Ibérico
Nº 0 - Março de 1988
40 páginas
Quem quiser a versão em pdf do nº 0, nº 1 (este) e/ou nº 2, envie-me email, pf.
Deste fanzine foram editados 4 números, contando com o nº 0, sendo pois o último o nº3, o que, como podem comprovar, tem originado grandes confusões.
O nº 3, e último, veio acompanhado de uma cassete, que hoje de culto, ainda mais que os fanzines propriamente ditos, como podem confirmar pelo preço exorbitante que pedem por um exemplar (59€, À data da publicação deste post.)
O Ibérico foi um fanzine baseado num programa de rádio, que passava diariamente na RUT (Rádio Universidade Tejo), da responsabilidade dos irmãos Paulo e Fred Somsen, além de Eugénio Teófilo. Foram eles a alma do fanzine, que, no seu número 1 começou a receber também as contribuições de um outro vulto da imprensa musical, o crítico Fernando Magaljhães, que aqui deu os seus primeiros passos.
O tipo de música versado no fanzine, e também no programa de rádio aludido era variado, mas dentro de certos limites, não cedendo a quaisquer impulsos ou pressões comerciais. Foi o tempo glorioso das rádios pirata em Portugal. Artistas típicos: Nurse With Wound, Death In June, Curent 93, mas também a EBM dos Front Line Assembly e Front 242, entre outros, etc. Tudo o que saía de obscuro, não interessava o género, era objecto de pasagem e critica.
Começamos por ilustrar o fanzine através do seu nº zero:
Editorial
E pronto chegamos à parte mais difícil de consolidar - As palavras finais do início - o célebre
Editorial
Peça imprescindível em qualquer periódico. Assim, o Ibérico é um fanzine formado por um molho de folhas que pretendem ter em comum, só os agrafos que as apertam.
O nome, por exemplo, nada tem a ver connosco, muito menos convosco - é um mero logotipo à venda por cem paus! Uma salada mista com maionese talhada e condimentada pelo pessoal cá do burgo - talvez a melhor identificação, que se adapta ao fanzine - através da negação: não é um pós moderno fanzine, nem um litro de papel contendo informação útil e actualizada sobre o costumeiro "de tudo um pouco".
Foi construído, escrito e pilhado por uma xunga de curiosos, estudiosos, avacalhadores, hipócritas, escribas de toilete, e ainda alguns idiotas e sensaborões, todos contribuindo para mais um episódio de folclore urbano tão esfomeado em coisas fortes.
A capa, sem fundo ibérico. A península sem ter culpa nenhuma do título.
Ideia - por isso se fala tão pouco dela, e ainda bem, senão teríamos de ser mais cruéis e, pior que tudo, menos patrióticos.
Ibérico, cheira a suor e muito gozo. [Foram cerca de onze meses]. Mais algum azedume num saco de raiva, sobretudo porque continua a não acontecer nada aqui e a culpa é muito nossa.
Para terminar (já que o espaço é pouco), se não vos agradar, contactem-nos, pois garantimos a devolução do 'papel' que desembolsaram, em gargalhadas.
O Irresponsável: P. Somsen
Melleril de Nembutal
Estamos vestidos, com lençóis, descalços, cabelos soltos, ancas cingidas com cordões dourados. Os nossos soporíferos de todas as cores transformaram-se em colares, brincos, pulseiras, anéis, jóias. As nossas caras todas riscadas com mercurocromo e arnica. Queriam proibir-nos de ser homens desejáveis e maquilhados. Empoei oo rosto de branco, pintei as pálpebras com carvão apagado, untei os lábios com pomada. Levamos círios roubados do "atelier" de ergoterapia. Obrigam-nos a fazer velas de cera, flores de papel, caixas de papelão, xailes, cestos para o pão que vendem aos normais. Não trabalharemos doravante para os normais. Agora somos belos, reis vestais. Seguimos pela estrada cantando cantigas infantis e cânticos de igreja, músicas vindas do fundo de nós mesmos.
Melleril de Nembutal será o teatro dos mal castrados?
Talvez a música folclórica e tradicional dos asilos urbanos, sempre marginalmente minoritária?
Melleril de Nembutal desde a copulação em Agosto de 1985, até ao parto, em Março de 1986. Passaram-se sete meses. Um parto prematuro, incompleto. A ideia começou a tomar forma. Nasceram cinco espantalhos na ponta de uma guita: Canto Buendia, Hesskhé Yadalanah, Justo Infantes, taperapefuxe e Canio Silvestre. Por vezes aparece mais um Camarada McGuinty, Ou outro: Arcádio Maturina. Ou ainda: Céti Rápá.
A nível de imagem, é a guita que comanda a música. Têm atitudes e personalidades próprias. Nos seus concertos tanto podem fazer transparecer a sujidade do trabalho de um operário, como actuarem parcialmente nus, onde mostram as pinturas vermelhas e brancas obscenas no corpo, como ainda de saias ou de qualquer outra maneira onde se sintam à vontade para fazerem o seu teatro de música castrada, onde dizem encontrar o verdadeiro espírito da seriedade.
Costumam utilizar como cenário de fundo nos seus espectáculos um painel, que simboliza a parede de um antigo quarto de asilo para velhos loucos. Nesse painel encontra-se a frase "Lebre-Caçador-Campo" onde se espelha uma ideia comum ao grupo.
Melleril de Nembutal pretende explorar uma via própria na construção de temas, onde vai também explorar mais tarde, uma improvisação de movimentos em palco - o teatro dos malcastrados, e a psiquiatria da anti-música.
(Festival Nacional de Nova Música Rock) Pav. Infante Sagres - Porto (ainda em embrião) 30NOV85
Escola Secundária de António Arroyo - Lisboa 12JUN86
Academia de Santo Amaro - Lisboa 19JUL86
Festa do Avante (Palco da Juventude) - Lisboa 07SET86
Largo do Rio Seco - Lisboa 4OUT86
(Interarte 86) Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa 18OUT86
Rock Rendez-Vous - Lisboa 28NOV86
(Festa de "O Diário") Coliseu dos Recreios - Lisboa 10JAN87
(4º Concurso de Música Moderna) Rock Rendez-Vous - Lisboa 21FEV87
Escola Secundária da Ameixoeira - Lisboa 28MAR87
(4º Concurso de Música Moderna) Rock Rendez-Vous 10MAI87
Largactil. Nubaréne. Ecuanil. A Manhã. Emma Amma. A Casa. Samuel. Ku Klux Kristah. Outono. "Intro de Percussões". Trevor Watts. A Carta. Vasija de Barro. Movimentos Córeicos. Flying Tóts.
Para ela, para a rapariga que morreu.
Ela e eu fugimos juntos do asilo. Fugimos do asilo e do silêncio, uma noite, uma madrugada, pela neve. Queríamos ir ao encontro dos outros. Ir ao encontro das palavras e do som.
Já cá fora, quando chegámos à estação, tivemos medo. Não estávamos habituados. Já começávamos a arrepender-nos, queríamos voltar atrás...
Ela atirou-se para debaixo do comboio.
Eu continuei. Procurei as palavras. Procurei o som.
Ainda por inventar.
Prémio de Originalidade - 4º Concurso de Música Moderna RRV.
A fechar ficam os agradecimentos a quem pronta/ participou na consolidação desta primeira coisa:
António Carvalho
Eugénio Teófilo
Fred Somsen
João Pedro Costa
José Dias Curto
Paulo Branco Lopes
Rafael Gouveia
Rui Brazuna
Rui Pureteiro
Rui Vargas
Rui Viana
Rui Pires
Renato Santos
Tadeu Saavedra
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