records, que pôs cá fora três a´lbuns de material previamente não editado. Os Faust retomaram a actividade no início dos anos 90, com uma formação girando à volta do núcleo composto por Irmler, Diermaier e Peron. Depois de duas edições limitadas de material ao vivo, pela Table of Elements, Rien, produzido por Jim O’Rourke, foi editado em 1994.
O grupo continuou a realizar digressões e a gravar desde então, mas a sua formação tornou-se muito instável. Neste momento os Faust são formados pelo trio Peron, Diermaier e Amoury Cambuzat, e Irmler recentemente formou outra versão dos Faust, com um grupo alternativo de músicos.
A Jukebox teve lugar no Norte de Londres com Peron e Diermaier.
Karlheinz Stockhausen
“Teil 1”
FROM KONTAKTE (WERGO) 1960
Jean-Hervé Peron: Posso dizer com toda a certeza que gosto, mas… parece muito académico.
Foi gravado e editado em 1960.
JP: É certamente uma peça composta... Um compositor germânico? OK, Stockhausen.
A música concreta influenciou, de alguma forma, os Faust?
Zappi Diermaier: De forma consciente, não fomos influenciados por Stockhausen. A razão é muito simples - esta é a primeira peça de Stockhausen que ouço. Não estou a brincar.
JP: Mas estava no ar, por isso talvez subconscientemente tenhamos sido.. não, não, eu não fui influenciado por Stockhausen, nem os Faust ouviram, alguma vez, alguma coisa dele. Nós fomos mais influenciados pelo tempo, pelo ambiente social e tecnológico, muito como o próprio Stockhausen.
A arte é uma reflexão sobre as possibilidades técnicas. As pessoas falam de música electrónica: do que deviam falar era de música feita com electrónica. Este é o caminho.
ZD: De facto eu tenho um álbum de Stockhausen - Hymnen.
Nos primeiros álbuns dos Faust vocês usaram a electrónica de uma forma muito intensiva em faixas como “Why Don´t You Eat Carrots?”. É como se estivessem engajados numa forma de electrocussão de tudo o que apareceu antes - Os Beatles, os Stones, o consenso Anglo-Americano - onde bocados de “Satisfaction” e “All You Need Is Love” fossem consumidos num crepitar de electrónica suja.
JP: OK, essa é a sua interpretação e é muito interessante. Nós chamamos a isso Fetzen - ‘rags’. Não era uma acção negativa, uma electrocussão. ‘Rags’ de som - secar tudo com rags (panos).
Não é a mesma coisa? Uma pedra limpa?
JP: Sim, sim, suponho que sim. Para nós, estávamos ocupados em encontrar uma nova identidade na música. Suponho que para Stockhausen fosse a mesma coisa, saído da Segunda Guerra Mundial, para criar algo inteiramente novo. Isso nós temos em comum.
Henry Cow
“War”
FROM IN PRAISE OF LEARNING (VIRGIN) 1975
JP: Zappa! Não, não é Zappa. É Dagmar Krause? É Dagmar Krause. Nós conhecemo-la muito bem.
ZD: Reconheço a voz de algum lado, uma voz de rato.
JP: O grupo são os Art Bears ou ... Henry Cow. Quem toca o piano? É John Greaves? Sim, é. Chris Cutler, claro, na bateria. E Geoff Leigh no saxofone - e quem está no trompete?
Mongezi Feza. A orquestração aqui é intricada, mas podem sentir que estão a tentar recuperar uma tradição perdida de cabaret político - a influência de Brecht/Weill é forte. Foi essa tradição importante para os Faust?
JP: Para mim e para Zappi, não foi uma grande cosia, mas para Gunther Wusthoff e Rudy Sosna, que, claro, morreu - eu gosto demencionar sempre os eu nome - eles conheciam Brecht e este tipo de música, e foi alimentado através deles, embora não se note muito.
Há nos Faust aquilo que poderemos chamar o ‘lado canção’?
