4.8.15

Memorabilia: Revistas / Magazines / Fanzines (119) - Música & Som #9


Ano I - Nº 9 / 2 Junho 1977
Música & Som publica-se à 5ª feira, de quinze em quinze dias.
Director: António L. de Mendonça
Propriedade de: Diagrama - Centro de Estatística e Análise de Mercado, Lsª
Este número de Música & Som foi escrito por: A. Duarte Ramos, António Amaral Pais, António Mega Ferreira, António Pinho, António Sérgio, Bernardo Brito e Cunha, Carlos Jorge, Filipe Costa, H. Duarte-Ramos,

Ivan Hancock, J. Jorge, Jaime Fernandes, James Anhanguera, João David Nunes, João de Menezes Ferreira, M. A. Araújo, Manuel Bravo, Manuel Cadafaz de Matos, Paulo Norberto e Rui Neves.
Correspondente na Alemanha: Jorge Dias
Correspondente na Espanha: Mateo Fortuny
Correspondentes em Londres: Manuel Menezes e Pedro Albergaria
Fotografias de: J. Lobo Pimentel
Tiragem 20 000 exemplares
52 páginas A4
capa de papel brilhante grosso a cores
interior com algumas páginas a cores e outras a p/b mas sempre com papel não brilhante de peso médio.


Começa aqui uma série de postagens sobre a revista Música & Som, que foi das primeiras publicações musicais que comprei. Acho que este é o número mais antigo que tenho, embora não tenha a certeza pois ainda há aqui muito "papel" para arrumar/arquivar. O que me surpreendeu ao reler este número: A colaboração (técnica) de Manuel Bravo, que mais tarde vim a conhecer pessoalmente como director do Museu da Rádio, nas minhas deambulações de visitas de estudo com os meus alunos que faziam parte do Clube de Rádio lá da escola, os artigos do António Sérgio, a participação do António Mega Ferreira, a qualidade da música e dos artigos apresentados, alguns nomes de escribas.
Para já transcrevo dois artigos: uma entrevista com o Quarteto 1111 e um artigo sobre a presença dos CAN em Portugal.
No final do post listo mais alguns artigos que, eventualmente, no futuro merecerão transcrição (se tiverem urgência/vontade de ver algum deles transcrito, é só solicitar por email).

Quarteto 1111 - Para Onde?

Entrevista

Registado e Coligido por J. Jorge e M. A. Araújo




À correspondência nacional do folclore urbano não são estranhas as tonalidades anglo-americanas (Quem o duvida?) nem a adopção despudorada de modelos importados.
De um sabor, se não popularizado, pelo menos característico no seu tentame da vulgarização, a ideia da verdadeira música popular portuguesa subsiste na mira das intenções mais sinceras dos melhores grupos
nacionais - e referimos, em particular, aqueles que lograram arrostar sistematicamente o vazio de uma identificação etnico-cultural inexistente. Sonho quimérico ou apenas de concretização adiada? O problema vai-se arrastando e o público não se mostra sensível às propostas casuais que se lhe apresentam no quotidiano da sua escuta.
O Quarteto 1111, fiel à tradição do seu nome, vem encetando um confessado esforço neste sentido. Na véspera da sua partida para os Estados Unidos onde irá efectuar uma «tournée» pelos núcleos de emigrantes aí radicados, falou a Música & Som de si próprio e da sua interpretação dos problemas gerais da música portuguesa.


