DN - Diário de Notícias
06 Abril 2002
Discos Pe(r)didos
Lisboa, 1984. Com quatro anos de vida, o Rock Rendez Vous
(RRV) encetava um certame que se transformaria, em pouco tempo, numa espécie de
ex-libris da «casa»: o Concurso de Música Moderna. Fruto de um momento de
fervilhante agitação nos espaços da criação e divulgação de uma emergente ideia
de música alternativa portuguesa. Resultado, por um lado, de uma natural
resposta dos músicos à implosão do mercado mais «oportunista» de 1982 e, por
outro, da solidificação de importantes espaços de divulgação na rádio
(Comercial e Renascença) e imprensa («Sete» e, mais tarde, já em finais de
1984, a entrada em cena de uma publicação de especialidade: o «Blitz»), um novo
mundo de bandas e conceitos aguardava a abertura de uma janela. E assim
aconteceu, na Rua da Beneficência ao Rego.
Para a primeira edição do Concurso de Música Moderna do
RRV inscreveram-se um total de 101 bandas, das quais 24 foram seleccionadas,
seis delas apuradas, depois como finalistas... Na final eram jurados António
Sérgio (Rádio Comercial), Ana Cristina (Rádio Comercial), Rui Pêgo (Rádio
Renascença), Ana Rocha («A Capital»), João Gobern («Sete»), Amílcar Fidélis
(«Diário Popular»), António Manuel Ribeiro (UHF), Manuel Cardoso (Frodo), Zé
Pedro (Xutos & Pontapés) e João Santos Lopes (RRV). Vencedores... os Mler
Ife Dada.
Formados poucos meses antes, os Mler Ife Dada eram, nesta
sua primeira formação, Nuno Rebelo (baixo), Pedro d’Orey (voz) e Kim (guitarra)
e mostraram desde logo, nas eliminatórias e final do concurso do RRV, uma ideia
de franca identidade e personalidade tanto no som como na imagem, deles
nascendo (de facto), a mais sólida proposta em competição.
Como parte do prémio, coube ao grupo a hipótese de
registar um primeiro disco, gravado pouco depois nos estúdios da Rádio Triunfo,
com Paulo Junqueiro (hoje A&R nacional da EMI-VC) e produção de Nuno
Canavarro (ex-Street Kids, tal como Nuno Rebelo).
«Zimpó», o máxi-single com o qual os Mler Ife Dada
assinalam, em inícios de 1985, a sua estreia editorial, é um interessante
representante da ponta do icebergue de uma multidão de projectos que procuravam
então novas formas na vanguarda de uma «nova» música portuguesa (chamavam-lhe
«moderna» na época).
O disco é constituído por apenas três temas, o primeiro
dos quais (o tema-título) ainda hoje
recordado como uma das pérolas esquecidas da pop alternativa lusitana de 80,
fluente na estrutura rítmica, animado e conduzido por uma guitarra que tanto
citava os Durutti Column como parecia assumir a essência antiga da guitarra
portuguesa. Na face B do máxi-single apresentavam-se dois temas cantados em
inglês, cativantes, mas em nada comparáveis a «Zimpó».
Complemento fundamental às três canções apresentadas no
disco, a capa do máxi-single é mais uma clara manifestação das intenções
estéticas de um grupo com uma consciência de arte final invulgarmente apurada
para o que era norma na época. Uma pintura de Mateus e Sérgio, sobre a qual se
inscrevem (na contracapa) os créditos e fotografias é interessante expressão
visual de um som novo, moderno, desafiante, avesso à prática d o «mais do
mesmo».
O grupo não conheceu, contudo, vida longa com esta
formação tanto que, alguns meses depois, apenas Nuno Rebelo se mantinha nos
Mler Ife Dada, acompanhado por uma série de novos músicos, entre eles a
vocalista Anabela Duarte, que se estreariam no single «L’Amour Va Bien Merci»
(1986), ao que se seguiria, já em 1987, o clássico «Coisas Que Fascinam», álbum
de estreia e um dos mais importantes registos da história do pop/rock lusitano.
N.G.
MLER IFE DADA
«Zimpó»
Máxi-single, Dansa do Som, 1985
Lado A: «Zimpó»;
Lado B: «Stretch My Face», «Spring Swing»
Produção: Nuno
Canavarro
Sem comentários:
Enviar um comentário