JP: Bem, certamente que Rudy era um homem de canções, sim, mas uma cois que é fixe nos Faust, uma coisa que nós concordámos muito cedo foi que nunca diríamos quem fex o quê, nunca quisemos entrar por aí. Não é realmente imprtante colocar nomes ao que estava a acontecer. E hoje, se estiver OK contigo, nós preferimos não entrar nesses detalhes. Mas sim, uma parte dos Faust é acerca de canções, a outra sobre atmosferas. Usámos também matemática para escrever canções, usámos códigos - números para representar letras em letras de músicas, por exemplo.
ZD: Especialmente em So Far. Utilizámos montes de geometria e aritmética na composição de So Far.
Parece que a aproximação dos Henry Cow para fazer música era mais ordenada, menso intuitiva que nos Faust.
JP: Bem, sim, tal como podes ouvir nesta faixa, eles tocam um ritmo louco, Henry Cow. E eles conseguem memorizar aqueles ritmos e tocá-los ao vivo, sem cometer qualquer erro. Tenho grande respeito por isso, os Faust nunca conseguiriam fazer isso. Nunca estivemos interessados em ser capazes de tocar longas e complexas faixas de memória, uma vez e outra e outra. A nossa atitude era usar o tempo do estúdio, fazer, e quando estivesse pronto, não ensaiar.
O Chris Cutler foi instrumental na hostória dos Faust, reeditando os primeiros dois álbuns em 1980 e permitindo à nova geração post-punk descobrir o grupo. Mas vocês já o conheciam há muito, certo?
JP: Os Henry Cow fizeram digressoes connosco. Também os Gonf e, creio, Kevin Coyne. Também trabalhámos com os Slapp Happy [em 1972-73], por isso há uma ligação entre nós.
Partilham os objectivos do Rock In Opposition?
ZD: Nós éramos idealistas, como Chris Cutler. Só que praticávamos o nosso idealismo de maneira diferente. Chris era, e tenho acerteza que ainda é, uma pessoa muito altruísta, pensando mais na criatividade e energia de outras pessoas no que nele próprio. Não penso que os Faust tenham feito isso, apesar de hoje, estarmos menos ocupados connosco próprios apenas. Lembro-me de tomar sempre o pequeno almoço com ele. Ele comia cracóis selvagens e eu um grande prato de carne e queijo.
Algumas pessoas pensam na Virgin dos anos 70 como uma espécie de idílio, mas eu lembro-me que vocês tiveram tempos difíceis com Richard Branson e não quiseram o Manor Studio. É verdade?
ZD: No princípio da editora havia apenas alguns artistas - Mike Oldfield, Faust, Gong, Kevin Coyne... Mas ele era um valente. Lembro-me de estar com ele num restaurante e ele ter batido num tipo enorme. Muito corajoso.
JP: O Richard era esperto - ele tinha uma ideia, que era partilhar a música e torná-la acessível mas não era ummidealista. Penso que ele queria tornar a música para fazer um monte de dinheiro. Mas OK. Na verdade, sabes, as pessoas falam acerca dos problemas nos Estúdios Manor mas era um lugar espectacular. A minha principal memória é do cão, Bootleg. Ele tinha um bater de coração muito, muito lento e irregular. Muito estranho. Algumas vezes pensávamos que estava morto.
Como o ritmo de “Jennifer” no Faust IV?
Sim! Sim! Talvez “Jennifer” seja um tributo ao Bootleg!
The Mothers of Invention
“Concentration Moon”
FROM WE’RE ONLY IN IT FOR THE MONEY (RYKODISC) 1968
JP: Eu diria que se trata da Incredible String Band, excepto que não é. Sim é! Não, não é. Oh, sim, são os Mothers. Mothers of Invention. Sim, sim, eu lembro-me. CHOO! CHOO! CHOO! Agora vem a questão óbvia - foi Zappa uma influência para os Faust? E a resposta é, sim, claro. Foi a primeira vez que me apercebi, ouvindo um álbum como este, que as letras no rock ‘n’ roll podem ser mais do que apenas “Não tenho dinheiro, a minha míuda partiu”. Aqui está alguém a falar da sociedade, acerca dos sentimentos - mesmo nas suas canções de ódio, como esta, mexem com algo, são verdadeiras e feias. Como se pode ignorar um génio como este?
ZD: Em 1969, eu levava o primeiro álbum do Zappa debaixo do braço e fui a uma discoteca e pedi ao DJ para passá-lo. Ele fê-lo, gostou, e a partir desse momento tornei-me no ‘Zappa’. Depois foi mudado para ‘Zappi’, simplesmente porque não queria tomar o nome de outra pessoa.
