DN - Diário de Notícias
30 Março 2002
Discos Pe(r)didos
Na recta final de 70 os Tantra eram um dos raros casos de
sucesso no rarefeito panorama pop rock português. A estreia, com «Mistérios e
Maravilhas» (1977), seguida de um inesperado triunfo no Coliseu dos Recreios,
gerava um fenómeno que nascia nas esferas de um som sinfónico, com alguma
contaminação progressiva, um pouco nos caminhos sugeridos pelo eixo Genesis /
Yes. Seguiu-se, no ano seguinte, «Holocausto», disco que volta a gerar um caso
de popularidade no circuito «roqueiro luso», com duas noites de triunfo no
Coliseu. A estes espectáculos, nos quais surge já nas teclas Pedro Luís (em
substituição de Armando Gama, que partira para formar os Sarabanda), segue-se
inesperado silêncio de três anos. E o grupo, que havia assumido a ideia de um
som rock cantado em português, vê-se então ultrapassado pela popularidade dos
novos nomes que entram em cena. Manuel Cardoso, o vocalista e um dos fundadores
dos Tantra, havia já assumido o seu alter-ego de Frodo...
Quando, em 1981, é editado o derradeiro álbum dos Tantra,
«Humanoid Flesh» (no qual participa, no baixo, Pedro Ayres Magalhães), o fim do
grupo está à vista, sobretudo dado o fracasso de um disco talvez
incompreendido, que trocava as linguagens progressivas de 70 por uma
aproximação às emergentes sugestões da new wave.
Manuel Cardoso toma então definitivamente o nome do seu alter-ego
Frodo e parte em busca, não de respostas sobre um anel, mas para uma carreira a
solo que nos deixou dois registos dignos de referência. Estreia-se com o single
«Machos Latinos» (ainda em 1981), ao qual sucede o álbum «Noites de Lisboa», no
qual se conhece, de certa forma, uma lógica de continuidade face a alguns
elementos da música dos Tantra, nomeadamente o prazer pela elaboração dos
fundos (um pouco ao jeito das normas sinfonistas), aqui, todavia, empregando
regras de maior simplicidade ao nível dos recursos, sublinhando assim critérios
de contemporaneidade, aceitando as marcas de um presente onde uma nova lógica
electrónica encontrava o seu espaço no contexto da canção pop.
Ao seu lado, neste «Noites de Lisboa», encontramos alguns
ex-Tantra, como Pedro Luís (que então dava também os primeiros passos com o seu
projecto pessoal, os Da Vinci) e António José Almeida (o baterista que seguia,
então, rumo próprio com os Heróis do Mar). António Emiliano (teclas) é outro
dos convidados a desenhar retratos nocturnos de Lisboa com os quais Frodo
propõe uma ideia de sofisticação pop que não se enquadrava nos padrões de um
momento onde se descobriam ainda as adaptações lusitanas das normas do «fast
and furious».
Nem muito «fast», nem muito «furious», mas enfim...
A capa do álbum, que reflecte uma ideia de identidade
teatral e lembra, de longe, a figura do austríaco Falco (na altura na berra com
«Der Komissar»), é um primeiro indício de um processo de autodeterminação de
uma ideia pop que conduzia Frodo na alvorada de 80. A foto interior, onde junta
a si os músicos, exibe uma noção de imagem apurada no sentido de uma
sofisticação chique, quase neo-romântica, embora sem maquilhagem...
Musicalmente, sem se apresentar como um álbum
revolucionário, «Noites de Lisboa» é um disco curioso e competente, bem mais
interessante e representativo de uma proposta individual de rumo que muitos dos
pastiches que o ano de 1982 vê nascer (e morrer) entre nós. Poucos meses
volvidos sobre a edição deste seu álbum de estreia, Frodo edita um sucessor, no
bizarro formato de duplo (álbum + máxi) «Zbaboo Dança», uma mais directa aposta
na exploração de electrónicas, mas num recuo linguístico rumo ao inglês... E,
como o anel, desapareceu em Mordor...
N.G.
FRODO
«Noites de Lisboa»
Vadeca, 1982
Lado A: «Vou Acordar No Paraíso», «Máquinas na Multidão»,
«Feitiço», «Labirinto»;
Lado B: «Noites de Lisboa», «Manhãs Submersas», «Fado
Louco», «Heróis da Noite»
Produção: Frodo
Sem comentários:
Enviar um comentário