M&S - Que vai acontecendo com o Quarteto 1111 que mais uma vez parece ter-se renovado?
Vítor Mamede - O que se passou é que desde Setembro do ano passado, nós ou mais propriamente eu tentei encontrar uma nova formação para o Quarteto - Uma formação que fosse mais ou menos ideal, dentro da minha ideologia musical. O Rui Reis já então estava comigo, e juntos havíamos feito durante seis meses o «Godspell» (portanto desde o começo de 76 até meados de Junho). Foi nessa altura em que o Mike e o Tozé decidiram abandonar o grupo, que eu me decidi que era aquela a altura precisa, para de dentro do 1111 ir buscar para ele, músicos um pouco mais versáteis, já que (a nível musical) o Mike e o Tozé são um tanto restritos. É então que surgem no Quarteto o Luís Duarte (baixo) e o Armindo Neves (violas + guitarra).
M&S - Dos membros que presentemente integram o vosso grupo nenhum é, pois, membro fundador?
VM - Não. Apenas eu já havia tocado no 1111, aí acerca de dez anos, fazendo as chamadas «folgas» de um baterista que nem sempre podia tocar. Mais tarde (há cinco anos aproximadamente) estive então como
baterista efectivo do Quarteto, saindo depois do grupo, para voltar a fazer parte dele, com carácter definitivo, desde há um ano e meio para cá.
M&S - Em relação à própria música, onde é que se pode ressentir mais esta mudança de elementos do grupo, e consequentemente, de caminhos musicais?
VM - Parece-me que isso se poderá reflectir nos trabalhos que iremos fazer no futuro. Acho que o Quarteto 1111 constitui por si só um nome com uma série de responsabilidades ao nível da música ligeira em
Portugal. (Basta para isso recordar trabalhos como «El-Rei D. Sebastião»).
Daí que tenhamos, a todo o custo, conservar o nome do Quarteto num determinado nível, para que não desça. Se isso algum dia suceder, acho que mais valerá acabar definitivamente com o grupo, e deixar que o seu nome morra sossegado.
M&S - Poder-se-á, de facto, encontrar qualquer correspondência entre o que o Quarteto 1111 realizou ao tempo de «El-Rei D. Sebastião» e aquilo que pratica neste momento?
Rui Reis - Parece-me que a responsabilidade que esse trabalho trouxe ao nome do Quarteto continua presente, embora a linha musical do grupo, neste momento, não surja no prolongamento da primitiva.
VM - A nossa ligação com o passado do grupo é, digamos, espiritual. No fundo, hoje em dia somos uma pequena empresa na qual estão envolvidos alguns elementos que integram a formação primitiva do 1111, e
para além disso, continuamos aquela pesquisa da música portuguesa, a que se dedicou o 1111 original.
M&S - Em que momento sentem vocês que a música que fazem tem algo a ver com a música portuguesa, e em particular, com a música popular?
RR - Nascemos cá em Portugal, e tal como as pessoas que fizeram «A Canção do Mar» ou «Lisboa à Noite» e outras tantas, possuímos um mesmo espírito, uma mesma forma de cultura-base; talvez possamos,
pois, a partir daqui estar um pouco mais à vontade para tratar deste assunto. Por outro lado temos uma certa forma de educação musical provavelmente um pouco «requintada», isto é, toda a gente seguiu
determinadas linhas - eu por exemplo no Conservatório, outros através de linhas sugeridas por esquemas que vieram de fora e os influenciaram. É precisamente a partir dessa base e dessa forma de conhecimento, de certo modo importado e adaptado à nossa maneira, que vamos tentar não quebrar a continuidade naquilo que existe e que foi feito até agora, a fim de o levar a um determinado tipo de público, que por princípio tem
relutância em aceitar um certo tipo de música portuguesa.
Mas ainda que estejam nos nossos planos, as raízes folclóricas não constituem para nós um objectivo imediato a realizar.
Luís Duarte - Existe um descrédito relativamente a tudo o que se faz a nível de música cá em Portugal, e isto deve-se fundamentalmente à relativa falta de cuidado de tratamento, quer musical, quer técnico dos
trabalhos que têm sido feitos; e, por outro lado, as firmas de gravação empenhadas nos tais trabalhos, têm descurado uma determinada camada do público (entre os quinze e vinte anos) que é importantíssima,
porque são eles que compram dezenas de discos, na generalidade importados, pois são sensíveis fundamentalmente ao factor qualidade.



