Record Collector
Issue 294 - Februaray 2004
£3.30 (original UK) - 7.30€ (importado pt)
148 páginas
A Record Collector é a "bíblia" dos coleccionadores de discos. Trata-se de uma excelenete revista, de que deixo aqui um exemplo. Não tenho muitos exemplares, pois como o dinheiro não abunda, as enormes listas de discos de colecção, normalmente a preços exorbitantes, deixavam-me um bocadinho frustrado, lol.
Neste caso comprei-a por dois motivos: para a conhecer mais em pormenor e porque tinha um artigo referente aos Nurse With Wound, que aqui deixo.
Evolução Industrial
Ian Shirley explora o estranho mundo dos titãs da experimentação industrial, Nurse With Wound
Foi a improvável figura do cómico e actor John Cleese que deu o pontapé de saída na carreira dos Nurse With Wound. Em 1978 o homem dos Monty Python andava a passear por um estúdio de gravação no Soho, onde Steve Stapleton se encontrava a a fazer um projecto de design de uma janela. Toda a gente ficou embasbacada à passagem da celebridade, e Stapleton ficou a falar com o engenheiro Nicky Rogers, que lhe disse que conseguia arranjar tempo de estúdio barato. No fim de semana seguinte aceitou a oferta, juntamente com dois amigos sem nenhuma competência na área da música: "A ideia de podermos entrar num estúdio, fazer barulho, gravá-lo e depois ouvi-lo, foi uma grande alegria para nós". Esta sessão espontânea tornou-se no primeiro álbum dos Nurse With Wound, "Chance Meeting On A Dissecting Table Of A Sewing Machine And An Umbrella". Não foi enviada qualquer cópia a John Cleese quando o álbum foi editado, em 1979.
A partir daquela primeira bolota atonal, os Nurse With Wound cresceram e tornaram-se num frondoso carvalho, com um imenso catálogo de edições e uma enorme base de fãs a nível mundial. Os Nurse não são um grupo na forma tradicional como a conhecemos mas sim um guarda-chuva debaixo do qual Stapleton se abriga, quer a solo ou com outros colaboradores musiciais. Os Nurse funcionam foram da indústria da música - sob o rada cultural - e encontram-se numa sombra que é comummente percepcionada como 'Industrial' ou auto-indulgência atonal. Isso é, contudo, um rótulo injusto e limitador pois, ao longo de duas décadas, Stapleton gravou todo um corpo de trabalho que vai desde paisagens sonoras ambientais obrigatórias, colagens sonoras, krautrock, easy listening e twisted mambo. Soando como os primos desconhecidos de Aphex Twin, os Nurse não obtiveram reconhecimento do mainstream mas preencheram e expandiram totalmente o seu potencial.
Em 1979, contudo, Chance Meeting sugere que Stapleton (instrumentos vários / efitos) John Fothergill (não-guitarra) e Heman Pathak (não-teclados) não tinham potencial algum que lhes permitisse encarar uma carreira musical. Com a música auto-financiada e editada na sua própria editora, a United Dairies, a mairia dos compradores foi atraída pelo notável fetiche da arte da capa e repelida pela música. Chance Meeting foi recenseado pelo semanário musical Sounds que, perplexo pelo conteúdo (não) musical, lhe atribuiu, como clasificação, cinco intrigantes pontos de interrogação em vez de estrelas.
Hoje em dia, Stapleton permanece orgulhoso pelo álbum que iniciou a sua longa carreira: "Eu nunca tinha pegado num instrumento antes disso. Queria fazer alguma música, e se o desejo existe cá, encontras sempre uma maneira. Forcei uma cavilha quadrada a entrar num buraco redondo. A partir daí os outros tipos foram-se embora e eu fiquei com o nome Nurse With Wound". A visita de cabeceira seguinte, To The Quiet Men From A Tiny Girl (1980), Merzbild Schwet (1980) e Insect And Individual Silenced (1981) foram colagens dadaístas, tacteando e produzindo efeitos exploratórios.
O que fascinou Stapleton não foi escrever canções de três minutos com melodias e letras, mas as possibilidades oferecidas pela exploração de texturas sonoras extensas: "Basicamente, o que faço - e isto soa pretensioso - é esculpir o som até ele ficar como pretendo. Eu não sei tocar qualquer instrumento. Apenas adoro o som. Adoro criar e manipular sons."
No início da década de 80 o trabalho de Stapleton como designer gráfico custeou as sessões de gravação nocturnas em estúdios baratos onde ele masterizou material que ia desde vozes, percussão, gongos até todas as outras formas de ruído. O que tornou esses álbuns atractivos foi que Stapleton era o seu maior fã: "Quando faço a minha própria música quero que ela seja interessante para mim. Quero apenas fazer uma peça de música que gostaria de ouvir. O produto colateral é que quando ela é editada, as pessoas vão ouvi-la e possam elas próprias gostar também."