No livro dos Faust, Andy Wilson contrasta, em vez de comparar, a vossa música com a de Zappa e os Mothers. Ele sugere que eles eram a visão musical de um homem apenas, aparentemente anárquico e selvagem mas na verdade fortemente composta. Os Faust, pelo contrário, beneficiavam de uma aproximação mais colectiva.
JP: Bem, talvez Zappa tivesse dificuldade em trabalhar com outros tipos criativos. O Captain Beefheart, parece, era demais para ele! Mas com os Faust, nunca houve um líder. Houve uma espécie de ‘movimento liderante’. Em certas alturas, dois ou três de nós eram mais activos que os outros. Depois isso mudava, alguém tinha uma ideia ou um projecto ou um conceito. Estávamos sempre em movimento. Mesmo nos últimos tempos, falando agora de situações da vida quotidiana, talvez tenha havido um mal-entendido dentro do grupo. Zappi e eu somos mais activos, mais extrovertidos e impositivos, Zappi porque é enorme, eu porque falo demasiado e em várias línguas, sou rápido, expresso-me sempre. Isso pôs-nos na frente mas talvez outros no grupo sentissem que estavama a ser ultrapassados, o que é um mal-entendido lamentável. Mas OK, já passou...
Tem havido várias encarnações dos Faust desde os anos 90. Porque não está Joachim Irmler nesta formação?
JP: Tem de perguntar-lhe.
Julian Cope
“Soul Desert”
FROM JEHOVAHKILL (ISLAND) 1992
JP: É o Julian Cope, não é?
De facto. Um dos vossos maiores fans, e do Krautrock em geral, apesar de raramente ter permitido que essa obsessão se propagasse à sua própria música.
JP: Bem, sim, isto não é certamente influenciado por nós, mas na realidade gosto desta canção - muito, diga-se de passagem. Uma coisa que gostaria muito de dizer, se isto vai sair na The Wire, é que eu tentei já muitas vezes, contactar o Julian, repetidamente sem sucesso, esperando encontrar-me com ele, falar sobre o seu livro, mas nunca obtive uma resposta. Talvez a sua secretária esteja a dizer, ‘Quem é este cromo?’ Bem, se isto sai na The Wire, ele lê-lo-à. Até ver, Julian!
Pensam que o entusiasmo ajudou a empolar o perfil dos Faust e a sua popularidade?
ZD: Eu nunca percebi que ele tenha desempenhado qualquer papael na nossa popularidade.
JP: Discordo totalmente do Zappi. A razão é simples. Saiu uma foto do Julian na imprensa so Reino Unido, vestindo uma T-Shirt dos Faust e imediatamente depois disso, as coisas explodiram para nós. A música Punk tem uma enorme energia, o que é bom para os Faust.
Amon Düll II
“Soap Shop Rock”
FROM YETI (REVISITED) 1970
JP: Apenas pela bateria - podia ser Ash Ra Tempel. Podia...
Estes tipos andavam por aí na mesma altura que vocês...
JP: Amon Düül! São os Amon Düül, certo? OK. Gosto do Chris Karrer dos Amon Düül como músico, mas nunca ouvi isto... até recentemente eu ouvi tão pouca música, tão pouca - até hoje, eu tenho sido introduzido a tantas coisas novas. Até Stockhausen. Sabes, nós devíamos falar acerca deste termo, ‘Krautrock’. Se tu chamas a esta peça de música ‘Krautrock’ então, por favor, nunca incluas os Faust nessa categoria. A razão é o ritmo. As primeira é que isto é obviamente rock ‘n’ roll Anglo-Americano tocado por um grupo germânico. Isto não é Krautrock e é exactamente o oposto do que nós estávamos a tentar fazer. Nós estávamos a tentar pôr de lado tudo o que tínhamos ouvido no rock ‘n’ roll, o padrão dos três-acordes, as letras. Nós tínhamos a urgência de dizer algo completamente diferente. E quando as pessoas em Inglaterra começaram a falar em Krautrock, nós pensámos que eles estavam a mordiscar o isco, [então] escrevemos uma peça com aquele título [em Faust IV]. Mas é um sofrimento explicar que coisas como estas não são Krautrock, e quando ouves o autointitulado ‘renascimento do Krautrock’, faz-me pensar que o que o que nós fizemos não serviu de nada.