Armindo Neves - Creio que isso se deve também à intensa divulgação, através dos meios de informação da música inglesa e americana (muito boa e muito má) - esses são os dois impérios da música. Ora as
editoras sabem que fica muito mais caro editar um disco de música portuguesa (há que pagar o aluguer do estúdio, os músicos, etc.) do que importar gravações.
VM - Acho que a única maneira de levar as pessoas a comprarem música portuguesa será conseguir criar nela uma certa qualidade, contando, é claro, com o incondicional apoio de todas as editoras e de todos os
órgãos de informação na divulgação dessa mesma música e através de uma protecção eficaz do governo.
M&S - O facto é que as pessoas procuram aquilo com que se identificam - a música portuguesa está em crise há muitos anos em consequência, parece-nos, desta realidade ineludível.
VM - ... Estou em desacordo com isso. Realmente acho que as pessoas acabam por se identificar com a música portuguesa, pelo simples facto de que quando há qualquer festividade elas continuam a cantar as
mesmas musiquinhas ditas de raízes folclóricas. Acho que toda a gente conhece o «Manuel Malhão» e canta a «Marcha de St.º António», e aqueles que não sabem as letras, sabem pelo menos trauteá-las e lá-lá-lá.
M&S - Será essa a música popular do nosso tempo? Haverá qualquer possibilidade de escolha nas evocações?
AN - Parece-me que é realmente por não existirem outras. Acerca disso tenho algo a dizer: - em primeiro lugar não existem em Portugal escolas ou sítios onde se possa ouvir aquilo que a música portuguesa tem de
si própria. Na Rádio não se ouve, ou talvez se comece a ouvir agora, mas são os tais trabalhos já um pouco afastados das suas bases, às quais não se tem acesso. Se alguém decide viver só da música em
Portugal, isto é, ser profissional, para além de não ter acesso à cultura musical do seu país (tal como um amador, mas este, pelo menos, pode desenvolver um trabalho de «carolice», e um profissional não se pode
dar a esse luxo), não se tem qualquer espécie de protecção.
VM - Eu já me dei até ao trabalho de consultar as tabelas do Governo, onde os instrumentos musicais são considerados artigos supérfluos... Será sumptuário não ter outro modo de vida além de fazer música?
M&S - Os músicos portugueses têm mostrado uma «capacidade» de adaptação na sua abordagem dos vários géneros musicais, de tal modo precipitada (que se deve, julgamos, à necessidade de satisfazer o
máximo de contratos possíveis), que, ao invés de enriquecer a sua música e beneficiar uma disciplina de aproximação musical só vem agravar a confusão já instalada no público e, o que é mais grave, no seio dos
próprios músicos. O Quarteto 1111 estará decidido a efectuar um salto qualitativo de especificidade? Para onde?
LD - Acho que neste momento é ainda prematuro fazer previsões, visto a nossa formação do Quarteto existir há poucos meses e o trabalho que realizámos no single (editado há pouco tempo) ter o objectivo de
auscultar opiniões. É um trabalho experimental, que contém duas canções populares portuguesas, às quais pretendemos dar uma feição «internacionalista», através de um arranjo nosso, muito particular (o som das
cordas, por exemplo, está dentro da linguagem clássica, enquanto que a guitarra eléctrica segue o estilo Wes Montgomery, e o som do órgão é temperado por um balanço «funkie»), respeitando, no entanto, a
melodia portuguesa original. Pessoalmente, penso que a respeitei bastante, tocando-a até com guitarra portuguesa (que é um instrumento de que gosto e ao qual penso dedicar-me um pouco mais, de futuro -,
autodidacticamente, é claro!).
M&S - Qual é o futuro imediato da vossa actividade musical?
RR - O grupo encontra-se, neste momento, perante uma encruzilhada da qual não é possível ainda decidir as linhas de acção futura. Evidentemente, que a partir da «tournée» aos EUA poderão advir duas situações
totalmente opostas: - a aceitação ou não do trabalho que agora estamos a desenvolver determinará a nossa orientação. Gostaria de não acrescentar mais porque, de qualquer maneira não é prudente falar em grandes
voos, que depois não se venham a concretizar...