O álbum que começou a juntar uma multidão à volta do campo dos Nurse foi Homotopy To Marie (1982), no qual Stapleto se deliciou com as possibilidades abertas por samples rudimentares e tape loops. "Comprei um Revox A77 e passei algum tempo a cortar fitas magnéticas em casa, o que foi uma coisa maravilhosa de fazer," lembra. "Não há nada como a edição de fita magnética. Podes cortar um bocado de fita e colocá-la depois num contexto não habitual e ficar maravilhado ou horrorizado com o resultado." Muitos ficaram.
Ainda assim, os Nurse eram ainda pouco mais do que um magnífico hobby. Colocados dentro das capas artísticas belíssimas de Stapleton, os álbuns eram prensados em pequenas quantidades e editados através da editora United Dairies, que expandiu as suas actividades e géneros para incluir bandas tais como os Lemon Kittens. As recensões e críticas eram escassas, as vendas permaneciam baixas e a percepção geral era que os Nurse eram uma boa banda arty, incluída no movimento industrial de que faziam parte os Throbbing Gristle. O colaborador mais significativo de Stapleton foi David Tibet, que conheceu em 1983. Tibet tinha sido membro da banda pós-Throbbing Gristle, os Psychic TV e despontava como cantor com letras desafiadoras. Depois de trabalhar com Stapleton no álbum Ostranennie 1913 (1983), os dois ficaram muito próximos desde então.
Tibet trabalhou em muitos álbuns dos Nurse, e, por sua vez, Stapleton trabalhou com Tibet no seu grupo, os Current 93, servindo como trampolim musical sob o qual Tibet despejava as suas preocupações através das suas letras. O envolvimento de Tibet estendeu-se também às actuações ao vivo, que foi composta por oito actuações entre 1984 e 1986. Apesar de misturar o som para os concertos subsequentes dos Current 93, Stapleton não tinha grande interesse no marketing obtido através das actuações ao vivo: "Eu não me posso distrair com concertos ao vivo. Não estou nesta vida para fazer dinheiro ou por razões de ego. Não gosto particularmente de ser conhecido em público".
Um culto mais alargado dos Nurse começou depois da edição de dois álbuns essenciais, Spiral Insana (1984) é um tilintar magistral rítmico, junto com estocadas de órgão e atmosferas que soam como uma banda sonora para um filme de terror de John Carpenter. É uma suite cinemática cativante de música instrumental. Soliloquy For Lilith (1986), por outro lado, é uma extensa série de drones.
"Esses foram os dias antes de terem colocado portas de barulho nos pedais de efeitos", lembra Stapleton com deleite, "e os ruídos extraterrestres que eles geravam podiam viajar de um pedal para outro. Se fizesses um loop de 15 pedais, um podia tocar até ao seguinte e assim continuar até construirem uma textura e um ritmo por eles próprios. Eram tão sensíveis que se fosse a algum lado por perto deles com a tua mão podias tocá-los como se fossem um theremin. Foi assim que Soliloquy foi feito".
Foi na altura de Soliloquy que Stapleton deixou o seu trabalho como designer gráfico para se concentrar a tempo inteiro na música. A United Dairies foi fechada: "Fiquei aborrecido, realmente. Eu adorava fazer música mas não da confusão que é dirigir uma editora e tratar de problemas como os royalties e toda essa espécie de porcarias burocráticas." Os direitos foram entregues para gestão à World Serpent que a partir daí passaram a editar, distribuir e manter todo o catálogo dos Nurse disponível em CD.
Cansado de Londres, Stapleton também se mudou para a Irlanda e começou a trabalhar numa velha casa rústica que cresceu depois até um local físico para artistas. Uma coisa que ele nunca montou foi um estúdio de gravação: "Eu não tenho qualquer equipamento de gravação. Também não tenho quaisquer instrumentos. Quando entro num estúdio de gravação começo do nada. É por esse motivo que a minha música acaba sempre por ir parar a lugares peculiares porque nem eu sei onde ela poderá ir parar, É uma viagem surpresa tanto para mim como para o ouvinte.."
Esta abordagem tem mantido os Nurse frescos. A cada nova edição os ouvintes nunca sabem que vegetal sonoro cresceu no solo fértil da mente de Stapleton.Os a´lbuns revelam extremos deliciosos, desde a easy listening de Sylvie And Babs (1988), a loucura do mini-álbum Brained By Falling Masonry (1984 - uma homenagem ao clássico do Krautrock, Cottonwoodhill, dos Brainticket, que Stapleton descreve como "o mais maravilhoso álbum de psicadélico fake alguma vez feito") e Bright Yellow Moon (2001) uma colaboração Nurse/Current 93, que envolve poesia, sentimento e textura.