Mas há comparações superficiais entre vocês e os Amon Düül - ambos os grupos viviam em comunas...
JP: Sim, mas eu disse que o Chris Karrer gostava disto. Apenas duas ou três pessoas na comuna dos Amon Düül eram realmente músicos. Também tinhas um rancho de pessoas que tocavam congas, sinos, ou cantavam “oh, la la!”, mas não eram realmente músicos. Foi apenas com os Amon Düül 2 que eles decidiram contratar músicos. Assim, este fenómeno de ter um núcleo de músicos era certamente muito comum - os Faust representavam ujm núcleo de dois grupos, ambos com o seu próprio séquito. Mas apenas quando fazias parte do grupo podias conhecer quem mais fazia parte do grupo, quem apareceia todos os dias e fornecia a energia, e quem não.
ZD: A situação da comuna de Wümme era diferente das outras. Tudo o que vivíamos e experimentávamos servia de alimento para a música. Vivíamos juntos pela música, não pelo simples facto de querermos viver numa comuna.
Não tiveram ambos contactos com pessoas envolvidas nos Baader Meinhof?
JP: Sim - mas aqui é onde queremos desenhar uma linha no que toca a falar do passado, se for possível. Está tudo no livro! Preferimos, em geral, falar do presente e do futuro.
Kurt Schwitters
“Die Sonata In Urlauten”
FROM VOICES OF DADA (LTM) 1927 OR 1932
JP: Isto é o Dr. Schwitters! Eu gosto muito disto, man, eu nuca tinha ouvido a sua voz antes mas sei que é ele. Oh, o meu coração está a bater, adoro. Isto faz-me lembrar que, em todas as alturas, há coisas a ir para a frente nas cabeças dos artistas que são do mesmo tipo de geração para geração. Eu adoro fazer coisas como estas, mas claro, já foi feito antes. Tudo já foi feito antes. O Zappi pensa assim, por vezes.
Os Faust parecem trabalhar segundo princípios dada/surrealistas - da colagem musical até ao método do ‘cadáver esquisito’ de escrever, até aos manifestos iniciais.
ZD: Claramente, embora de forma inconsciente, há uma ligação dadaísta com os Faust. Eu conheço palavra ‘dada’ mas não o trabalho, os livros, ou os artistas envolvidos.
JP: Claramente mas inconscientemente. Concordo absolutamente com isso. Andava no ar. O que acontecia para os dadaístas acontecia par nós. Contudo, os Faust de hoje, da forma como operamos, já não usamos esses métodos dadaístas. Evoluímos, agora que trabalhamos como um trio.
Sempre pensei que havia um ‘primitivismo’, de ritmo de batida de coração, nos Faust, que se assemelhava ao que os dadaístas faziam nas suas perfomances, ao que elas deveriam soar, com cantos e máscaras e a reactivação de energias primordiais, a actuação na margem das ‘civilizadas’ perfomances musicais.
ZD: Pode ter sido uma influência da infância. O meu pai conduzia uma banda de marchas e enquanto criança eu tinha de tomar parte. Assim, para mim, esta espécie de música trituradora tem uma forte associação com a infância.
Dennis Brown
“He Can’t Spell”
FROM SUPER REGGAE & SOUL HITS (TROJAN) 1972
JP: Gosto, mas … não faço ideia de quem seja.
É Dennis Brown, no início dos anos 70. Ouvindo “The Sad Skinhead” de Faust IV, eu gostaria de saber se os Faust ouviam muita música reggae nos anos 70?
ZD: A ideia para “The Sad Skinhead” foi do Jean-Hervé. Ele perguntou-me se eu podia tocar aquele ritmo: boom-CHACHA! Boom-CHA! Boom-CHA!
