BLITZ
(Jornal Musical)
Ano IX
Nº 433
16 de Fevereiro de 1993
Sai às Terças-Feiras
Director: Rui Monteiro
Preço: 100$00
40 páginas
Capa e algumas páginas interiores a 3 cores, outras a preto e branco.
Ficha Técnica (parcial)
Redacção, administração e serviços comerciais: Av. Infante D. Henrique, 334, 1802 Lisboa
Director: Rui Monteiro
Chefe de Redacção: António Pires
Redacção:
Cristina Duarte
Miguel Francisco Cadete
Nuno Galopim
Raquel Pinheiro (Porto)
Rita Carmo (Fotografia)
Direcção Gráfica:
Cândida Teresa
Colaboradores:
Adágio Flor
Álvaro Romão
André Lepecki (Nova Iorque)
António Freitas
António Maninha
António Pedro Saraiva
Bruno Branco
Bruno Maçães
Diniz Conefrey (ilustração)
Fátima Castro Silva (Porto)
Fernando Santos Marques
Gimba
Hélder Moura Pereira
Hélder Salsinha (fotografia)
Hugo Moutinho (Porto)
Isabel Lucena (Londres)
João Correia
João Bugalho
José António Moura
José Antunes
Lili Wilde (Londres)
Luís Mateus
Luís Pinheiro de Almeida
Maria Ana Soromenho
Maria Baptista
Maria João Gouveia
Mário Correia
Miguel Cunha
Miss Ex
Monsieur Sardin
Paulo da Costa Domingos
Paulo Somsen
Pedro Esteves
Pedro Portela
Rafael Gouveia (Paris)
Rui Eduardo Paes
Sérgio Noronha
Sofia Louro
Teresa Barrau
Vítor Vasques (fotografia)
Manifesto (suplemento):
Ana Cristina
António Sérgio
Nuno Diniz
Jorge Lima Barreto
Manuel Dias
Tiragem média do mês anterior: 19 290 exemplares
Tal como disse aqui, este é um número de um período posterior em cerca de três anos e que cai naquela fase que então cataloguei como a segunda decadência, quicá o início dela, quiçá a última...
O Director continua a ser o mesmo (Rui Monteiro), alguns colaboradores são de qualidade (ver lista abaixo), mas já não era a mesma coisa. E fico-me por aqui.
Curiosamente, apesar da deriva mainstream a tiragem média decresceu.
AS ORIGENS
TECHNO 50 / 70
De pachhhh-bk-iiipschhhhhhh-bik a bzzzzzzzzzzzzz via
boiiing boom tachak
Ninguém nasce por geração espontânea. Os biólogos e
bio-químicos desde há muito deixaram clara a existência de um longo processo
evolutivo biológico, antecedido por uma ainda mais longa fase de ensaios
químicos (pré-biológicos), unicamente para explicar a origem de vida na Terra.
Com os géneros musicais, por mais cibernéticos, afastados
dos padrões biológicos ou desumanos que os queiram caracterizar, há também que
entender a necessidade de uma pré-história onde as bases fundamentais, os
vocabulários possam nascer, desenvolver-se.
Só é possível um «Charly» de uns Prodigy porque, desde o
advento das electrónicas, o homem sempre tentou nelas encontrar um veículo para
diversas aplicações, entre as quais as musicais.
As primeiras experiências válidas podem ser encontradas
em trabalhos experimentalistas assinados por nomes como Karlheinz Stockhausen,
Iannis Xenakis ou Pierre Boulez, nos anos 50.
Stockhausen deve aqui ser referido como um nome
fundamental, uma vez que «Gensag Der Junglinge» (1956) pode ser apontado como
dos primeiros trabalhos a remodelar os até então frequentes encontros entre as
técnicas de gravação ligadas à música concreta e certas escolas electrónicas.
