26.2.17

DN - Série: Discos Pe(r)didos (3)


DN - Diário de Notícias

05 de Outubro de 2002

Discos pe(r)didos




O Portugal Suave de 1969 assistiu ao nascimento de três importantes bandas nas áreas da música pop/rock: a Filarmónica Fraude, o Psico e os Objectivo. Estes últimos representam um dos raros casos de partilha de espaço com músicos não portugueses e traduz ainda a importância que o programa televisivo Zip Zip teve na revelação de novo talento nesses últimos dias de 60.
O nosso país era, já na altura, ancoradouro para alguns estrangeiros que aqui procuravam sopas, descanso... e trabalho. Kevin Holdale, norte-americano, instalara-se em 1968 em Lisboa. Com um passado musical de alguma notoriedade, cedo se juntou a outros músicos (entre eles Mike Sergeant) para formar os Mechanical Dream.
Paralelamente o baterista dos Ekos, Mário Guia, junta os Show Men, constituídos por si próprio (bateria), Tó Gândara (guitarra), Luís Filipe (teclas e guitarra) e Zé Nabo (baixista que tinha em tempos tocado com Vítor Gomes). Para este segundo grupo as coisas não correm bem até ao dia em que são convidados a tocar no Zip Zip. Apresentam-se sem nome, agradam e recebem do público espectador um nome: Objectivo. Atenta, a Sonoplay (mais tarde Movieplay) convida-os a gravar um EP, surgindo assim, a sua estreia em disco logo em 1969.
Uma série de problemas surgidos imediatamente após a gravação do EP conduziu os Mechanical Men e os Objectivo em rota de colisão. E, após as saídas de Tó Gândara e Luís Filipe, entram no Objectivo Kevin Koldale e Mike Sergeant. Mário Guia passa a relações públicas e para a bateria entra Zé da Cadela.
Em pleno episódio de convulsão interna, o grupo não está presente no lançamento do EP. De resto, as preocupações do Objectivo apontavam já ao segundo disco, um single que representou a primeira gravação estereofónica de um single português. The Dance Of Death e This Is How We Say (Goodbye) (composições de Kevin Holdale) preenchem as duas faces de um single que evidencia o desejo dos novos desafios da técnica e só falha nas vozes. As composições são interessantes desafios à forma da canção, sugerindo desejos de um experimentalismo pré-progressivo. The Dance Of Death ensaia, inclusivamente, uma abordagem à valsa, e não esconde encantos pelos novos teclados.
Visualmente os Objectivo causam também sensação. São banda regular na boite Ronda (no Monte Estoril) e, face a um público de fato engomado e gravata, contrastam pelos cabelos longos, túnicas e motivos florais. Chamavam-lhe o «look à Carnaby St»...
Apesar das inequívocas qualidades deste segundo disco, a vida do Objectivo não foi tranquila após a sua edição. A usa música, tal como a aparência dos músicos, era olhada com a suspeita de algo estranho e não «normal»... Todavia, o grupo representou, nos seus dias, uma das mais atentas pontes de contacto directo com os acontecimentos da capital pop/rock _Londres. The Dance Of The Death, bem como o outro single editado ainda em 1970 (Glory / Keep Your Love Alive, novamente duas composições de Kevin Holdale), são peças fulcrais do melhor rock português de inícios de 70.
Novas mudanças de formação têm lugar entre 1971 e 72. Pelo grupo passam nomes como os de Terry Thomas e Guilherme Inês. Holdale, a dada altura, segue caminho paralelo no Bridge, um grupo de jazz. Da sua convivência nessas fronteiras nasceria ainda uma colaboração com o Duo Ouro Negro e Fernando Girão (dos Very Nice), da qual nasceria o álbum Background.
Num vai e vem de músicos, o grupo acaba oficialmente em 1972. Holdale abandona o país em 1973. Terry Thomas formou os Albatroz. Jim Creegan regressou a Inglaterra e tocou nos Family, nos Cockney Rebel (de Steve Harley) e, mais tarde, com Rod Stewart. Guilherme Inês e Zé Nabo formam com José Cid e Moz Carrapa o efémero grupo Cid, Scarpa, Carrapa e Nabo. Os dois, mais tarde, encontrar-se-ão nos bem sucedidos Salada de Frutas. Por seu lado, Mike Sergeant passa pelo Quarteto 1111, os Green Windows e mais tarde Gemini.

Nuno Galopim.






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