Stapleton recebeu também ofertas para produzir e remisturar. Nenhuma foi aceite até os Stereolab terem feito uma proposta que ele não pôde recusar: "Eles disseram, damos-lhe um par de faixas e você pode fazer com elas o raio que quiser", ri-se ele. "Nós não queremos ouvir nem ver nada. Você desnha a capa, mistura as faixas e faz delas o que bem enetender. Queremos apenas ir à loja e comprar o disco sem saber como ele é".
O resultado foi Crum Duck EP, editado em 1993. Outra colaboração Nurse / Stereolab, Simple Headphone Mind, seguiu-se, em 1997.
Stapleton mantém as orelhas para baixo e está correntmente fascinado por Missy Elliott. Uma influência que filtrou foi o leader de banda cubano Perez Prado: "Estive obcecado pelo tipo por muitos anos até hoje." Pouco depois, Stapleton contratou a sua febre Prado e gravou Rock And Roll Station, um choque para os fãs de longa data.
O seu último álbum também dividiu as hostes: Salt Marie Celeste é uma suite cativante de uma hora que soa a um ranger de entranhas de uma galé Viking a ancorar num mar de Inverno.
"Metade dos meus fãs ficarão completamente horrorizados, zangados e revoltados e a outra metade ficará em êxtase!" ri-se Stapleton.
Compras de Nurse
Como Abordar o Arquivo dos NWW
O vasto catálogo de edições dos Nurse With Wound é uma selva densa e requer um guia especializado. Comece por Chance Meeting e nunca mais se aproximará de uma árvore outra vez. Por isso, os Nurses não iniciados devem começar por Rock And Roll Station e Spiral Insana. Progrida através de Soliloquy To Lilith, Crumb Duck e Salt Marie Celeste. Aqueles que procuram um álbum de Greatest Hits perdem o seu tempo, apesar de cinco faixas da compilação Funeral Music For Perez Prado servirem como exemplos excelentes deo som maturo dos Nurse. Aqueles que não conseguirem encontrar os CDs dos Nurse na sua loja local Virgin, HMV ou Woolworths, devem contactar a World Serpent directamente atarvés do (0208) 694 2000 / www.worldserpent.com.
Procurar a Ferida
Os Coleccionáveis dos NWW que tem de ter
Devido ao facto de a maioria dos primiros álbuns, singles e EPs dos Nurse With Wound terem sido editados em quantidades limitadas, eles são altamente valiosos para os coleccionadores. Por exemplo, os primeiros três álbuns são de edição limitada de 500 cópias numeradas à mão. Uma compilação como Drunk With The Old Man Of The Mountains (1987) foi limitada a 100 cópias pintadas à mão, assinadas e com capas individualmente desenhadas por Stapleton.
Apesar de todo o material dos Nurse With Wound ter sido reeditado em CD, Stapleton é como Frank Zappa no aspecto em que mexe e remexe quando remasteriza. Como consequência, as edições originais são coleccionadas avidamente por fãs internacionais hardcore. Os valores permanecem elevados.
Top 10 das Raridades dos Nurse With Wound
United Dairies UN 0124 PSILOTRIPITAKA (box set, com os primeiros 3 álbuns dos Nurse, num saco de cabedal, 1990) - £300-500
United Dairies UD 025 DRUNK WITH THE OLD MAN OF THE MOUNTAINS (LP, 100 cópias com capa pintada individualmente por Stapleton, 1987) - £200
United Dairies UD 001 CHANCE MEETING ON A DISSECTING TABLE OF A SEWING MACHINE AND AN UMBRELLA (LP, primeira edição de 500, numerados à mãos, com insert, 1979) - £150
United Dairies UD 008 INSECT AND INDIVIDUAL SILENCE (LP, único album dos Nurse não reeditado em CD, 1981) - £100
United Dairies UD 0123 PSILOTRIPITAKA (1000 box sets dos primeiros três álbuns dos Nurse, com um LP de bonus, 1990) - £80
Idle Hole Mirror 1 SOLILOQUY FOR LILITH (3-LP box set, Partes 1-6, 150 cópias com capa de feltro, 1988) - £80
United Dairies UN 003 TO THE QUIET MEN FROM A TINY GIRL (LP, 500 cópias numeradas à mão, 1980) - £70
United Dairies UD 004 MERZBILD SCHWET (LP, 500 cópias numeradas à mão, 1980) £70
White Noise WN 001 ALICE THE GOON (12" de um só lado vendido à audiência num Festival em França, 1995) - £70
Bragagild BRAG 004 CHANCE MEETING OF NURSE WITH WOUND AND UNVEILED ON CHARLOTTENBORG (LP, vendido numa instalação de arte na Dinamarca, vinyl amarelo, 2002) - £70
Sem comentários:
Enviar um comentário