6.7.15

Memorabilia: Revistas / Magazines / Fanzines (95) - Blah Blah Blah (Lux) - Janeiro de 2008


Blah Blah Blah (Lux) - Janeiro de 2008
68 páginas +/- A4, a cores, papel não brilhante grosso (tipo cartolina)


O Homem Que Quis Mudar O Mundo

Buckminster Fuller (1895-1983) será um nome estranho, mas as suas ideias podem mudar o mundo. Por optimismo ou delírio, Fuller acreditava que era possível acabar com a pobreza, respeitar o planeta e viver em harmonia com a natureza (a humana também). E pensou em muitas maneiras de tornar isso verdade.
«We are called to be architects of the future, not its victims», R. Buckminster Fuller




Marshall McLuhan chamou-lhe o Leonardo Da Vinci dos Tempos Modernos. John Cage afirmou que a nossa época ficaria para a história como a de Buckminster Fuller. Harold Kroto, Robert Curl e Richard Smalley venceram o prémio Nobel da Química em 1996, pela descoberta de moléculas de carbono a quem deram o nome de Fullerenos, ou Buckyballs.
Os Fullerenos são hoje uma das esperanças da nanotecnologia. Chama-se assim pela semelhança que mant~em com a estrutura de tetraedro, que Fuller dizia ser a forma mais simples da natureza e que está na base das suas esferas geodésicas. Se estas recomendações não forem suficientes para atestar sobre a importância de Buckminster Fuller, posso sempre citar um artigo do New York Times de 1999, com o elucidativo título: «The Face of the Future Is a Thing of the Past», onde Fuller é apresentado como um visionário cujas ideias, ainda largamente inexploradas, podem dar uma nova esperança ao Planeta e à Humanidade.
A história de Buckminster Fuller é tão extraordinária que até um filme seria inverosímil. Nasceu em 1895, no Massachusetts, numa família idealista, com um pai abolicionista e uma tyia-avó transcendentalista (também não sabia o que era, mas a Wikipédia diz que foi uma corrente americana de pensamento intelectual do início do século XX, inspirada em Kant e na qual militava Thoreau). Estudou em Harvard, de onde foi expulso duas vezes por comportamento boémio. Casou em 1917, teve duas filhas e vários empregos, incluindo tenente da Marinha e empresário. A vida de Bucky Fuller podia ter seguido sem outros sobressaltos que não os típicos de um cidadão comum durante a recessão dos anos 20. Mas bateu no fundo antes de renascer com um espírito de missão e uma clareza de pensamento capazes de mudar o mundo. Em 1927, aos 32 anos, Bucky Fuller está desempregado, falido, a viver quase na miséria nos subúrbios de Illinois. Perde a filha mais velha, ainda criança, e começa a beber. Quer morrer. Tenta afogar-se. Num momento de redenção, porém, e sem que haja relatos de directa intervenção divina, Buckminster Fuller desiste do suicídio e decide trabalhar em prol da humanidade.
Durante um ano não falou porque, dizia, queria libertar-se dos reflexos condicionados da linguagem. Fuller percebeu assim que tudo o que lhe tinahm ensinado estava errado e começou do zero, construindo um dos mais geniais corpos de trabalho científico de sempre.
Nos anos 40, Buckminster Fuller lançou as bases do ambientalismo e ecologia, propondo o princípio do pensamento global, acção local. Ele percebeu as diferenças entre as diversas regiões do planeta e propôs formas de redistribuição equitativa da riqueza para nivelar os desiqulíbrios. Previu a escassez de recursos e imaginou uma arquitectura em consonância com isso mesmo, pensada para o aproveitamento de água e energia. Todo o seu pensamento e acção foram no sentido do futuro, por uma gestão do presente em função das novas gerações. Inventou casas inteligentes, carros com tr~es rodas, casas de banho sem água. Imaginou cidades flutuantes. Muitos dos seus inventos nunca passaram de hipóteses. Apenas foram construídos dosi protótipos das dymaxion houses e apenas um continua em pé (está no Henry Ford Museum). O dymaxion car nunca chegou a ver os planos de produção em massa concretizados, por causa de um acidente na Feira Mundial de Chicago em 1933 (há quem diga que foi porque os investidores retiraram o dinheiro, temendo que o eficiente e económico dymaxion car ofuscasse os outros veículos já existentes no mercado), mas os carros que vemos em «AI» de Steven Spielberg devem muito ao design original de Fuller. Ainda assim, Fuller não foi propriamente um génio incompreendido, teve merecidos momentos de glória. Sobretudo com a esfera geodésica (criada em 1949), a sua obra mais notável. Trata-se de uma estrutura arquitectónica semelhante a uma bolha de ar (ou a uma bola de espelhos), ultra-leve mas extremamente resistente e de custo baixo, fácil de transportar e montar, usada actualmente em projectos militares que visam coisas tão distintas como o estudo das hipóteses de colonização de outros planetas, ou apoio às populações em situações de crise. As esferas geodésicas são funcionais e esteticamente impressionates. A mais famosa será a Millenium Dome construída em Londres, para assinalar a transição do milénio. Ou talvez a que vemos nos campos de futebol. A bola de futebol aprovada pela FIFA em 1970, e ainda hoje usada, é uma esfera geodésica. O seu desenho é inspirado nas construções de Fuller, por isso tem o nome técnico de Buckminster Soccer Ball (é verdade!!!).




Fuller foi inventor, arquitecto, cientista, engenheiro, matemático, filósofo, economista, designer, futurista, amigo de Erik Satie, John Cage, Merce Cunningham, heróis hippie, guru espiritual, pai da consciência planetária. Chamaram-lhe visonário romântico, poeta tecnológico. Não tinha qualificações académicas mas registou várias patentes, inventou conceitos como sinergia (e usou-o como princípio científico muito antes deste ter sido desbaratado pelo marketing), foi distinguido com umas dezenas de doutoramentos, incluindo um em poesia (pela mesma universidade de Harvard que o expulsara). Apesar de tudo, muitas das suas ideias nunca passaram do papel, embora contenham em si algumas propostas práticas importantes para o futuro da Humanidade. Podemos saber quais são procurando no Google, ou lendo, por exemplo, o seu «Manual de Instruções Para a Nave Espacial Terra», que é uma boa matéria de reflexão numa época em que o catastrofismo niilista parece a opção mais tentadora.
Às vezes apetece acreditar na utoopia.
Isilda Sanches






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