Mondo Bizarre
Publicação Trimestral
Distribuição Gratuita
Nº 2 - Fevereiro de 2000
40 páginas p/b
NON
A Delicadeza Da Perversão
NON é o nome de guerra e o alter ego de uma personagem deveras ímpar no panorama da música dita alternativa dos anos 80 e 90 (a par com Genesis P. Orridge dos electro-industriais Throbbing Gristle). Boyd Rice, o homem por detrás deste projecto musical (ou anti-musical) tem granjeado, ao longo destas duas décadas, alguma fama e projecção à custa de muita provocação e destruição dos cânones estéticos mais ortodoxos. Nascido na Califórnia, Boyd Rice desde cedo manifestou comportamentos desviantes do normal, tendo almejado seguir uma carreira musical inconformista nos meados dos anos 70, aquando da sua deriva pelas ruas gravando e recolhendo (para posterior manipulação) sons e ruídos aleatórios.
Após o início das hostilidades musicais, Rice desenvolveu igualmente uma série de actividades como escritor, artista multimédia e, ultimamente, actor em filmes mais ou menos experimentais. Sempre, claro está, envolto em mantos estilísticos de intenso negrume e obscurantismo. O seu primeiro álbum, "Black Album", teve apenas 85 exemplares e foi gravado no fim de 1975 (um disco onde explorava, acima de tudo, frequências e "drones" aleatórios). Por sorte, numa viagem que efectuou a Londres, conhece Daniel Miller, o responsável pela Mute Records, que desde logo manifestou interesse no trabalho arrojado do músico californiano. Foi nesse momento que Rice decidiu outorgar o seu projecto com o nome NON. "O nome implicava tudo e nada ao mesmo tempo. Era uma época onde, para mim, os valores do punk nada me diziam; o punk foi apenas mais um movimento hippie que cedo se fossilizou, por isso quis um nome que fosse contra isso tudo", explica Rice. O projecto NON tem-se assumido como um motor de pesquisa de novas sonoridades experimentais, sempre conotadas com ambientes góticos e industriais, numa tentativa de desvendar os segredos mais obscuros e negros da mente humana e da natureza (colaborou com uma série de músicos ou grupos afins à sua estética, designadamente, Coil, Death In June, Current 93, Steve Stapleton, Fad Gadget...).
O místico poeta Lautréamont ou o esotérico Aleister Crowley foram figuras que muito influenciaram esta safra de músicos e grupos dos anos 80. Em 1989, NON publica um dos seus discos mais aclamados: "Music, Martinis and Misanthropy", uma colecção de temas acústicos em parceria com outras almas negras e inquietas - Sol Invictus, Tony Wakeford e Douglas Pierce. Em 1995, edita "Might", uma sinfonia noise em formato "spoken word" e que suscitou reacções de atentado à moral e à decência. Sempre imperturbável, Boyd Rice tem ainda tempo para substituir Anton La Vey na controversa "Church Of Satan", facto que nos EUA tem levantado ondas de polémica pelo apego manifesto ao satanismo. Entretanto, NON acaba de editar o seu nono registo para a Mute, "Receive The Flame", um disco onde a abordagem ambient-noise coabita, friamente, com canções semi-acústicas despojadas de ornamentos e de sentimentos filantrópicos. É um disco que, mais uma vez, assedia o lado da perversidade humana e da sua natureza malévola. Por agora, Boyd Rice está em vias de assinar uma remistura da banda sonora do filme "A Laranja Mecância", a não ser que, tal como inicialmente previsto, a assine outra mente atormentada do mundo musical: Tricky.
Victor Afonso.
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