Este trabalho, juntamente como outros por si assinados (como «Hymnen» ou «Aus
Den Sieben Tagen») serviram de base para intensos estudos (Stockhausen, e a grande
maioria dos seus contemporâneos, era académico), tendo encantado espíritos
igualmente inovadores como os de Terry Riley ou Philip Glass que, mais tarde
podemos encontrar como membros fundadores do movimento minimal repetitivo
norte-americano. A techno foi, portanto, um território de estranha e quase
impenetrável experimentação. Claro que, nesta altura, o termo techno não
existia, nem faria qualquer significado.
Para terem ideia do som destes primeiros ensaios
«technológicos», tentem brincar, simultaneamente, com um rádio de ondas curtas
e as mais estranhas fontes geradoras de som, desde cordas de piano soltas a
gotas de água em dia de chuva.
Por territórios experimentalistas a techno permaneceu até
à alvorada dos anos 70. Antes, ainda nos anos 50, devemos apontar algumas
tentativas de fuga aos nebulosos laboratórios nomeadamente as protagonizadas
pela BBC Radiophonic Workshop, responsável pela concepção de sons para
programas da série «Dr. Who» - talvez se recordem de alguns destes sons na
brincadeira dos KLF, sob o alter-ego The Timelords, «Doctorin’ The Tradis». Por
essa mesma altura, na Califórnia, o dr. Robert Moog dedicava, diariamente,
horas de estudo a um projecto seu que, apenas em 1972, fez a sua estreia em
disco: o sintetizador (o disco era «Son of My Father» dos Chicory Tip). Com um
novo meio disponível, e outros tantos em fase de acabamento, a techno viveu
então a aurora de um processo que, em menos de dez anos dela faria um dos
elementos fundamentais da música.
Sediados nos «sagrados» estúdios Kling Klang em
Düsseldorf, quatro alemães desenvolviam os fundamentos estruturais para uma
nova linguagem exclusivamente derivada de códigos electrónicos. Filhos-prodígio
de uma vaga «electrónica» surgida na Alemanha em 1970, os Kraftwerk souberam, a
princípio, investigar as possibilidades e capacidades dos seus instrumentos.
«Kraftwerk 1» (1971), «Kraftwerk 2» (1972) e «Ralf and Florian» (1973) pouco
mais permitiam que novos ensaios, novos testes. Em 1974, uma vez dominada a
nova tecnologia, criam o clássico «Autobahn», o primeiro disco «techno» para
ouvidos menos sofisticados. Com os sucessores «Radio Activity» (1975), «Trans
Europe Express» (1977) e, sobretudo, «The Man Machine» (1978), definem as
regras para uma aproximação das novas linguagens à chamada música popular. Yello,
Yellow Magic Orchestra, Human League ou Gary Numan completam a elaboração de
princípios suficientes para que, em finais de 70, surja, explosivo, o fenómeno
da «techno pop».
O entendimento entre linguagens «techno» e a música de
dança foi, pela primeira vez, concretizado pelos próprios Kraftwerk, por
ocasião da composição de «The Model» em 1978. Pouco tempo bastou para que
outros lhe seguissem os passos. Além das diversas abordagens dançantes «techno
pop» (Depeche Mode, Heaven 17, OMD, ...) ou de si derivadas (Yello, Yellow
Magic Orchestra, Ryuichi Sakamoto), outras leituras em breve se tornaram
possíveis. Seguindo pistas já ensaiadas no «funk» de finais de 70, alguns entre
os primeiros «rappers» desenvolveram as vias «electro». «Planet Rock» dos
África Bambaataa pode servir como exemplo. Foi também por mãos negras que, na
Detroit de meados de 80, DJs como Derrick May, Kevin Saunderson ou Juan Atkins
protagonizavam um processo de fusão entre linguagens «techno» e os ritmos
«house» que então emergiram em Chicago. Eram os primeiros passos da «techno
house» que, passados quase seis anos, conheceu já tantas formas quanto as que a
imaginação de músicos e DJs tem permitido: «acid house», «hardcore techno»,
«progressivo house», «new beat», «italo techno», «techno trance», blá blá blá
bzzzzzz!
Tudo tem um começo.
Nuno Galopim
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