23.2.17

DN - Série: Discos Pe(r)didos (1)


DN - Diário de Notícias

28 de Setembro de 2002

Discos pe(r)didos



Reflexo natural da «revolução» de hábitos musicais que se vivia na alvorada de 60, fruto das mudanças colocadas em cena pelo rock’n’roll e pelo súbito crescimento da indústria discográfica, uma nova música de apelo «jovem» começa a ouvir-se e a tocar-se deste lado da fronteira. O Portugal de então não era rectângulo surdo e desatento ao que acontecia sobretudo nos EUA, Inglaterra e, logo depois, França e Itália, importando imediatamente a vitalidade e novidade dos dois primeiros e a tendência para a fotocópia dos dois últimos.
Ainda nos anos 50, como primeira manifestação local do fenómeno rock’n’roll, os Babies (que nunca chegaram a gravar) apresentam-se como o primeiro grupo português a assumir essa mesma carga de novidade. Entre os elementos do grupo contava-se um muito jovem José Cid que, dez anos mais tarde, seria o elemento-chave do Quarteto 1111.
Apesar do protagonismo que a canção ligeira vivia nas ementas radiofónicas da altura, o rock’n’roll começa a chamar a si alguns momentos de atenção. Um rock’n’roll ainda bem comportado, limpo e bem arranjado. Feito de valores tradicionais, uma suave pitada de rebeldia (encenada), muita ingenuidade e farta dose de imitação. Entre os primeiros espaços a destacar os sons da nova geração, a Rádio Renascença propõe, em 1960, o concurso Caloiros da Canção, o antecessor (com muito favor e benevolência) dos concursos do Rock Rendez-Vous e outros de rock de 80 e 90...
A primeira edição dos Caloiros da Canção realiza-se nas diversas emissões do programa, emitido nas manhãs de fim-de-semana. Vencem a categoria de grupos os Conchas, duo constituído por José Manuel Aguiar de Concha e Fernando Gaspar (conhecidos também como Everly Brothers portugueses). Na categoria de artista a solo triunfa Daniel Bacelar, então com apenas 17 anos, apelidado por alguns como o Ricky Nelson português.
A estreia de ambos faz-se num EP conjunto, apresentado sob o título genérico Caloiros da Canção 1 que, editado em Setembro de 1960, representa uma das primeiras edições nacionais na área do rock. Num dos lados os Conchas apresentam versões de «Oh Carol» de Neil Sedaka e Should We Tell Him dos Everly Brothers (traduzida para português como Quero o Teu Amor). Na outra face do EP Daniel Bacelar gravava dois temas seus: Fui Louco Por Ti e Nunca. Em ambos os casos, os «caloiros» eram acompanhados por Jorge Machado e o seu conjunto.
Num texto publicado na contra-capa deste EP, lê-se: «Com este disco dá-se, assim, carta de alforria a três jovens artistas que, de agora em diante, ficam sujeitos ao juízo severo dos discófilos. Não nos admiraria, porém, que, mais uma vez, coincidissem as opiniões. É que, tanto o público como nós, nos guiamos pela mesma bitola: o mérito real dos artistas. E esse está bem patente neste disco».
Ambos fariam, de facto, carreira depois deste cartão de visita. Os Conchas editaram ainda alguns EPs nos primeiros dias de 60, como Ídolos da Canção (1960), Greenfields (1961), Em Férias (1961), Tentação (1962) e Somos Jovens (1962).
Por seu lado, Daniel Bacelar manteve também vida discográfica activa apenas durante os primeiros anos de 60. Gravou diversos EPs pela Valentim de Carvalho, Alvorada e pela editora espanhola Marfer, apresentando-se acompanhado pelos Gentlemen depois de 1964. Em 1966 abandonou a vida profissional na música.
O EP Caloiros da Canção 1 reúne, assim, as estreias de dois nomes da primeira geração do rock português.
Contemporâneos de Fernando Concha, dos Plutónicos, do Zeca do Rock e do histórico O Namorico da Rita, disco de Pedro Osório e o Seu Conjunto, que chegou às rádios em 1959. O rock, mansinho e bem arranjado, dava os primeiros passos entre nós.
Nuno Galopim

OS CONCHAS / DANIEL BACELAR Caloiros da Canção 1 EP Columbia / Valentim de Carvalho, 1960
Lado A: Os Conchas, com, Oh Carol e Quero o Teu Amor;

Lado B: Daniel Bacelar, com Fui Louco Por Ti e Nunca.






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