CAN em Portugal


Pouco conhecidos do público português, como a maioria dos músicos de rock alemães, os CAN estiveram presentes em Lisboa e Porto, nos dias 27 e 28. A sua tournée europeia de 1977 teve paragens na Suiça, na
França, na Espanha e na Alemanha Federal, naturalmente. A sua presença em Portugal marca portanto o términus de uma volta pela Europa e é simultaneamente a sua estreia ao vivo para os espectadores
portugueses.
Os CAN existem há nove anos. Em 1968, Irmin Schmidt, verificou que a sua prática de dirigente de orquestra em diferentes teatros de ópera não o realizava totalmente e por outro lado sentia-se muito afastado da assistência. Desistiu da sua carreira e procurou novos horizontes. Um velho amigo, Holger Czukay apoiou-o, incutindo-lhe a ideia de experimentar o seu talento com nova música. Holger, professor num Conservatório de música em Zurique, apareceu no dia seguinte em Colónia e fazia-se acomanhar do seu amigo e aluno Michael Karoli. Michael tocava banjo, violino e viola desde os onze anos. Faltava um baterista qualificado para completar o quadro do conjunto que surgiria poucos dias depois, através de um amigo de Irmin Schmidt. Assim se constituiu em 19 de Julho de 1968 o grupo CAN.
Neste momento os CAN vêem o seu número aumentado para cinco com a entrada de Rosko Gee, um negro da Jamaica que já foi contrabaixo de grupos como os «Gonzalez» e os «Traffic». Tal como Rosko Gee, também Reebop Kwaaku Bah, amigo de Steve Winwood e ex-Traffic, pensa juntar-se aos «soudspezialisten» do Reno.
Quanto às actuações do grupo em Portugal, será curioso assinalar que a primeira parte destas serão preenchidas com a actuação do grupo portuense «Arte e Ofício». Trata-se de uma oportunidade aliciante para este agrupamento, autor de algumas interessantes composições de rock português.
Além dos dois elementos que recentemente se juntaram aos CAN, vale a pena referenciar algumas notas sobre os quatro componentes originais.
Holger Czukay, baixo e vocalista, nasceu em Danzig em 24 de Março de 1938. As influências musicais que admite ter recebido vão desde Stockhausen (de quem foi aluno durante cinco anos) até músicas de culturas
nativas de diversos países. Toca vários instrumentos como uma jazz bass da Fender que ele próprio adaptou. Usa também uma Framus Triumph, um baixo duplo acústico e uma Farfisa especial.
Irmin Schmidt, nascido em Berlim no dia 29 de Maio de 1937, toca as teclas do grupo e o sintetizador. As suas influências musicais são demasiado vastas para serem aqui mencionadas. Tal como Czukay, foi aluno
de Stockhausen e de Berio. Os seus variados instrumentos musicais vão desde um órgão profissional Farfisa Duo, um piano eléctrico Farfisa e um sintetizador Alpha 77 desenhado e feito segundo as suas próprias
indicações, pela casa Hermi Hogg Electronics de Zurique (Suiça).
Michael Karoli, nasceu em 29 de Abril de 1948 em Straubing, na Baixa Baviera. Toca guitarra, violino, steel guitar, etc. Admite e reconhece ter influências musicais de velhos pianistas de ragtime, de músicos
indianos, húngaros e romenos, e de guitarristas e banjoistas de jazz, próximos do ragtime. Entre os muitos instrumentos musicais que toca, destacamos: uma Fender Stratocaster modificada por Bob Hickmott, um
violino eléctrico Vitar, uma steel guitar da Framus, um violino acústico da Boémia com 200 anos, duas guitarras bávaras feitas artesanalmente por Hanika e um instrumento turco chamado Baglama. Possui também um pré-amp transformado por Bob Hickmott e um amp. Fender Vibrao Champ. Estes instrumentos estão conectados com um sistema combinado Farfisa / JBLancing que liga directamente com o PA das bandas.
Jaki Liebezeit, nasceu a 26 de Maio de 1938 em Dresden e é o percussionista do grupo. As suas influências musicais vão desde a ópera até ao jazz. Os seus instrumentos de percussão vão desde um kit de bateria
sonoro até alguns címalos de Avedis Zildjian e algum material especial para concertos ao vivo.

Discografia
1 - Monster Movie (1969 - United Artists)
2 - Soundtracks (1970 - United Artists)
3 - Tago Mago (1971 - United Artists)
4 - Ege Bamyasi (1972 UA)
5 - Future Days (1973 UA)
6 - Limited Edition (1974 UA)
7 - Soon Over Babaluma (1974 UA)
8 - Landed (Set 75 EMI)

 
 

Alguns artigos interessantes, para futura transcrição:

Dossier Supertramp (João David Nunes e Jaime Fernandes)
O Rock e o Resto - "1ª evocação das origens: Ginsberg" (coluna/artigo de António Mega Ferreira)
Luis Villas Boas fala dos SOFT MACHINE...
Críticas de discos:
Message - «Message» [DECCA SLPDX - 622213] por J.M.F.
Caravan - «Canterbury Tales» (Volume 1) [DECCA PSKLR-5273], por AAP
Pequenos artigos/colunas de António Sérgio:
. Oh, Qualidade!
. ISPY
. PUNK 3
. BAZAR - OUT
...&Som - secção a cargo de Manuel Bravo:
. Batimentos
.. Batimento de duas ondas sinusoidais
.. Batimento de sons
..Batimentos na técnica
.. Ilustração do Batimento
. A Rádio... O Mundo Ao Seu Alcance
.. Como receber estações longínquas?
.. Sensibilidade do receptor
.. Selectividade do receptor
.. Estabilidade do receptor




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