JP: Eu não ouvia muito reggae, na verdade, porque odeio as letras, odeio a misogenia das letras. Mas gosto da pulsação do baixo nesta faixa, isso eu adoro. Para “The Sad Skinhead”, eu estava a tentar criar uma letra minimalista, um texto sobre nada, na qual cada coisa que tu dizes nega a que disseste anteriormente. Então começa assim “À parte dos bons tempos que tu me proporcionaste, eu sempre me senti mal.” A ideia é para cada linha não querer dizer nada - uma séire de ‘Sim, e então?’. O meu objectivo era não dizer nada - e assim, porque não ter uma música pesada, uma batida de reggae bem pesada? Hoje em dia, nós tocamos uma versão speed/punk dessa canção. BOOMCHACHABOOMCHA!BOOMCHACHABOOMCHA!
Einstürzende Neubauten
“Kalte Sterne”
FROM KALTE STERNE: EARLY RECORDINGS (MUTE) 1981
ZD: Soa-me muito a Neue Deutsche Welle [New Wave Germânica] dos anos 80…
Bem, er - uma espécie de...
JP: É anterior? Que língua é esta? Alemão?
Oh sim, decididamente.
JP: “Funken”! Yes, “Funken”!
Consegue distinguir traços dos Faust nesta peça?
ZD: Sim, no som áspero e metálico, e a condução da música.
São os Einstürzende Neubauten. Com os sintetizadores gerados Industrialmente em “Mamie Is Blue”, de So Far, e o vosso uso de betoneiras e martelos pneumáticos em palco, vocês colocaram um precedente para os Neubauten, do qual eles, talvez, não tivessem conhecimento antecipado.
JP: Eu costumava ficar muito irritado acerca do facto de eles usarem betoneiras e martelos pneumáticos tal como nós havíamos feito anos antes, até acontecer algo. Alguém me deu um CD, eu pu-lo a tocar, e fiquei realmente chateado. Pensei, aqui está outro grupo a roubar-nos. Jesus, eles estavam a fazer a mesma coisa que nós fizemos nos anos 70! Então, verifiquei a capa. Era dos AMM e tinha sido gravado algures durante os anos 60. Então pensei com os meus botões, Jean-Hervé, agora cal-te. Claro que nós não estávamos a copiar os AMM mas foi uma dura lição. Não podemos reclamar ter sido os primeiros a usar máquinas ou a destruir pianos em palco. Alguém, numa dada altura, num dado lugar, já o fez antes.
Sentiram algum benefício pelo crescimento dos Neubauten?
JP: [Risos] Não. Nós somos famosos por não ser famosos. Tenho de admitir que senti inveja por grupos que atingiram a fama indo por portas que, sem ser arrogante, penso que fomos nós que abrimos. Abrimos portas mas não entrámos por elas.
ZD: Na realidade, toquei alguns concertos com os Einstüurzende Neubauten e o Blixa tocou “It’s A Rainy Day, Sunshine Girl”, a qual ele reconhecia como uma canção dos Faust. Havia um conhecimento da parte dele.
Tony Conrad
“Bryant Park Moratorium Rally (1969)”
FROM BRYANT PARK MORATORIUM RALLY (1969) 8TABLE OF ELEMENTS) 1969
JP: Eu sei quem é. O nome começa por ‘S’. Não?
Ele é de Nova Iorque.
JP: John Cale? Não. Tony Conrad?
Isto é uma gravação de campo, combinando os ruídos de um rally anti-guerra da parte de fora do seu apartamento na 42nd Street, com cobertura mediática do evento na sua TV.
JP: Nos Faust, somos todos altamente amadores no campo das gravações de campo como esta - isto para dizer, que gostamos delas. Nós gostamos de apresentar as coisas fora do seu contexto, fazer música de coisas que não são supostas ser música. O Fluxus dizia que tudo é música. Nós gostaríamos de concordar com isso, apesar de por muito tempo não ter ouvido falar deles, eu sou muito pobre culturalmente falando.
Como é que se encontraram a trabalhar com o Tony Conrad em Outside
The Dream Syndicate, em 1973?
JP: Foi uma experiência fantástica, extraordinária, enriquecedora e muito extenuante.
