27.7.15

Memorabilia: Revistas / Magazines / Fanzines (112) - Monitor #49


Monitor
Nº 49

Ano V
Setembro de 98
III série

24 páginas - p/b - A5 landscape, papel fino tipo jornal

Assinaturas - 12 números - 2000$00


Editores
Rui Eduardo Paes
Paulo Somsen
Colaboradores neste número
Pedro Ivo Arriegas
Vasco Durão
Jorge Mantas
Gonçalo Falcão
Luís Rei

Pedro Santos
Jorge Saraiva

Ryoji Ikeda - «0ºC» [CD Touch, 1998]
Mute Life Department - «Still» [CD edição de autor, 1998]
Vários - «KHM - CD Series Nº 1» [CD Kunsthochschule Fur Medien Koln, 1998]

A electrónica toma novos rumos e nem sempre os desbravadores de caminhos aparecem onde mais os esperávamos.
Não foram poucos os que acreditaram piamente que das recentes tendências do techno pouco viria de verdadeiramente inovador e isso porque, mais uma vez, estávamos perante um fenómeno de moda e é sabido que estes passam sem deixar rasto. Desta vez, não está a ser assim. O japonês Ryoji Ikeda, que já foi comparado com os Panasonic (agora Pan Sonic, «copyright» oblige) mas na verdade é muito mehor, assina as mais interessantes obras com instrumentação electrónica que surgiram nos últimos anos, como «1000 Fragments», «+/-» e este recém-editado «0ºC». É dele, também, grande parte das bandas sonoras do grupo de perfomance, dança e teatro Dumb Type, que tivemos oportunidade de conhecer este ano no Festival do Mergulho. A sua música é toda ela construída com os parasitas sonoros produzidos pela electricidade, de zumbidos e estranhas crepitações a baixíssimas frequências e reconversões de «test tones», tudo isto com um sentido rítmico apurado.
De acordo com a sua devoção pelo budismo Zen, a abordagem de Ikeda é minimalista e abraça a «ética de não-interferência» que também inspirou Alvin Lucier. As composições electroacústicas deste serão mais
complexas do que as do compositor japonês, o que se explica pelo facto de Ryoji Ikeda ter em conta privilegiadamente as mecânicas perceptivas do ouvinte, procurando arrebatá-lo pelo que nele há de mais
primário, a pulsação precisamente (como há tempos salientou a revista «Wire», neste aspecto aproximar-se-á mais de Stockhausen, que considera serem os ritmos e as frequências exactamente a mesma coisa, embora a velocidades diferentes). Os sons, regra geral, surgem a um nível quase diminuto de volume e o silêncio está sempre presente, não como um fundo, mas integrado na própria matéria musical. Há um outro
aspecto decisivo no seu trabalho: a substituição do conceito de tempo pelo de espaço. Já não é a linearidade dos desenvolvimentos ou o seu contrário, pela fragmentação do discurso ou pela recusa do fraseado, que estão em causa, mas o espaço, na própria música e na maneira como a fruímos consoante a nossa posição diante dos altifalantes.. «0ºC» tem um aliciante adicional: neste CD, Ikeda «interpreta» as convenções da música «erudita» à sua maneira, como o canon e a cadenza, assim demonstrando que, apesar de tudo, ainda aceita algumas das regras vigentes.Do techno também, vêm os portugueses Mute Life Department, trio que une o igualmente artista visual Pedro Tudela e Alex Fernandes (mais conhecido nas discotecas por Alex FX) e Pedro Almeida. Entre o ambientalismo electrónico e a experimentação, são responsáveis pelo que de mais interessante na área se faz em Portugal, algures num plano em que situaria num dos lados os Zzzzzzzzzzzzzzzzzp! e no outro os Vitriol. «Still» é o registo de uma actuação do grupo (uma das raras em tr~es anos de existência) numa exposição de Tudela no Porto. O sampler é o instrumento principal, mas grande relevo têm a montagem de fita, herdeira dos princípios concretistas, a percussão acústica e os «objects trouvés», com um papel decisivo para as falas introduzidas de quando em vez, adensando o efeito dramático induzido. No meio de tanta «pastilha elástica» dita alternativa, é com alguma surpresa que se descobre um projecto com estas características. Mais novidades da novíssima geração da electrónica chegam-nos da Alemanha, graças a uma compilação de jovens estudantes cujos nomes convirá ir decorando: Marek A. Goldowski, Felix Hahn, Einsok/Auskoz, Peter Simon, Jan Verbeek, Miki yui, Pol Mahlow e Nadja Schoning.
São claras as influências da música concreta (Pierre Schaeffer e Pierre Henry foram mais seminais do que há uns anos se acreditou), da acusmática francesa (as «escolas» do IRCAM e do GRM, designadamente) e
da «live electronics» (os improvisadores que adoptaram e adaptaram os preceitos de John Cage e David Tudor), mas é nas margens experimentais do techno que os temas incluídos em «KHM-CD Series Nº 1» vivem.
O futuro está aqui, pelo que, quem os tem, deve deixar-se de preconceitos...
[REP] - Rui Eduardo Paes

outro artigo/entrevista interessante:
Robin Storey
Entre os Zoviet France e os Rapoon
por Jorge Mantas
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