DN - Diário de Notícias
08 Junho 2002
Discos Pe(r)didos
Da revolução de 1980/81, quando na sequência dos êxitos
de Rui Veloso, dos UHF, GNR, Trabalhadores do Comércio e Salada de Frutas se
instituiu uma espécie de nova ordem de gostos e prioridades, colocando o novo
pop/rock cantado em português na primeira linha dos objectivos, nasceu um
verdadeiro cenário de explosão demográfica no panorama musical lusitano.
Grande parte das carreiras emergentes usavam o single
como veículo de exposição ideal para as suas canções, raros sendo os casos de
grupos e artistas que apostaram em primeiro lugar no formato de álbum. Rui
Veloso, Táxi e Opinião Pública são raros casos de apostas no LP, dele nascendo,
depois, os inevitáveis singles.
O clima de euforia colectiva que o meio pop/rock então
vivia levou a que muitas pequenas editoras se aventurassem na edição de rock
português. Afinal, nada mais que a aplicação (à nossa escala) de princípios que
a revolução punk e a continuidade via new wave tinham impresso recentemente À
bem nutrida indústria discográfica inglesa. Entre as pequenas editoras que
então entram em cena destaca-se a Rotação, na qual o homem do leme era António
Sérgio (já então um conhecido divulgador na rádio e com provas já prestadas na
edição discográfica, nomeadamente como co-produtor, em 1979, de «Música
Moderna», o álbum dos Corpo Diplomático, isto sem esquecer a «famosa»
compilação «Punk Rock 77»).
A «bandeira» da Rotação era, naturalmente, a estreia
discográfica dos Xutos & Pontapés, que ali editaram os dois primeiros
singles «Sémen» (1981) e «Toca e Foge» (1982), bem como o álbum de estreia
«78/81» (também em 1982). Perante o cenário de investimento que caracterizava
todos os pólos de edição na altura, a Rotação avança pelo ano de 1982 com uma
série de novos nomes: Mau Mau, com o single «Xangai», Tânger, com o single «Zé,
Zé Ninguém», Manifesto com o single «Nuclear (À Beira Mar)». A estes juntam-se
ainda os Malaposta e os Sub-Verso... Todavia, nenhum dos grupos da Rotação, à
excepção dos Xutos & Pontapés, conhecem tamanha expectativa interna e
alguns resultados concretos como os Opinião Pública, uma banda, de certa forma,
«apadrinhada» pelos UHF.
No quarteto, constituído por Carlos Estreia (voz,
guitarra), Pedro Lima (guitarra), Luís Fialho (baixo, teclas) e Carlos Baltasar
(bateria), António Sérgio identificara um caso de possível complementaridade
pop aos Xutos & Pontapés. A estreia faz-se com «Puto da Rua», canção que imediatamente
chega à rádio e tira os Opinião Pública do anonimato e apresenta o álbum «No
Sul da Europa», com o qual o grupo faz a sua estreia (encetando uma discografia
que receberia depois, apenas, o single «Puto da Rua»).
Se nos Xutos & Pontapés António Sérgio «ousara» um
lugar na produção, com os Opinião Pública cede a cadeira a António Manuel
Ribeiro (dos UHF) e à própria banda. De som seguro e muito característico. Das estéticas
da altura, «No Sul Da Europa» é um interessante (e quase esquecido) documento
do rock português de inícios de 80, dividindo as canções entre momentos de puro
prazer de uma pop lúdica (como «Ritmo de Vida» ou «Walkman», e alguns retratos
de cenas do quotidiano urbano de então (de que são bons exemplos «Puto da Rua»
e «Subúrbio»).
Apesar de coerente e significativamente mais interessante
que grande parte dos demais estreantes seus contemporâneos, os Opinião Pública,
tal como todo o restante catálogo da Rotação (à excepção dos Xutos &
Pontapés), desapareceram entre as primeiras vítimas da crise de 1982/84, uma
das mais «mortais» da história pop/rock cantada em português.
N.G.
OPINIÃO PÚBLICA
«No Sul da Europa»
LP Rotação
Lado A: «Ritmo de Vida», «Sem Destino», «Sul da Europa»,
«Puto da Rua», «Na Terra»;
Lado B: ««Walkman», «Cumprindo As Regras», «Duplo
Controle», «Subúrbio»
Produção: António Manuel Ribeiro e Opinião Pública
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