O Tony chegou até nós com o Uwe [Nettelbeck], eu não tinha nenhuma ideia sobre qual era o plano. Mas o Uwe era um homem muito culto, ele conhecia a cena. De qualquer forma, quando demos por isso, estávamos no estúdio e o Tony a dizer que devíamos tocar um tom e uma batida. OK, excelente, por que não? Gostámos da ideia. E assim foi, e foi, e foi, e foi. Extremamente interessante, quase uma trip. Depois, passados 60 minutos a fazer isto, ele disse, OK, vou ouvir a fita disto. Eu disse, OK, se quiseres, mas eu não vou ouvir. Depois ele regressou e disse, não, não, não, temos de fazer tudo de novo, eu toquei uma nota erradamente. E assim tivemos de repetir tudo de novo... Deus, que experiência real e intensa. Sentimos que o tempo tinha parado. Não perguntámos porque estávamos a fazer aquilo, quando ias a parar, tinhas de continuar, continuar, continuar.
Então Dream Syndicate é um documento de músicos - àparte Conrad - desconhecedores do que estavam a fazer?
JP: Não, não, não, nós sentimo-nos muito confortáveis a fazê-lo. E a experiência foi muito educativa. Uma lição intensa de repetição, na qual entrei mais profundamente depois disso. Ele ainda se mantém activo, o Tony. Ainda continua a tocar um tom.
Jim O’Rourke
“Rules Of Reductio”
FROM RULES OF REDUCTION (METAMKINE) 1993
JP: Faust! Faust, isto é, definitivamente, Faust.
Bem, é alguém que já trabalhou com os Faust.
JP: A, bem, tem de ser Jim O’Rourke. Eu gosto do seu trabalho, claro, as suas coisas com o David Grubbs. Isto foi feito em 1993? É maravilhoso o quão novo ele é.
Certamente, é notável o modo como ele saltou para fora da sua própria geração, musicalmente.
JP: De facto, ele fez um trabalho excelente na mistura de Rien [1995]. Em muitos aspectos há muito do carácter do Jim nesse disco, o que é óptimo. Ele respeitou e compreendeu o espírito dos Faust. Algumas pessoas fizeram o trocadilho de dizer que não é ‘nada’ dos Faust - e tudo do Jim O’Rourke. Eu estou um pouco desapontado que ele não tenha vindo contrariar este rumor, que ele até tenha contribuído para ele. Censuro-o por essa atitude. Mas, para além disso, eu fiquei bastante impressionado com o trabalho que ele fez em Rien, especialmente em “Listen To The Fish”. Tem uma batida que eu tinha esquecido que existia e que ele ressuscitou.
Plastic People Of The Universe
“Okolo Okna”
FROM EGON BONDY’S HAPPY HEARTS CLUB BANNED (KISSING SPELL) 1974-75
JP: Isto é fantástico. Receio não saber o que é.
É de 1974, gravações caseiras dos Plastic People Of The Universe, um grupo de Praga que apareceu em 1968, no dealbar da invasão Soviética. Eles não eram ‘dissidentes’, pelo que não escreveram canções de protesto...
JP: [à medida que o saxofone solo de Vratislav Brabanec ecoa e geme] Oh, mas isto é música de protesto.
Bem, sim. O seu método de ‘protesto’ era viver como se o estado autoritário não existisse. Apesar de tudo, por realizar música não sancionada pelo estado, um ou dois deles foram presos, incluindo o próprio Brabanec.
JP: As pessoas perguntam se os Faust são ‘políticos’ e não, não em palavras como essa, mas sim, nós somos muito.
ZD: Toda a gente é política.
JP: Certamente, estas pessoas tomaram riscos de uma forma que nós nunca o fizemos. Nós tomámos o risco de ninguém nos apreciar ou de ninguém comprar os nossos discos, mas estas pessoas tomaram riscos reais. Obrigado por nos ter apresentado este grupo.
Não tocaram os Faust recentemente em Praga?
JP: Bem, no final tivemos de recusar. Nós queríamos usar a nossa máquina de cortar relva mas eles recusaram. E nós perguntámos porquê. Eles disseram que era um risco de incêndio em potência. O que é ridículo. Nós sopramos relva, que é velha e húmida e não inflamável, pelo qu enão havia razão para nos recusar. Mas eles não alteraram a sua atitude. Assim, recusámos tocar, o que é uma verdadeira pena para aquelas pessoas que nos queriam ver actuar. Por isso dizemos que, mesmo agora, ainda há censura em Praga...
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